33: Depois de Salvarem um Mundo - Capítulo 194
- Início
- 33: Depois de Salvarem um Mundo
- Capítulo 194 - Trigésima Nona Página do Diário – parte 2
Trigésima Nona Página do Diário – parte 2
Após muitos dias de sofrimento — principalmente por ter que aguentar o jeito estranho de Felipe — e um pouco de felicidade, — que eram os momentos ao lado de Zita — finalmente conseguimos chegar a uma tradução de boa parte do que estava lá.
Ou melhor, Felipe e Zita conseguiram, eu só dei apoio moral.
As inscrições indicavam a existência de chaves que abriam portas para outros mundos, o que poderia indicar uma forma de voltarmos para casa. No meu caso, nem sabia se tinha uma casa para voltar.
Nesse meio tempo, Felipe fez uma diversidade de testes comigo, perguntando coisas sobre o meu passado. Acho que ele desconfiava que eu estava escondendo alguma coisa.
Não julgo, eu também aproveitei para tentar descobrir alguma coisa sobre ele, mas o cara era bom com segredos. Nem mesmo consegui descobrir como ele fazia aquelas tranças coloridas que davam um estilo bem descolado.
Parecia até que a qualquer momento ele mandaria uma rima “daora”.
O mais incrível de tudo, era que aquele lugar tinha um ar de familiaridade. Mais do que por ser o reino que originou o Leste, era como se eu já tivesse vivido ali, e quanto mais tempo eu ficava em meio àquelas ruínas, mais tinha a sensação de estar em casa.
Até as inscrições estranhas pareciam ter sempre feito parte do meu dia a dia, desde uma infância não vivida. Era particularmente esquisito, até achei que pudesse ser uma influência mágica do local, contudo, quando perguntei a Zita se ela estava sentindo algo semelhante, ela disse que não.
Os símbolos nas paredes da sala da verdade começaram a aparecer nos meus sonhos, onde eu parecia ser capaz de entendê-los, mas não lembrava o que eram, quando acordava.
Achei melhor não contar para Felipe, principalmente porque ele desconfiava de mim, sem contar que ele estava travado na tradução da outra metade dos símbolos. Pelo que eu entendi, tinha duas coisas escritas ao mesmo tempo, mas com padrões diferentes.
Para alguém com um poder tão foda, Felipe parecia meio estúpidos as vezes. Aposto que se eu fosse o inteligente ali, já teria desvendado o padrão e saberia o que estava escrito. Acho que ele nem sabia usar o próprio poder.
Vendo que não ia conseguir traduzir por milagres, Felipe nos avisou que retornaria à Torre para buscar uma pista no meio de todos os livros que havia lá. Talvez ele descobrisse uma chave para o segundo padrão.
Então chegamos a um impasse.
Felipe queria que Zita voltasse com ele. Zita disse que só voltaria se eu fosse junto. Eu não queria ir, preferia voltar ao Reino do Leste. Felipe achava que eu e Zita ficarmos perto um do outro era perigoso. Eu achava que Felipe era o mais perigoso.
No fim, começamos a desconfiar um do outro. Estava indo bem demais para um herói e eu em um mesmo lugar por quinze dias e não tentarmos assassinato mútuo. Tá bom que a Zita não era agressiva comigo, mas ela quase me matou quando perdeu o controle.
Levando em consideração o meu péssimo histórico com heróis, comecei a achar que talvez o problema fosse comigo. Talvez eu devesse ser mais confiante, melhorar minha autoestima, ou simplesmente deixar de fazer merda.
Enquanto eu me remoía em pensamentos negativos, recebemos uma visita. Era Haroldo, ele simplesmente apareceu do nada e começou a conversar com Felipe sobre o que estava escrito na sala da verdade.
Percebi que ele era bom em desviar de assunto, pois quando perguntamos sobre como ficou a treta dele com o Cavaleiro de Prata ou o que estava fazendo ali, ele conseguiu falar muito sem dizer nada.
E o mais incrível, ele conseguiu convencer Felipe a ir com ele para a Torre dos Sábios e deixar eu e Zita para trás. Foi muito rápido, quando vi, os dois estavam de saída.
Se eu tivesse tamanho poder de convencimento, não teria feito tanta merda.
— Obrigado por me salvar naquela hora. — disse a Haroldo.
— Não foi nada, apenas estava consertando uns erros do passado. — Ele comentou.
— Não queria envolver quem eu não conheço nas merdas que faço, mas sempre acabo estragando tudo… — Expliquei — Foi mal…
— Não precisa se preocupar com nada, apenas dê o seu melhor. — Haroldo disse, me encarando de forma gentil — Seja o ator da sua própria história, enquanto cuidamos dos bastidores.
Mais uma frase difícil para me deixar confuso. O que Haroldo quis dizer com aquilo?
Meu cérebro parecia que tinha dado um nó — de novo. Ele falou como se me conhecesse, sendo que a gente só tinha se visto uma vez, por poucos segundos, e mesmo assim eu obedeci a ele sem nem pensar.
Enquanto eu pensava essas coisas, Haroldo me abraçou. Um abraço de verdade, apertado, alegre. Um abraço como eu imagino que um pai dá no filho. Em seguida, bagunçou o meu cabelo e saiu.
— Eu também não gosto de pentear o cabelo. — Ele disse.
Assim, Haroldo saiu. Ele foi embora, acompanhado de Felipe, enquanto Zita e eu ficávamos nas ruínas. Ela parecia estar animada em explorar mais um pouco o lugar, mas eu só queria entender o que tinha acontecido.
Passei o resto do dia absorto.
Como se minhas pernas tivessem vida própria, fui levado por elas para a sala da verdade, onde me vi encarando uma das paredes onde Felipe não conseguiu realizar tradução alguma.
Eu sentia que já tinha visto aquilo em algum lugar.
— O que foi? — Senti uma mão tocando meu ombro, era Zita.
— Eu acho que descobri um padrão…
Zita me olhou com uma expressão desconfiada.
— O baú de tesouros… Não é um hieróglifo apenas, mas a representação de alguém. Um arqueólogo, para ser mais exato!
— E o que isso deveria significar? — Zita perguntou, em um ar monótono.
— Consegue colocar uma chama em cima de cada símbolo de baú?
Zita entendeu a minha ideia, e conforme uma chama aparecia exatamente em cima de cada um dos baús desenhados naquela parede, o padrão foi se revelando. Uma palavra, para ser mais exato: HAROLDO.
Zita deu uma gargalhada. Não parecia mais tão desanimada em tentar me ajudar. Resolvi passar para a próxima fase.
— Agora faz o mesmo com o símbolo do corpo humano!
— O que ele deveria representar? — Zita parecia me testar.
— Vai ver em breve.
Em poucos segundos, as chamas desapareceram de cima dos desenhos de baús, aparecendo em seguida em cima dos desenhos de corpos humanos, formando uma nova palavra: ANDRÉ.
Até mesmo o acento agudo na última vogal apareceu.
Zita ficou tão admirada com o resultado que tapou a boca enquanto ria sem controle. Eu estava animado com o resultado, aquilo indicava que eu e Haroldo tínhamos mesmo uma conexão.
O próximo símbolo deveria ser o do microscópio, mas uma tontura me acertou. Senti como se o céu e a terra tivessem trocado de lugar, e perdi totalmente o equilíbrio. Vozes de diferentes pessoas invadiram a minha mente ao mesmo tempo, parecia que meu cérebro estava a ponto de explodir.
A conhecida voz do ser que me deu a maldição do Rancor se destacou entre todas elas:
— Parece que está na hora de lembrar um pouco de quem você é!