Passos Arcanos - Capítulo 1
A águia que voava no céu era a única coisa que realmente possuía liberdade no imenso deserto amarelado. Suas asas esticadas desciam lentamente e retornavam, planando. Sua pelugem branca reluzia ao sol.
Num rasante repentino, ela desceu até o solo, erguendo suas asas e sobrevoando perto da areia. A águia bateu novamente suas asas e subiu, mirando seus olhos para a outra presença no imenso deserto.
Orion Baker observava voo sem se importar com o calor ou com a sola de seus pés tocando o fervoroso solo arenoso. Seu foco era o animal que se movia com leveza pelo ar.
— Tão livre. — Suspirou, cansado de estar observando. Se ele pudesse voar, se sentiria mais feliz? — O que você querendo me dizer, garota?
O grito da ave ressoou pelo deserto e adentrou seus ouvidos. Ao fechar os olhos por causa do ruído altíssimo, caiu na escuridão.
Ao acordar, voltara para sua casa simples. Quatro paredes de pedra, o chão de madeira bruta, lisa e fria. Queria ter dormido na cama, mas adormeceu sentado no meio de todo os seus livros de Arcana.
— Outro sonho estranho — riu, coçando os olhos.
Na verdade, era sempre o mesmo sonho. Ele retornava para o deserto pelo menos uma vez na semana, contemplando a ave voar. As vezes, apenas por alguns segundos, outras vezes durava minutos. E quanto mais tempo passava naquele estranho sonho, mas cansado ficava mentalmente.
Ao acordar, sua energia voltava, como se nunca tivesse ido embora.
Para Orion Baker, sonhar era bem melhor do que viver já que estava agarrado sempre na mesma rotina.
— O horário de descanso acabou, Orion. — Uma bengala ultrapassou a porta sendo segurada por um velho homem. Andava se arrastando com uma das suas pernas travadas. — Já deu a hora.
— Eu sei, pai.
O rapaz voltou a pegar o lápis, puxou o papel para mais peto e retomou as anotações rapidamente. Diferente das outras famílias de magos, os Baker retratavam modelos físicos e algébricos para estudar a magia.
E como eram uma família ramificada, tendo diferentes meios, Orion Baker era o segundo filho da última família dos Baker.
Oliver Baker, pai de Orion, se sentou à frente e puxou um dos papéis acabados de seu filho. Ele acabou em alguns minutos, mas não expressou reação.
— Então, você consertou o círculo mágico dos Elementais com círculos mágicos da Escola Gravitacional?
Sua pergunta fez Orion parar de escrever. Ele não esperava que seu pai pegasse justamente essa anotação.
— Pai — o rapaz ergueu a cabeça, pronto para explicar.
— Quantas vezes já falei pra você? — Ele gritou com raiva, levando Orion a e encolher. — Cada Escola deve compreender suas próprias falhas. A arcana não pode se misturar, não pode se unir.
— Mas, pai…
O rapaz de 18 anos ainda não ligada com a pressão. Oliver era um Mago Intermediário da Escola de Eletricidade. Rígido, impresso por dogmas da magia e arcana. Mesmo que a família Baker estivesse em declínio e fosse desonrada por fatores passados, Oliver Baker era um dos poucos de sua família desmantelada cujo respeito ainda era válido.
E assim como todos os antigos magos, ele estava preso em suas próprias amarras.
— Cada Escola possui sua própria maneira de evoluir. Unir conceitos de outros lugares é como ignorar todos os passos evolutivos. É errado, dado como uma crime em grandes partes das Ilhas Continentais, Orion. Já perdi a conta de quantas vezes já falei isso.
— Então, olhe para as respostas do papel, pai. — Orion pegou a folha e mostrou a parte debaixo onde os números e letras se uniam. — Com a ajuda do Campo Gravitacional central, os círculos rúnicos melhoram em 60%. É um avanço para todas as escolas mágicas.
— Orion. — Oliver perdeu a força no corpo, levando a mão ao rosto. Ver seu filho juntando outros papeis, tentando mostrar que seus cálculos ajudariam, sua infelicidade era clara. Ver Orion animado não era o suficiente para lhe retirar daquele mundo de dor.
— Eu uni diversos fatores de outras Escolas, posso mostrar claramente que elas podem melhorar se pegarem o básico das outras Escolas, pai. Olhe. — Apontou para um dos símbolos da Escolástica de Moléculas. — A vibração mínima pode trazer mais revestimento nas magias de Velocidade e Força, e pode ajudar na compreensão da Escola de Luz.
— Orion — o grito de Oliver fez alguns dos papéis voarem para longe, cessando também o movimento do filho. — Chega disso. Guarde esses papeis com você ou queimarei tudo. E não comente com mais ninguém sobre isso. Nem posso imaginar o que vai acontecer se alguns dos Anciões descobrir.
Oliver se levantou e saiu. Era sempre a mesma coisa, todos os dias. Orion tinha a capacidade, tinha a habilidade para estudar as magias, para estudar a Arcana, e fazia isso sempre por quase dez horas por dia.
Suas anotações eram precisas, e ele sempre estava perto de mecanizar uma ou mais magias. E sempre que conseguia terminar, aquela frustração. Ele nunca poderia aplicá-la.
E sua rotina, acordar cedo, treinava com um instrutor, se lavava e passava a tarde e metade da noite estudando.
Tendo 12 anos atualmente, Orion Baker começou a estudar Arcanismo com seu pai quando atingiu 4 anos de idade. Desde então, ele era o único com conhecimento intermediário em Arcana antes de alcançar os 20 anos em toda Caldeira de Ilhotas.
Por mais que Orion se considerasse normal, sua mente era muito mais rápida do que o costume. Se lembrava de tudo o que estudava uma única vez, gravava imagens, símbolos e padrões com apenas uma encarada, sem esquecer.
E essa era uma habilidade que ele mesmo adotou para si. Porque gostava tanto de estudar, tanto de aprender, que por mais criativa que fosse, seus estudos nunca poderiam ser revelados. O medo de seu pai arrumar uma função burocrática perto dos Anciões o atormentava.
Saindo de casa, no relevo que dava para o mar, ele via o horizonte azulado. A escuridão e as estrelas. Aquele cenário repleto de conhecimento a ser descoberto.
Era disso que gostava: da magia, das ideias, da teoria. A história e o futuro.
Sua vida inteira buscando uma chance de mostrar seu valor.
— Orion, já que está ai fora, olha a Modeira pra mim, por favor.
Modeira, uma planta que seu pai cultivava fazia alguns anos aplicando algumas pequenas Runas Básicas de Arcanismo. Ela foi planta atrás da casa, em um canteiro isolado, onde suas pétalas brilhavam ao anoitecer.
Aquela árvore tinha sido escolhida por Orion, e vendo que depois de anos, ela se mantinha forte, o enchia de orgulho.
— Tempo de crescimento real é de nove anos. — Ele fez uma breve anotação mental. — Os Magos de Luz, chamados de Lumos, podem fazê-la crescer em 7 anos com a magia ‘Crescimento Acelerado’. A magia possui seus círculos exatamente iguais a magia dos Magos Moleculares, ‘Envelhecimento Material’.
Ele tomou um pequeno papel de seu bolso e começou a desenhar os símbolos, os padrões. As magias de luz tinham um efeito semelhante a crescimento, e a molecular era um conceito de envelhecer.
— Por que ambas tem o mesmo resultado, mas Lumos surta mais efeito?
Eram perguntas demais, tantas que não conseguia responder algumas sem levantar outras. O mundo poderia ser descrito por livros, porém, nunca continha as respostas que ele procurava.
E se não podia reescrever esses mesmos livros, como um único rapaz poderia desvendar o complexo mundo das magias?
Antes de adormecer encostado na parede de sua casa, ele fitou o céu estrelado e a lua branca.
Desvendar a magia? Orion Baker faria bem mais que isso.