O Monarca do Céu - Capítulo 10
Árvores e Magia.
A cadeira onde Colin estava era bastante aconchegante. Seus pés imundos estavam jogados em cima da mesa, bem ao lado de dezenas de livros que traziam em seu conteúdo algo relacionado à magia.
Já estava quase no meio da noite.
A luz de algumas velas tornava sua leitura nítida no meio daquele cômodo escuro.
Depois de um suspiro, Colin virou a página.
Ele e seu grupo solicitaram algum lugar para que pudessem estudar. O ancião recomendou o porão da catedral, que era enfestado de aranhas, mas continha uma boa quantidade de livros.
— Que chato… — disse a fada deitada em cima de uma pilha de livros. — Não íamos caçar aquele demônio? O que fazemos aqui lendo esse monte de coisa inútil?
Colin fechou o livro e começou a gangorrear na cadeira.
— Não é inútil, estudar o inimigo é o básico.
— Estudar o inimigo? Mas você nem sabe que tipo de demônio ele é… sabe quantas categorias de demônios existem que conseguem fazer um contrato desse nível? Ao menos uns 20 deles. Vai fazer o quê? Estudar todos os tipos para talvez pensar em uma forma de derrotá-los?
— Então o que sugere, espertinha? Que a gente apenas vá direto para a morte sem nenhum plano?
— Mas a gente tem um plano, e esse plano sou eu!
Colin encarou Brighid no fundo dos olhos. Ela estava de pé na pilha de papéis, exalando confiança.
— Você consegue somente curar e defender, né?
Brighid fez que não com a cabeça.
— Você não sabe mesmo de nada, não é, Colin?
Ele cruzou os braços.
— Então por que não tenta me explicar, espertinha?
— Certo!
Ela apoiou a mão no queixo e esboçou um sorriso malicioso.
— Pois bem! Meu caro aluno, irei te ensinar, mas sob uma condição!
“Lá vem, provavelmente será algo bem idiota. Vindo da Brighid pode se esperar de tudo.”
— Qual condição? — ele perguntou.
Cruzando os braços ela disse:
— A partir de agora você terá que me chamar de mestra!
“Como suspeitei… algo idiota.”
— Você quer passar fome a partir de hoje? — perguntou Colin.
Ela fez que não.
— Então é melhor parar com isso e me ensinar logo, estou ficando sem paciência.
— Hum! — ela grunhiu virando o rosto abruptamente. — Você é muito chato, não dá nem mesmo para brincar com você…
Safira fechou o livro que lia e se virou para Brighid.
— Façamos um trato! — disse ela. — Colin deixará você escolher o nome do cavalo e em troca você nos ensina ao menos o básico de magia. Que tal?
Os olhos de Brighid brilharam intensamente. Coisas nomeadas são bem poderosas, e para as fadas, o poder de nomeá-las as deixava profundamente gratas. Era como ganhar o mais precioso dos presentes.
— Você deixa mesmo, senhorita Safira?
Safira sorriu e fez que sim.
Brighid saltou até outra pilha de livros que estava bem na frente de Colin.
— Todos os seres nascem aptos para a magia, mas alguns conseguem manifestá-la mais facilmente. Serei sincera com você — disse ela apoiando as mãos na anca. — Aprender a manipular magia não é um processo simples, exige muito treino e dedicação. Seu corpo tem que ser levado ao limite para adaptar a mana a ele, e seu fluxo de mana está uma bagunça. Não sei no que anda pensando, mas precisa relaxar.
Batendo as mãos, uma imagem puramente feita de mana começou a se formar bem atrás de Brighid. Após alguns segundos formou-se um gigantesco livro com uma árvore de capa.
Aquilo se assemelhava a um gigantesco holograma interativo.
— Prestem atenção — disse ela erguendo o indicador. — Existem doze árvores de manas, e cada criatura nasce com afinidade em uma delas. Para saber qual afinidade a sua, é necessário saber o período em que nasceu.
Colin ergueu uma das sobrancelhas.
— Por que saber o tempo em que nasci influencia na afinidade da árvore em qual terei? — ele perguntou.
— É devido aos doze planos. Eles estão em constante mudança, mas esta mudança não é mais que um ciclo, um ciclo eterno.
“Isso explica algumas coisas, de acordo com meus status, minha árvore é a do céu, eu acho…”.
— Minha árvore — disse Colin. — Qual é?
O livro de mana se transformou em uma árvore mágica e os galhos eram como habilidades distintas. A raiz estava representando o símbolo de nuvens carregadas. Seguia pelo tronco representando outros símbolos que Colin desconhecia.
— Você é da árvore-do-céu — disse ela. — O Deus dela se chama Titânio, aquele que governa soberano sobre o firmamento. Você deve ter nascido no verão, bem no meio dele para ser mais exato. Quanto mais você treina, mais você consegue usar determinadas habilidades que irão requerer uma manipulação mais precisa da mana, mas não se empolgue, é quase impossível dominar uma árvore inteira. Por isso existem tão poucos mestres em magias — ela abriu um sorriso. — Os mestres de árvores são chamados de monarcas.
Colin alisou o queixo pensativo.
— Você é mestra em alguma? — ele perguntou.
Convencida, Brighid fez o número dois com os dedos e disse estufando o peito:
— Sou mestra em duas árvores!
Safira e Colin arregalaram os olhos de imediato.
— Isso é mesmo possível? — perguntou ele.
Ela cruzou os braços e fez que sim.
— Além de habilidades básicas como fortalecimento físico, magias de elementos fracas e magia de análise, é possível aprender até três árvores por completo, mesmo que não seja a qual você tem mais afinidade. Essas são conhecidas como árvores secundárias.
“Isso é surreal… ela disse ser quase impossível dominar uma árvore inteira, mas ela domina duas? O que diabos ela é afinal?”
— Brighid! — chamou Colin. — Quantos anos você tem?
Ela apoiou o dedo indicador na bochecha e tornou a pensar.
— Conforme a métrica com qual os humanos usam para definir idade, devo ter, 1374 anos.
Era difícil não se impressionar. Colin estava espantado com o fato de Brighid deter um poder tão avassalador e, ao mesmo tempo, ter um milênio de existência.
— Por que não matou o nobre que mantinha você presa e fugiu?
— Bem… — disse ela. — Quando deixamos a ilha das fadas, somos punidas com uma maldição. E a maldição que está dentro do meu corpo implica que se eu ferir humanos com magia, meu corpo será destruído.
“Patético, simplesmente patético. Todo esse poder e não pode ser usado em quem bem entender.”
— E posso saber o porquê desta maldição?
— É porque o senhor da ilha das fadas é um humano e um caído, um caído como a senhorita Safira…
Safira ergueu as sobrancelhas.
— Um caído?
Brighid fez que sim.
— Caídos são seres que descendem dos antigos Asmurgs, os dragões anciões, mas nem todos que descendem dos Asmurgs são caídos. Senhorita Safira, por exemplo, detém a essência do fogo primordial. Para nossa sorte somente alguns monarcas conseguem sentir essa essência, ou caso contrário, estaríamos sendo caçados pelos quatro cantos do continente — a fada desviou o olhar. — Quando botei os olhos nela pela primeira vez, senti algo estranho… depois entendi que o que senti foi a essência do fogo primordial — ela ergueu a cabeça encarando Colin. — Os caídos foram caçados por serem acusados de serem os precursores da queda do véu, mas foram os Elfos Negros que enfim conseguiram derrubar o véu de vez.
Colin teve certeza que Safira era, sim, especial. Com cautela, ele exploraria seu potencial ao máximo, a fim de ver até onde aquele poder adormecido poderia chegar.
— O que é esse véu que você tanto fala? — perguntou Colin.
— O véu é o que separa o mundo Humano dos “mundos mágicos”. E criaturas como eu, senhorita Safira, os Elfos, demônios e muitos seres vis, viviam nesses “mundos mágicos”. Esses mundos não eram conjuntos, não eram um só. Cada uma das criaturas vivia em um plano diferente. Quando o véu caiu, tudo se juntou em um plano único que é este em que estamos hoje, e isso aconteceu a mais de dois mil anos, que para os humanos, é tempo demais.
Colin apoiou a mão no queixo e fez que sim com a cabeça diversas vezes. Ele estava entendendo o mundo em que veio parar. Pouco a pouco organizava seus pensamentos embaralhados.
Ele suspeitava que Safira fosse alguém importante, mas não que fosse tão importante assim.
Ele precisava saber mais.
— Responda-me uma coisa, quantas árvores esse Caído domina?
Relutante, ela olhou para baixo e coçou a bochecha com o indicador.
— Todas elas…
Safira se ergueu abruptamente enquanto sua cadeira caia para trás com tudo. Assustado, Colin caiu da cadeira e coçou a cabeça.
“Todas as árvores? Mas como? Os caídos são tão poderosos assim?”
O corpo de Colin começou a tremer só de pensar em um confronto com um ser deste nível.
“Ela disse que raramente alguém domina uma árvore, mas dominar todas é quase como uma mentira de mau gosto.”
— Diga-me uma coisa… — Colin inclinou-se. — Todos os caídos existentes dominam todas as árvores?
Ela fez que não.
— Depende da essência que nasceu com ele. Por exemplo, existem sete tipos de essências, fogo, água, terra, ar, vida, morte e infinito. O que está na minha ilha detém a essência do infinito, considerada a essência mãe. Dela pode se obter qualquer tipo de habilidade, incluindo as 12 árvores. Ele despertou a mais de 1.000 ciclos, é praticamente um ancião.
Colin olhou com o canto de olho para Safira, que estava com um olhar apreensivo, logo depois ele voltou seus olhos para a fada.
— O que diabos ele foi fazer na sua ilha, afinal?
— Ele chegou lá depois de uma batalha atroz contra alguém, mesmo assim conseguiu derrotar boa parte dos meus amigos e nos forçou a servi-lo. Por isso tenho medo que a senhorita Safira termine desta forma, esta foi uma das razões pela qual optei por não a ensinar magia até agora…
Safira estava pálida. Ela encarava os sulcos na mesa de madeira enquanto mordia os lábios. Ela não queria se tornar um tirano ou um monstro que se alimentava de caos, ela só queria viver como uma pessoa normal.
— Safira, não deixarei você terminar desse jeito — disse Colin erguendo-se. — Não daremos razão para nos odiarem ainda mais.
— Colin… eu… — murmurou Safira.
— Confia em mim, não deixarei isso acontecer. Se isso acontecer, então serei obrigado a lutar contra você e isso seria um problema, já que somos amigos.
Aquelas palavras conseguiram aquietar de vez o seu coração em conflito. Safira desviou o olhar e sorriu.
— Obrigada…
Colin ajeitou sua cadeira e Safira fez o mesmo. Ambos continuaram ali parados, prestando atenção em Brighid.
A Fada estava completamente corada. Fadas eram seres sentimentais, e situações como essas os deixavam chorosos.
— Isso foi tão lindo… — comentou Brighid fungando.
Afastando a situação embaraçosa, Colin decidiu continuar com suas perguntas.
— Quais são as árvores existentes?
O humor da Fada mudou assustadoramente rápido.
Ela ergueu num salto e voou até ficar mais próxima ainda de Colin. Ergueu o dedo indicador e disse:
— A ordem é a seguinte: primeiro vem a Árvore do Pélago, comandada por Plutônio. A seguinte é a Arvore da Terra, comandada pela Gaia. E por último vem a Árvore da Flama, comandada por Aurora. Estes três fecham o primeiro ciclo, o ciclo do inverno.
Depois de uma pausa ela continuou.
— Em seguida temos a Árvore do Vácuo, comandada por Júpiter. A do Reparo, comandada por Lucian e a do Conjuro, comandada por Athena. Elas representam a primavera, e essa também é a tríade em que pertenço. Sou Monarca na Árvore do Conjuro e do Vácuo.
“Interessante, parece que a proximidade de ambas, cria um tipo de conexão que devem ser as árvores primárias”
— É possível dominar somente a tríade onde represente a estação que nascemos? — perguntou Colin.
Ela fez que sim.
— Exatamente! E agora, a tríade em que você pertence, a tríade correspondente ao verão, e julgado por muitos como “a pior tríade.”
— Pior? Por quê?
— Os detentores desta tríade raramente conseguem usar 1/3 do potencial de sua árvore de origem, por isso usuários dela são raros. Se considere um cara de sorte ou azar… háháhá!
“Era a última coisa que eu queria ouvir nesse momento, mas tudo bem, algo assim não me abalaria. Estou acostumado com dificuldades.”
Ela continuou.
— Nela temos a Árvore do Caos, comandada pela Brumília. A Árvore-do-céu, comandada por Titânio, e finalmente a Árvore da Pujança, comandada por Murthulius. Tem uma particularidade interessante na Árvore do caos.
Colin ergueu levemente as sobrancelhas.
— Qual particularidade?
— Para dominá-la você precisa de um animal, e quando você e este animal dividirem a alma, ele assumirá a forma de sua personalidade. Dizem que os Pandorianos foram todos criados por mestres do caos. Eles são híbridos de animais e humanos. Eles conseguiram de algum modo se reproduzir entre si, formando uma nova espécie. O animal ficará com você por toda eternidade se assim você desejar.
“Isso é perfeito. Um animal que representa a sua personalidade? Isso é mais que posso desejar.”
— Os animais conseguem dominar Árvore? — perguntou Colin.
Brighid fez que sim.
— Assim como você, ele consegue dominar três Árvores de mana. São seres inteligentes e de força sobre-humana. Verdadeiros mestres do caos conseguem controlar até três Pandorianos, com todos conseguindo aprender três Árvores em que seu dono tem afinidade. Existem formas de conseguir controlar animais sem ser diretamente da Árvore do caos, mas isso é perigoso. No seu caso é mais fácil porque você praticamente nasceu para isso.
“Isso é assustador demais, dá para construir um pequeno exército.”
Ela continuou.
— Você consegue começar na Árvore do Caos, mas precisa de um animal para isso. Então você faz o pacto e ele ficará forte conforme você também fica. Recomendo que já vá pensando em um animal para realizar o pacto.
— Um gato — respondeu Colin.
— Essa foi rápida. Posso perguntar o porquê de escolher um gato?
— Gatos são caçadores da noite, sorrateiros e silenciosos. Conseguem escalar coisas altas e cair de alturas elevadas sem um único arranhão. Além de excelente reflexo e uma visão aguçada. É um animal perfeito para o que desejo fazer.
— O que exatamente você deseja fazer? — perguntou a Fada.
Após ver como Colin agia nos últimos dias, ela ainda tinha dúvidas sobre quais os seus planos reais. Para ela, ele ainda era uma incógnita.
Colin não queria dizer, pois, nem ele mesmo tinha certeza do que desejava. Sem saída, ele deu uma resposta conveniente para a ocasião.
— Quero ajudar todo mundo, não quer que seu povo seja livre novamente?
— Quero, mas…
— Não se preocupe. Não sou tão estúpido a ponto de enfrentar um caído em meu estado atual. Aprenderei toda minha árvore primária em um ano ou menos, então serei um Monarca do céu, certo?!
Arregalando os olhos, Brighid levou a mão a boca e sorriu.
— Você é o Meio Elfo mais estranho que já conheci. Gosto de você, Colin!
Colin cruzou os braços e desviou o olhar. Ele apreciava a companhia de Brighid, apesar de ela ser um pouco intensa demais.
— Falta uma tríade, certo? — disse Colin.
— Sim! — Ela continuou. — E por último, mas não menos importante, a tríade do outono, perfeita para assassinos e espiões. Nela temos a Árvore do Silêncio comandada por Abiscus. A do Transmuto, comandada por Lúmizis. E a da Penumbra, comandada por Zayuguir. Bem, acredito que você já sabe de todo o básico teórico, certo?
“Encontrar com esse tipo pode ser complicado. Assassinos e espiões são silenciosos, suponho que fiz mais que a escolha correto em escolher um gato com meu animal.”
Colin ergueu-se e apoiou as mãos na mesa. Primeiro encarou Safira, depois Brighid.
— É o suficiente por hoje.
— E quanto ao treinamento? — perguntou Safira.
— A gente treina amanhã de manhã.
Voejando para o alto, Brighid disse:
— Então se cuida, dormirei perto do Poty.
— Poty? — perguntou Colin. — Quem é Poty?
— É o nome que escolhi para o cavalo, hihi! — Ela apoiou o indicador no canto dos lábios e encarou Colin com o rosto corado, jogando seu charme. — Exceto se você desejar que eu perto de você, Colinzinho…
— Pode ir com o Poty — respondeu ele de maneira curta e grossa.
A fada fez beicinho e se retirou batendo as asas.