Insaydra - Prólogo
Era noite e a chuva batia forte do lado de fora da imponente mansão dos Hiveborn.
A graciosa Lady Charlotte, filha da venerável matriarca da aldeia, era uma criança de dez anos de idade, dotada não só de quatro braços delicados mas também de duas elegantes antenas negras que coroavam sua cabeça. Seus olhos, profundos e escuros, brilhavam como a noite.
Ela estava ansiosa por passar um tempo com sua mãe após um longo período sem se verem, vestindo um confortável pijama roxo que combinava perfeitamente com sua aura encantadora.
A Matriarca Celestia, com longos cabelos loiros, vestia um elegante vestido branco que fluía em torno dela, adornado com intricados padrões de prata que reluziam com cada movimento. Sua presença era marcada por uma pequena pedra com a cor de sangue, do tamanho de um punho, que irradiava uma aura quente e poderosa, um artefato que lhe conferia proteção e poderes mágicos ancestrais como se contivesse a própria essência da aldeia.
— Mamãe, mamãe, você pode contar aquela história de novo? — pediu Charlotte, enquanto se acomodava sentada no colo de sua mãe dentro de seu aconchegante quarto.
— Claro, querida, mas depois você precisa ir direto para a cama — concordou Celestia, acariciando os cabelos de Charlotte.
— Em uma distante floresta, havia uma montanha tão alta que parecia tocar os céus. No topo dessa montanha vivia um gigantesco dragão branco — começou Celestia, envolvendo Charlotte na história.
— Esse dragão protegia todas as outras criaturas que habitavam abaixo da montanha, mantendo a paz e a ordem. Sua alegria se transformava em dias ensolarados e suas lágrimas em chuvas benéficas para aqueles que viviam sob sua proteção.
— No entanto, devido ao seu enorme tamanho, era arriscado para ele descer até a floresta, sentindo-se solitário, observando dia após dia, as outras criaturas sem conseguir interagir com ninguém.
— Foi então que ele tomou uma decisão. Dividiu sua alma em três partes, dando vida a mais outros dois dragões, cada um representando uma faceta diferente de seus desejos: ambição, compaixão e sabedoria.
— Os dragões viveram em harmonia, cuidando da floresta e de suas criaturas. No entanto, suas visões divergentes sobre como manter a ordem levaram a conflitos que resultaram na destruição da floresta e da vida abaixo da montanha.
— Infeliz com o resultado de sua decisão, o grande dragão branco fragmentou sua alma junto com a de seus filhos, transformando-as em pequenas jóias brilhantes.
Charlotte se ergueu dos braços acolhedores de sua mãe e caminhou em direção à cama com passos curtos, seus cabelos loiros balançando suavemente ao ritmo de seus movimentos.
— Mas o que aconteceu com as joias? — perguntou Charlotte, enquanto se acomodava na cama para dormir.
— Dizem que aqueles que possuem essas joias têm seus desejos mais profundos realizados, mas isso é apenas uma história para crianças — respondeu Celestia, cobrindo Charlotte com as cobertas.
Contudo, Celestia coloca a mão no queixo com uma expressão pensativa.
— Falando nisso, já deve fazer muito tempo que não visito o pequeno Den — murmurou para si mesma.
— Você quer dizer o garoto estranho do orfanato, mamãe? — menciona Charlotte.
Celestia, com um olhar sério, adverte sua filha.
— Charlotte, não devemos julgar as pessoas por serem diferentes de nós.
Toc… Toc…
Nesse momento, Lord Celes, o irmão de Celestia, bate na porta interrompendo a conversa.
— Irmã, precisamos de você aqui — disse ele, abrindo a porta.
Celestia se inclinou sobre Charlotte na cama.
— Boa noite, minha pequena formiguinha — disse ela carinhosamente, dando um beijo na testa de Charlotte antes de sair do quarto.
Na manhã seguinte, Charlotte despertou com um bocejo longo enquanto se esticava, alongando os braços enquanto a chuva persistia lá fora, pintando o céu de tons cinzentos.
Ainda vestida em seu pijama e meias, ela vagou pela mansão em busca do quarto de sua mãe, Celestia.
Toc… Toc…
Charlotte bateu na porta do quarto de sua mãe, mas ele estava vazio. No corredor, ela encontrou seu tio Celes e, com uma voz sonolenta, perguntou:
— Tio, você viu minha mãe?
Celes, folheando documentos importantes, respondeu:
— Vejo que você acordou cedo hoje, Charlotte.
Com um sorriso sonolento da menina, ela comenta:
— Assim, posso passar mais tempo com a mamãe.
Mas logo Charlotte fica preocupada quando Celes diz:
— Receio que isso não seja possível, acompanhe-me.
A menina seguiu seu tio, começando a ficar ansiosa.
Ao chegarem à entrada principal da mansão, Charlotte viu sua mãe Celestia se preparando para sair, acompanhada por seus guardas.
— Mamãe? Você vai ter que sair de novo — disse Charlotte, com um tom triste na voz.
Celestia se aproximou e acariciou o rosto de sua filha — Desculpe, querida, tenho deveres a cumprir.
— Sendo quem você é, algum dia também saberá que terá de abrir mão do que deseja pelo bem de todos.
Charlotte enxugou as lágrimas com as mangas do pijama, resignando-se à partida da mãe.
— Tu…Tudo bem — murmurou ela, tentando aceitar a realidade.
Celestia partiu em suas carruagens guiadas por grandes besouros vermelhos, acompanhada pelos guardas. Celes, ao lado de Charlotte, colocou a mão em seu ombro, tentando consolá-la.
— Ela vai voltar antes que você perceba — tentando tranquilizar a menina.
Charlotte corre até uma das janelas do segundo andar da mansão observando as carruagens partindo no horizonte chuvoso.
*Meus desejos…*
Refletindo consigo mesma, enquanto o vento agitava suavemente as cortinas de seda.
Enquanto Celestia retornava à aldeia após dias de exaustivas reuniões com líderes da nação, a noite se transformava em uma madrugada fria e sombria. Sentada dentro de sua carruagem, ela segurava com carinho uma fotografia desbotada de sua filha, cujo sorriso parecia iluminar até mesmo os momentos mais difíceis.
O ranger das patas dos besouros ecoava pela estrada deserta, quando de repente a carruagem parou abruptamente.
— Desculpe interromper, Matriarca, mas temos um problema — diz um dos guardas, pelo lado de fora da carruagem.
Outro guarda caminha lentamente, com preocupação em seu rosto, enquanto seus olhos se fixaram na silhueta sinistra de uma arachna a alguns metros de distância.
A arachna caminha lentamente em direção a carruagem, com suas patas rangendo no chão de terra batida.
O silêncio da madrugada era quase palpável, apenas interrompido pelo sussurro do vento entre as folhas das árvores.
O guardas, com a mão firmemente na bainha da espada, avançando na direção da criatura, grita com sua voz ecoando pelo ar:
— Ei, você, saia do caminho!
— Eu não irei repe…
Antes que o guarda pudesse terminar a frase, uma teia o atingiu em cheio, prendendo-o contra o solo. Seus olhos se arregalaram em choque ao ver a arachna se aproximando rapidamente.
Os outros guardas, correm em sua direção, mas antes que pudessem chegar perto, ele tem seu estômago perfurado por uma das pernas pontiagudas da arachna. Sua armadura tilintou enquanto ele caía com seu sangue jorrando pela barriga.
A arachna, apesar de sua estatura imponente, era surpreendentemente ágil. Com movimentos fluidos e precisos, ela assassinava os guardas um a um, cada golpe sendo executado com uma destreza assustadora.
Os cavaleiros estavam sendo mutilados de forma brutal, seus membros sendo arremessados em todas as direções como se fossem simples peças de um quebra-cabeça. O som metálico de espadas se chocando contra a carapaça da arachna ecoava, misturado aos gritos de dor e desespero dos soldados.
Celestia, de dentro da carruagem sentia seu coração acelerar, ouvindo os ruídos de batalha se intensificando.
O odor de sangue impregnava o ar, misturando-se ao cheiro de terra molhada pela chuva recente. As folhas das árvores sussurravam como melodias tristes, como se lamentassem o destino trágico daqueles guerreiros.
Subitamente um estrondo ensurdecedor ecoou, fazendo Celestia saltar em seu assento.
A porta da carruagem foi arrancada brutalmente, arremessada para longe como se fosse de papel. Celestia ficou paralisada de terror ao se deparar com a arachna, seus seis olhos vermelhos brilhando na escuridão. As presas gotejavam um veneno letal, e seu corpo estava coberto de manchas de sangue e fluidos viscosos.
No momento em que Celestia se viu sozinha com a arachna, a adrenalina pulsava em suas veias. Com um movimento rápido, ela tentou alcançar a pedra de sangue pendurada em seu pescoço.
No entanto, antes que pudesse agarrá-la, a arachna lançou um golpe violento em seu rosto.
A dor latejante se espalhou pelo rosto de Celestia enquanto a pedra de sangue era arremessada para fora da carruagem, caindo no chão com um som abafado.
A mão robusta da arachna pressionava o pescoço de Celestia, causando uma sensação de sufocamento iminente.
— Sem minha irmã aqui, não vejo razão para continuar com nosso acordo — A arachna, com sua voz grave e autoritária, proclamou, enquanto mantinha Celestia firmemente presa.
Suas mandíbulas se abriram em um espectro de presas afiadas e venenosas, com o brilho da lua revelando o líquido escuro que gotejava de suas presas letais.
Celestia não conseguia proferir sem uma palavra sequer, com seu pescoço sendo pressionado.
As presas da arachna se cravaram em sua pele delicada, o veneno se espalhando rapidamente por suas veias. Cada mordida era acompanhada por um grito de agonia, seu rosto se contorcia em dor e desespero enquanto a arachna começava a devorá-la.
Após cada mordida, a pele se rasgava da carne do seu rosto, enquanto Celestia agonizava de dor.
Com o rosto completamente desfigurado, e os braços caídos inertes ao lado dela, seus olhos agora sem vida ficaram fixados no vazio. Celestia estava morta, e sua presença se transformara em uma figura pálida e tranquila.
A arachna, satisfeita por sua caça ter sido consumida pela morte, parou sua mordida venenosa, permitindo que o corpo da líder caísse no chão da carruagem com um baque pesado, enquanto se limpava passando o braço sobre a boca coberta de sangue.
A criatura, com seus movimentos ágeis, deslizou para fora da carruagem. O luar fraco destacava suas sombras enquanto se afastava, desaparecendo entre as árvores da floresta, como se a escuridão da noite a acolhesse em seu seio.
O que restava era um cenário de desolação, com os destroços da carruagem espalhados pela estrada em meio a corpos imóveis e silenciosos.