A Voz das Estrelas - Capítulo 1
Num cenário rodeado pelas mais variadas esferas de plasma, responsáveis por trazer o calor ao universo, o jovem enxergou uma figura alva.
Capaz de ofuscar todo o fulgor reunido sobre a escuridão, caminhou a passos curtos pela escadaria espectral, até alcançar o tenso acompanhante.
Suas mãos tremiam, mas ele não sabia o porquê. Sentia o suor correr pelo rosto quente, os pés que pareciam tocar um solo não se moviam.
Dominado pela aura mística daquela entidade, permitiu a aproximação ocorrer.
Quando as faces ficaram frente a frente, constatando a leve diferença de altura entre ambos, os lábios se tocaram.
O momento trouxe uma mistura de sensações indescritíveis ao rapaz, que não fazia ideia se sentia frio ou ardor.
O coração palpitava de maneira alucinante, o pulmão parecia gritar por mais oxigênio.
De pouco em pouco, engolido pela influência sobrenatural que o beijava intensamente, viu o ápice se desenrolar quando enfim levou as mãos até suas cinturas.
De fato, agora, aproveitava o máximo possível. Contudo não demorou a chegar ao fim. Acompanhado de balbucios incompreensíveis, os dedos gélidos da figura intensa tocaram sua testa.
— Jamais se lembre de mim… adeus.
O murmúrio entristecido, vertido em lágrimas cintilantes a escorrerem pela face pálida, fez tudo se apagar em instantes.
Apenas o vazio sobrou, junto a um sentimento de culpa inexpugnável.
☆☆☆
O jovem despertou em sua cama.
Não entendeu o motivo de enxergar o teto todo embaçado daquela forma até sentir fios úmidos escorrerem pelo rosto.
Levou uma das mãos a tocarem tal sensação com a ponta dos dedos. Notou serem lágrimas.
“Por que… estou chorando?”, a indagação veio em meio a uma fraca dor de cabeça.
— Por que está chorando? — A mesma pergunta foi feita pelo menino de pé, logo ao lado.
O silêncio tomou conta do pequeno quarto escuro.
O rapaz ainda encontrava dificuldades em compreender o peso que dominava seu peito, como se estivesse prestes a infartar.
Uma sensação de tristeza absurda a qual lhe fazia despejar o pranto copioso.
— Eu… não sei — murmurou em resposta conforme se levantava. — Só sinto que… tive um longo sonho…
— Vamos então, vê se acorda e se troca logo. O pai e a mãe estão esperando.
O menino deu o recado apressado e saiu pela porta do quarto, deixando seu irmão solitário mais uma vez.
Ele secou as lágrimas, se levantou da cama e caminhou até a pequena escrivaninha paralela a janela, coberta por duas cortinas de voil branco.
“Tenho que limpar isso”, pensou ao se encarar no espelho encardido, a borda de seus olhos de íris verde se mostrava bastante avermelhada.
Ao buscar fragmentos daquele sonho, não encontrou nada esclarecedor.
A exceção foi a dona da mensagem final. Tinha certeza de que a responsável tinha sido uma garota, mas não conseguia se lembrar de alguma característica física dela.
Nem mesmo a voz se parecia com a de alguma conhecida. Tudo que vinha era um fulgor estranho, tão intenso que ofuscava os detalhes mais acentuados pelo azul-escuro.
— Preciso ir…
Lembrou da mensagem passada pelo irmão mais novo, portanto abandonou aqueles pensamentos, assim como a lâmina de vidro do móvel.
Com o tempo, foi deixando a experiência de lado…
— Vamos, Norman! Estamos atrasados para o casamento! — Uma mulher gritou da escada.
Mesmo se não desejasse, seria impossível para o rapaz permanecer com aquilo na cabeça. Mal havia entrado no banho e já começava a escutar os chamados apressados de sua mãe.
Ele preferiu manter o silêncio.
A escolha em ignorar a pressão da mulher enquanto terminava de se preparar ao próprio tempo deveria piorar a situação.
Depois de se arrumar, o jovem saiu do quarto e fechou a porta irritado.
Vestindo uma roupa social, calça jeans e sapatos pretos, desceu as escadarias sem nenhuma pressa.
O ritmo adotado por ele era totalmente contrário a correria na parte de baixo da casa.
A exceção era o menino, sentado no sofá enquanto controlava seu PSP sem qualquer peso na consciência.
Sua missão foi acordar o irmão e ordená-lo a se apressar, portanto, não havia mais nada que ele precisasse fazer a não ser aguardar.
— Sempre dormindo demais da conta, não é!? Vamos ter que correr agora! — Mais uma vez a mulher reclamou.
— Eu nem queria ir, pra começo de conversa — rebateu o mais velho. — Vocês podiam ir sem me acordar, e…
— Já basta, garoto. Você já quase nunca sai de casa com exceção da faculdade. Fico surpresa que não tenha nenhum amigo que te arranque daqui!
Norman bufou diante das lamúrias irritadas de sua mãe, sem palavras para retrucar. Restringiu-se a pôr as mãos nos bolsos da calça e desviar o olhar na direção do caçula.
“Queria ter uma vida despreocupada como ele”, pensou.
— Parem de discutir e vamos logo — esbravejou o pai, com a chave do carro em mãos.
A mulher foi na frente, acompanhada pelos dois filhos logo na sequência. Todos entraram no carro, colocaram os cintos de segurança e partiram rumo ao casamento.
Diante do atraso, a pressa do homem na direção era visível, deixando até mesmo alguns sinais fechados para trás na tentativa de cobrir o tempo perdido.
A mãe continuava furiosa pelo fato de seu filho maior ter os atrasado por ter dormido demais.
Ele não dava a mínima.
A fim de ignorar as reclamações inacabáveis dela, colocou seus fones de ouvido.
Encostou o rosto no vidro ao lado, onde podia enxergar o bonito céu recheado de estrelas dos mais variados tamanhos.
Por algum motivo, aquele cenário estava o atraindo mais do que o habitual.
Talvez o motivo fosse a quantidade de tempo preso em casa.
A cerimônia foi programada para ocorrer a céu aberto. Norman ficou impressionado com a sorte dos noivos em escolher uma data tão precisa.
No fim das contas, a pressa não foi inimiga e a família chegou poucos minutos antes do início da cortesia principal.
Não houve tempo para falarem com os noivos àquela altura, então a única opção seria aguardar o início da festa.
Enquanto mãe e pai cumprimentavam diversos convidados conhecidos, o jovem desviava o olhar na tentativa de manter-se isolado.
Falar com pessoas desconhecidas não era seu forte então, para evitar constrangimento, preferia manter o silêncio.
Era completamente diferente do irmão mais novo, o qual sempre recebia as saudações alheias através de um sorriso gentil e respondia da mesma forma.
A troca de gentilezas prosseguiu até o anúncio do início da cerimônia, quando todos os presentes se dirigiram ao local designado.
Norman se sentou com seus pais nas cadeiras mais próximas do altar.
Levou um tempo até todos tomarem suas posições onde, em seguida, o ensaio matrimonial foi executado com a entrada dos padrinhos e madrinhas.
“Que chatice”, o garoto resmungou ao soltar um bocejo, pegando o celular guardado no bolso da calça.
Verificou algumas mensagens não lidas e e-mails de faculdade não respondidos.
De repente sentiu uma forte cutucada na perna, vindo do lado onde estava sua mãe.
Ao encará-la, encontrou um olhar afiado direcionado a si, o que o fez engolir em seco apesar do semblante despreocupado.
— Guarde isso agora… — ela murmurou ao pé do ouvido. — Tenha um pouco mais de respeito…
O garoto não quis rebater, somente fez o que sua mãe mandou.
Sem mais alguma desavença entre a dupla, a cerimônia prosseguiu ao curso natural até a entrada dos noivos.
Foi o momento de aclamação geral da plateia.
“Não entendo o porquê das pessoas adorarem o casamento”, ponderou com uma expressão fechada. “Só de pensar no ato de passar a vida inteira preso a outra pessoa… já sinto um desgosto tremendo.”
Diferente de todos os outros convidados, observava o momento da troca de votos no altar com aversão no olhar.
“O momento no qual as alianças são postas no dedo… é como se algemas fossem postas em seus punhos”, complementou o pensamento durante a troca de alianças entre os noivos.
Após a declaração final do padre, marido e mulher sacramentaram o beijo matrimonial, encerrando a cerimônia cobertos por aplausos e gritos de todo o auditório.
A grande maioria se levantou para prestar felicitações ao novo casal conforme retornavam pela passagem entre os assentos, mas Norman preferiu ficar onde estava.
Ele estava louco para que aquela sequência sem graça terminasse de uma vez, pois desejava tomar ar fresco em algum local distante dali.
Quando o evento foi encerrado, isolou-se numa área gramada a alguns metros de distância do local destinado à festa consequente.
Solitário, observava o bonito céu de verão com as mãos nos bolsos, um raro momento que fazia suas vistas brilharem.
“O Triângulo de Verão está bonito hoje”, enxergou a conexão entre as três estrelas chamativas, responsáveis por formar o dito asterismo.
O clima pacífico pôde ser apreciado durante alguns segundos…
— Por que está sozinho aqui? — E acabou interrompido pela aparição de sua mãe. — Vá comer alguma coisa, o buffet já está servido.
— Não quero…
Apesar da recusa do filho, que nem a olhou no rosto, a mulher soltou um suspiro e caminhou até ficar ao seu lado.
— Você é um garoto muito inteligente, não deveria agir de forma tão isolada assim. — As palavras dela não foram respondidas. — Fale comigo, meu filho. Há alguma coisa te incomodando…?
— Estou perfeitamente bem, mãe. — A interrompeu com rispidez. — Apenas me deixe em paz um pouco, ok?
A adulta sentiu certo baque com a resposta seca, porém manteve a firmeza no olhar e o respondeu:
— Como quiser.
Se distanciou sem dizer mais nada e o deixou sozinho de novo, como desejava.
Norman chegou a sentir certo remorso por ter a respondido daquela forma, mas manteve-se em silêncio, sem executar qualquer outra ação.
Voltou a observar a formação específica no céu, até que a dor de cabeça anterior se tornou ainda mais incômoda.
Chegou a inclinar o torso à frente, uma agonia quase insuportável localizada no lado esquerdo de sua testa o preencheu.
Segundos depois, o efeito se esvaiu lhe trazendo alívio.
“Que merda foi essa?”, ergueu novamente a postura após o estranho desconforto desaparecer.
Virou o rosto e não encontrou mais sua mãe.
Algo dentro dele o empurrava para procurá-la e pedir desculpas por ter a tratado daquele jeito.
Entretanto optou por permanecer inerte no mesmo local, mais uma vez as vistas foram direcionadas ao céu estrelado.
A partir daquele momento…
Tudo foi apagado.
★★★
“Onde… estou?”, lentamente abriu os olhos doloridos. “Que frio…”, repetindo piscadas demoradas, contemplou por um momento os pontos brilhantes que preenchiam a escurecida extensão superior.
Seu olho esquerdo encontrava-se coberto por sangue, que escorria de uma ferida aberta na altura da testa. Sujava as pontas do cabelo cacheado até alcançar o queixo.
Sentindo uma forte dor de cabeça, seus sentidos iam sendo recobrados.
O tato reconheceu a grama úmida na qual estava deitado, o paladar desejava rejeitar o gosto de terra que recheava sua língua.
O olfato e a audição foram restaurados no mesmo instante, respectivamente captavam um forte cheiro de queimado vindo de sua esquerda e ruídos de fogo crepitando.
Procurou se virar, mas o braço parecia estar quebrado. Perceber isso lhe custou uma dor que o fez ranger os dentes.
Com o retorno das atividades corporais, logo a ardência espalhada pelas pernas o afligiu. Um cansaço intenso o dominava física e mentalmente.
A ausência de forças em prol de se levantar se assemelhava a correntes prendendo todo o torso no chão frio.
Contudo não importava a dimensão da agonia; sentia a necessidade de se livrar daquela posição desconfortável.
E assim o fez.
Seus ossos pareciam estalar, os músculos com leves rasgos em diversas regiões gritavam.
O garoto teve sucesso em se erguer, experimentava o desconforto do pêndulo braço canhoto ao passo que girava o tronco inteiro.
Olhar para a fratura interna na altura do cotovelo lhe despertou náuseas.
Diante das dificuldades em apoiar o pé esquerdo no chão, imaginou que também estava lesionado.
De qualquer forma, mirou o clarão proveniente daquela direção e começou a avançar dentro do possível, rastejando a perna à medida que procurava reorganizar suas memórias.
Em meio a amplidão esbranquiçada, algumas lacunas borradas ganhavam destaque.
Não conseguir se lembrar de algo trouxe uma ânsia ao seu peito, sentia o coração ser apertado conforme os batimentos cresciam em velocidade.
Desejava chorar, mas não era capaz.
Seus pensamentos se dissiparam no instante que tropeçou em um pedaço de madeira, tombando de bruços no chão.
Engoliu um pouco mais de terra e sentiu o cheiro da grama entranhar nas narinas.
Manteve a firmeza por conta das dores por todo o corpo, assim conseguindo evitar o desmaio.
Nem mesmo tinha forças para soltar palavras de infortúnio, por isso restringiu-se a resmungar com a voz sussurrante.
Empenhou-se a ficar de pé ao empurrar o solo com o braço direito. Precisava seguir em frente, fazer o que podia.
“Tenho que prosseguir… tenho que continuar”, repetiu em sua cabeça para não entrar em síncope, flexionou a perna direita ferida com agonia e conseguiu se retomar o equilíbrio.
Tratou de tomar o fôlego necessário após a sequência pungente.
A chamativa iluminação alaranjada indicava seu sucesso em se aproximar do local.
A pouco passos de alcançar o fulgor, se deparou com um corpo caído próximo a uma árvore. Parecia um homem de meia idade trajado numa camisa social branca.
Na altura da barriga, uma enorme mancha de sangue chamava a atenção.
Embora não reconhecesse o rosto sem vida, experimentou uma estranha familiaridade durante a observação.
Seu coração acelerou por uma razão incompreensível, os olhos se recusavam a deixar de fitar aquela figura.
Se esforçou em virar o rosto junto ao torso, à medida que avançou novos passos até, enfim, alcançar a luz.
O fogo trepidava com intensidade, as chamas violentas envolviam um automóvel destruído.
Se desejava chorar antes, mas não conseguia, sequer percebeu as lágrimas escorrerem pelo rosto ao visualizar mais dois corpos entranhados nas ferragens do veículo.
Estavam ambos carbonizados da cabeça aos pés, não havia mais alguma perspectiva de vida para eles.
Tudo naquele cenário lhe trazia alguma intimidade.
Em um instante, as imagens borradas atravessaram sua cabeça causando um novo incômodo.
Levou a mão até a área lacerada na testa, conforme a dor localizada parecia piorar.
Sentindo uma pontada ardente ao tocar a ferida que formava um rastro ensanguentado pelo rosto, as memórias entraram em colapso.
Vozes ecoaram por sua cabeça numa velocidade anormal, trazendo um declínio à própria sanidade.
Não aguentava mais permanecer de pé, então acabou recaindo à frente no instante que uma voz soou:
Liberte-se.
As vistas arregalaram com o pranto a esvoaçar pelo espaço, notando que uma das árvores ao lado também era tomada pelas chamas.
Parte do maior galho podre ruiu com a intensidade do fogo. O alvo se situava logo abaixo.
Com a ausência de mobilidade, acabaria esmagado e se tornaria a nova vítima daquele cenário.
Mais uma vez escutou a frase pronunciada em uma voz suave, antecedendo a queda do tronco.
Uma fraca luz branca emanou do corte na testa e, naquele mesmo instante, o grande corpo parou em pleno ar.
O garoto ergueu o rosto sem compreender a estranha experiência, encontrou o próprio braço direito erguido com a palma aberta direcionada à madeira queimada, em um movimento de proteção.
Ele não fazia ideia sobre qual ação tomar após o testemunho anormal, então moveu o membro para o lado.
Para piorar tudo, o tronco seguiu a mesma direção do deslocamento executado, desviando em alta velocidade até tombar na grama com força.
Antes de conseguir pensar em mais alguma coisa, a dor de cabeça alcançou um nível grotesco, semelhante a um choque poderoso que lhe corroeu por inteiro.
Novamente suas funções falharam e o jovem voltou a cair, ao passo que a consciência se esvaía.
A última informação que seu cérebro captou antes de adormecer foi a do som de sirenes se aproximando.
★★★
O garoto despertou em uma cama confortável. Não reconheceu o teto. Ainda com dores pelo corpo, olhou para a claridade provinda da janela e percebeu estar em um leito de hospital.
Suas feridas foram devidamente enfaixadas após o tratamento recebido, o corte na cabeça encontrava-se suturado e o braço fraturado suportado por uma tala.
Não demorou até ser visitado pelos médicos responsáveis por seus cuidados. Depois de despertar em condições estabilizadas, foi interrogado por um psicólogo.
O psicólogo contou sobre o acidente que culminou na morte de seus pais e irmão mais novo, o que estranhamente não o afetou.
O garoto alegou não se lembrar de nada além do momento em que despertou por poucos minutos. Os únicos fatores recordados por ele eram o carro em chamas, os corpos mortos e o desmaio logo na sequência.
O fato de recordar o próprio nome já trazia algumas conclusões quanto a seu estado atual.
Ele aceitou as informações sem muito alarde, apenas assentiu com a cabeça em silêncio e assim permaneceu.
— É um caso de amnésia parcial. É provável que o trauma do acidente tenha causado um bloqueio em suas memórias, mas pelo que parece, não o afetou por completo. Você ainda se lembra de seus pais e irmão, apenas não remete aos momentos de antes e durante o acidente.
Um dos doutores especializados naquele tipo de trauma ofereceu a explicação enquanto segurava sua prancheta médica.
Ele esteve presente na maioria dos interrogatórios, que ocorriam diariamente com objetivo de checar a evolução do rapaz.
A resposta dele, mais uma vez, foi apenas confirmar em um aceno breve de cabeça. Sua íris quase não possuía luz, parecia muito distante daquele momento.
Diferente das enfermeiras que lhe traziam comida e medicamentos, o doutor não se preocupou muito com aquilo.
Era natural que o paciente passasse por aqueles efeitos pós-traumáticos. Por conta disso, encerrou a visita diária e se levantou do banquinho disposto ao lado da cama.
— Não se esforce muito. Descanse e qualquer coisa nos avise pelo dispositivo. Voltarei amanhã de manhã.
O doutor se virou e saiu do quarto junto do psicólogo que não retornaria mais.
Restaram apenas duas enfermeiras que terminaram de posicionar uma nova bolsa de soro no suporte de ferro e o deixaram solitário alguns minutos depois.
Quando a dupla saiu, o rapaz pareceu retornar ao mundo real. Se deitou e puxou o lençol até a altura do rosto.
Mesmo sem lembrar dos momentos cruciais, as memórias do passado pareciam estar retornando aos poucos. Adormeceu em meio a um misto de sentimentos calorosos, os quais não conseguia decifrar.
Norman permaneceu mais alguns dias sob observação no hospital.
Sua recuperação era lenta, o natural por conta das lesões ocasionadas pelo acidente.
Após três dias já conseguia andar com ajuda de uma muleta, o pé esquerdo também tinha melhorado da leve torção sofrida.
Com esse tempo, os resultados foram surgindo com maior clareza.
Enquanto isso, os corpos de seus pais tinham sido identificados e já estavam prontos para serem levados pela funerária, no intuito de receberem um enterro apropriado.
Desejava sair de uma vez daquele lugar para que todas as burocracias fossem atendidas, porém não tinha ideia do que fazer após essa fase.
Pela primeira vez ele estava sozinho.
Até mesmo nos corredores do hospital não se encontrava com muitas pessoas, sempre caminhando nos horários de baixo fluxo.
Conforme algumas lembranças retornavam a cada dia, voltavam os hábitos pessoais de antes do acidente.
Era muito mais confortável se exercitar em paz do que encontrar algum desconhecido pelo caminho.
A maior dificuldade encontrada durante a recuperação era a de dormir.
Sofria com algumas crises de insônia, logo só era capaz de adormecer em horários aleatórios.
Isso o levou a ficar acordado pelas madrugadas dos primeiros dias.
Incapaz de pregar os olhos e pegar no sono, saía de seu leito toda madrugada no intuito de realizar um tour pelo hospital.
O maior objetivo era se livrar daquele distúrbio, portanto, imaginou que funcionaria caso gastasse mais energia comparado o habitual.
O princípio da madrugada do terceiro para o quarto dia não foi diferente.
Ele estava prestes a receber alta para enfim comparecer ao enterro de seus familiares.
Ainda com sua muleta, por garantia, se levantou da cama e iniciou o passeio pelas alas hospitalares.
Tudo tinha sido muito tranquilo nos dias anteriores, por isso já dispunha os horários de saída e entrada bem definidos na cabeça.
Naquela noite, porém, um evento diferente ocorreu.
Ao chegar no pátio costumeiramente deserto, encontrou uma pessoa sentada em um dos bancos. Paralisou na passagem e pensou em retornar antes que fosse percebido.
No entanto foi incapaz de dar meia volta. Como se algo invisível o mantivesse inerte naquele ponto, fitou o cabelo branco amarrado em um rabo de cavalo daquela que era uma garota.
Sem reação alguma ao observá-la, contudo, não foi essa característica que mais chamou sua atenção.
Os olhos dela retinham uma coloração semelhante à do firmamento noturno e combinavam com o tênue sorriso estampado na face pálida.
De repente a vontade de retornar para o quarto esvaneceu. Manteve-se inquieto conforme a contemplava, serena.
O interesse em tal presença cresceu sem permiti-lo perceber.
Pela primeira vez, sua expressão ganhava cores mais vivas. As sobrancelhas se elevaram, a boca abriu fascinada.
Conforme experimentava uma atmosfera mística atrair sua atenção, sentiu como se aqueles olhos melancólicos conhecessem muito bem as estrelas cintilantes sob o céu escuro…
Enfim temos a primeira arte incrível feita pela minha querida amiga Deh, a artista oficial de A Voz das Estrelas, além de outras ilustrações dos personagens que você pode ver em meu Instagram! Se você chegou aqui e gostou da leitura, da história e da arte, não esqueça de passar no perfil da Deh para apreciar seu trabalho.
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