Vigilante Eterno - Capítulo 13
Vidal acordou com os tapinhas de Poti em sua bochecha. O jovem vigilante havia tido uma péssima noite de sono, acordando de instantes em instantes durante a noite.
— O-o que foi? — indagou Vidal com uma voz sonolenta, enquanto tirava as remelas dos olhos.
— Hora de levantar, vigilante — respondeu Poti, que tinha dormido no beliche de cima.
— Que horas são?
— 6 horas da manhã — respondeu Poti, olhando as horas em seu relógio eletrônico preso em seu pulso. — Todos já estão de pé, só falta você.
— O diretor já chegou?
— Não, ainda não — disse Poti, enquanto tirava a cortina que cobria a escotilha do dormitório, revelando um dia chuvoso e nublado. — Ele só deve chegar lá pelas 8 horas da manhã.
Após tomar uma ducha quente e escovar os dentes, Vidal foi até a cantina, onde diversos militares e funcionários da organização preparavam os seus cafés da manhã.
Vidal encheu o seu prato com diversos petiscos, distribuídos em porções no balcão. Com o prato pronto, Vidal e Poti procuram um canto vago onde poderiam saborear suas refeições, o que foi difícil, graças ao quão lotado o refeitório estava, até que Vidal escutou uma voz familiar ao longe, que disse:
— Ei, aqui!
Ao olhar em direção de onde vinha a voz, Vidal viu Maycon junto a Aline, que balançava a mão em sua direção. A dupla foi até os seus conhecidos, que estavam sentados em uma mesa no fim do refeitório, do lado de uma mesa lotada de funcionários e militares.
— Ainda dormindo em pé, Vidal? — perguntou Maycon de maneira descontraída.
— Acho que tive o pior da minha vida— respondeu o jovem vigilante, enquanto passava manteiga em uma fatia de pão, devorando-o logo em seguida. O rosto de Vidal carregava uma expressão tristonha.
— Então aproveite muito esse pouco tempo de lazer — disse Poti, mordiscando um pedaço de pudim. — Só Deus sabe o que o diretor tem planejado.
— Coisa boa não é… — disse Aline, segurando delicadamente uma xícara de café, enquanto assoprava o líquido quente.
Durante a refeição, Vidal não conseguia deixar de escutar a conversação do grupo de pessoas na mesa ao lado.
— Vocês viram as imagens de como ficou a vila após o ataque da criatura? — perguntou uma moça com um uniforme da organização, muito parecido com o que a secretária usava.
— Sim, eu vi. Horrível — respondeu outra moça, também uniformizada.
— Tsc! Esses vigilantes servem para quê, afinal? — indagou um militar de forma agressiva, cuspindo uma semente de tangerina na bandeja. — Eles se acham tão superiores a nós, pessoas normais, mas no final, seus poderes não impediram a destruição de quase metade da vila, além da morte de muitos civ…
— Tchiu! Não fale essas coisas aqui, não tá vendo quem está na mesa ao lado? — cochichou uma das moças.
— Eu quero que se foda. É bom que eles escutem isso mesmo para baixar os seus egos inflados — berrou o militar, claramente irritado.
Vidal, que escutou tudo aquilo, fechou os seus punhos, amassando o garfo de metal em sua mão. Quando estava prestes a levantar da mesa, ele sentiu alguém agarrando o seu braço. Era Poti, que continuava a encarar sua bandeja cheia, ignorando completamente o comentário do soldado.
— É inútil tirar satisfação com ele, não adianta — explicou Poti.
— Mas…
— Sente-se, agora! — ordenou Maycon, interrompendo Vidal.
— Você tem que entender uma coisa, Vidal: ninguém é obrigado a gostar ou concordar com o que você faz como vigilante. Contando que essas pessoas não tentem te impedir de fazer o seu dever, deixem elas gritarem e espernearem — disse Poti, com a mão no ombro do jovem vigilante, que já tinha voltado para o seu lugar.
— Ninguém pode agradar a todos, não é? — falou Maycon, soltando uma risada irônica logo em seguida.
O grupo seguiu com a refeição, enquanto tentavam ignorar as falas das pessoas ao redor, mas Vidal não pôde deixar de sentir a estranha sensação de estar sendo observado o tempo todo por todos naquele local.
Desde que entrou para os vigilantes, Vidal sentia estar sendo constantemente julgado pelas pessoas ao seu redor, já que era seu papel garantir a segurança delas, e caso falhasse em fazer isso, uma parcela da culpa iria cair em suas costas.
Agora, após o ataque na vila, Vidal sentia um enorme peso de culpa esmagando sua espinha, quase jogando-o ao chão. Ele não estava bravo com o militar pelo que ele havia falado, mas por saber que era verdade.
“Se tivéssemos nós preparados para qualquer tipo de situação inesperada. Se eu não fraquejasse nos momentos críticos. Se fosse outra pessoa no meu lugar…” os pensamentos autodepreciativos de Vidal foram interrompidos quando ele percebeu uma presença se aproximando pelas suas costas. A figura alta projetou uma sombra, que o engoliu por inteiro.
Ao se virar, Vidal deu de cara com um homem uniformizado, alto e corpulento. O militar carregava uma expressão vazia, era impossível tentar adivinhar o que ele estava pensando ou sentido naquele momento.— Algum problema, amigo? — perguntou Vidal, claramente intimidado pela figura imponente do soldado.
— … — o soldado ficou em silêncio, encarando Vidal nos olhos sem mudar sua expressão fechada. Poti e os outros na mesa assistiram à cena receosos sobre as intenções do homem. — Você era um dos vigilantes que estava na vila, não é?
— Sim, estava. Eu e o meu parceiro… — Vidal apontou para Poti usando a ponta do seu queixo. — …fomos os primeiros a chegar ao local.
— Por acaso foram vocês que ajudaram uma mulher que estava presa nos escombros de uma casa e o seu bebê? — perguntou o homem, com a voz chorosa.
— S-sim, fomos nós. Meu amigo arriscou a vida lutando com a criatura, enquanto eu ajudava a mulher e o seu…
Vidal interrompeu sua frase ao ver as lágrimas escorrendo pelo rosto do militar, que agarrou em sua mão direita e disse:
— Obrigado, muito obrigado
Vidal ficou sem reação ao ver um homem daquele tamanho chorar que nem uma criança, enquanto apertava sua mão com firmeza.
— Ontem, eu fiquei o dia inteiro procurando por minha mulher e filho, até cheguei a pensar que algo horrível havia acontecido com eles, mas graças a Deus eu os achei sãos e salvos — disse o homem, limpando as lágrimas em seu rosto. — Muito obrigado, de verdade! Se não fosse por vocês, eu não posso nem imaginar o que teria acontecido com eles.
Naquele instante, Vidal sentiu o peso que lhe esmagava desaparecer. Suas mente, que até então estava inundada de paranoia, agora estava completamente livre de preocupações. Naquele momento, Vidal soube que estava seguindo o caminho certo.
Era por volta de 08:30 quando o diretor chegou ao local de helicóptero, sendo recebido por diversos militares, que o escoltaram até a entrada do navio.
Larissa, a secretária pessoal do diretor, o apresentou ao grupo de vigilantes. O velho estava vestindo o mesmo terno que na noite anterior. Agora pessoalmente, Vidal pode perceber as diversas rugas espalhadas pelo seu rosto.
— Vamos direto ao ponto — disse o diretor após cumprimentar todo o grupo. — Onde está o prisioneiro?
Larissa guiou a todos pelos corredores apertados até uma sala localizada nos fundos do navio, guardada por diversos guardas armados e uniformizados com um traje de proteção que cobria todo o corpo. Após digitar uma série de número em uma tela presa a parede, a porta de metal foi destrancada, dando acesso à sala.
Ao entrarem no compartimento, o grupo foi surpreendido por uma tela de vidro grosso, onde do outro lado encontrava-se o escavador, detido em uma cama hospitalar, completamente impedido de mover qualquer parte do corpo além da própria boca.
— Ele já disse alguma coisa desde que acordou? — perguntou o diretor, enquanto tirava um pacote de jujubas do bolso, oferecendo a todos no recinto.
— Não, ainda não — respondeu a secretária. — O primeiro suspeito, aquele que se assemelha a um abutre, cooperou, contando tudo que sabia, mas esse em questão se recusa a falar qualquer coisa.
— Não me surpreende. O maldito preferia se matar a contar qualquer coisa — disse Maycon.
— Pelo jeito vamos ter que partir para o interrogatório — disse o diretor de maneira infeliz. — Não adianta termos o cara que sabe a localização da base inimiga se ele se recusa a falar.
— Pode deixar comigo. — Maycon estalou os dedos, como se estivesse preparando-se para o combate. — Vou fazer esse merdinha falar em 10 segundos.
— Nem pense nisso! — berrou Aline, empurrando Maycon para longe da porta que levava até o outro lado da sala. — Vamos tentar seguir o protocolo dessa vez, que tal?