Vida em um Mundo Mágico - Capítulo 33
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Vozes falavam no escuro. Uma conversa acontecia, um diálogo. Entre três pessoas, mesmo que uma delas não falasse tanto, parecia que não tinha voz, não naquele lugar.
— Você só conseguiu isso? — perguntava uma voz masculina, impregnada de decepção.
— S-sim… — uma voz feminina respondia, fraca e assustada, tremendo diante das palavras do homem.
— Eu não acredito… Querida, venha ver! — a voz masculina chamou a outra pessoa presente.
Então, daquele vazio, era possível ouvir sons de passos se aproximando, passos apressados e pesados. Uma figura feminina surgiu na escuridão, juntando-se ao grupo.
— O que foi? — perguntou a nova voz feminina, com um tom de impaciência.
— Veja isso — respondeu a primeira voz masculina.
— Mas isso é muito pouco.
— Foi o que eu disse a ela.
— Desse jeito não vamos nem conseguir viajar no final do ano.
As palavras voavam no ar, repletas de frustração e amargura. A criança, silenciosa até então, sentia-se como uma espectadora impotente diante do turbilhão de emoções.
— Ei, pirralha, nós te fizemos nascer, não acha que deveria ser mais grata? — perguntou o homem, sua voz aparentemente calma, mas com um resquício de ódio.
— Sim. Me desculpem… — a voz da criança trêmula, tentando se desculpar, mas sentindo o peso das palavras a sufocando.
— Esse foi um pedido de desculpas bem falso. Querido, acho que ela precisa de uma lição.
O coração da criança começou a bater aceleradamente, antecipando o que estava por vir. Ela tentou articular palavras em sua defesa, mas antes que pudesse pronunciá-las, a voz da segunda mulher interrompeu.
— N-não! Eu disse a verdade! Eu realmente sinto muito! — a voz da criança estava desesperada, tentando seu melhor para escapar daquela situação, mas estava aprisionada em um destino cruel.
— Por que está reclamando tanto? Você vai morrer assim que parar de ser útil para nós. — disse o homem, revelando seu verdadeiro caráter impiedoso.
— Uma criança amaldiçoada não tem o direito de reclamar.
E então, como um trovão ensurdecedor, os gritos ecoaram pelo espaço, cada vez mais intensos. A criança clamava por misericórdia, mas sua súplica era ignorada. Os gritos se enfraqueciam à medida que o tempo passava, e logo foram substituídos por tosses incessantes, que ecoaram pelo ambiente sombrio. A criança lutava para respirar, enquanto o som de algo pesado caindo no chão indicava um desfecho trágico.
Então, o silêncio invadiu o lugar. Era um silêncio profundo, penetrante, que preenchia cada canto daquele abismo. Nada mais se ouvia além do vento.
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Era uma manhã cinzenta no quarto 204. Embora o número marcasse apenas a identificação do aposento, lembrava a todos quem dormia ali, uma criança amaldiçoada, assim como tantas outras naquele mundo sombrio.
Toc toc
A batida na porta fez a garota despertar de um sono inquieto. Seus olhos prateados se abriram rapidamente, revelando uma profundidade sombria dentro deles.
— Já está na hora de acordar! — gritou uma voz feminina, familiar para a garota.
Ela se ergueu da cama com uma expressão triste no rosto. Seus cabelos brancos e desgrenhados caíam até os ombros, e um curativo adornava seu rosto. Sentada na beirada da cama, ela ouviu as palavras da mulher prosseguirem.
— Deixei seu café na frente da porta. Quando terminar, traga a bandeja para baixo. Coma rapidamente e vá trabalhar. Precisamos de dez troncos de madeira até o final da tarde. Eles serão usados no festival de amanhã. Traga menos do que isso, e você sabe muito bem o que lhe aguarda.
Os passos se afastaram, e a garota abriu a porta, deparando-se com a bandeja contendo pão e algumas frutas. Ela sabia que aquele não seria um dia feliz, mas isso não fazia diferença, pois os dias felizes pareciam ser raridade em sua existência.
Após comer, ela saiu de casa, evitando sua mãe ao máximo. A cidade em que vivia era simples, mas relativamente grande. Carroças passavam pelas ruas, cercas protegiam o gado e algumas casas eram construídas em pedra, contrastando com a maioria de madeira.
A garota pegou seu machado que repousava atrás da casa e adentrou a floresta, vestindo apenas uma camisa branca de mangas longas e calças pretas. Seus passos eram silenciosos, ecoando sua própria melancolia.
Dentro de sua mente, várias vozes falavam ao mesmo tempo, todas pertencentes a seus pais.
— Encontre esses ingredientes!
— Traga 100 litros de água. Precisamos armazenar, pois passaremos por um período de escassez.
— Vá caçar essa fera.
— Traga-me o minério que se encontra no topo daquela montanha.
A garota suspirou enquanto ouvia esses fragmentos de memória, responsabilidades impossíveis pesando sobre seus ombros.
— Não é a primeira vez que me pedem algo quase impossível, mas desta vez tenho certeza de que não vou conseguir. — murmurou a menina para si mesma.
Um som chamou sua atenção, fazendo-a virar-se na direção de uma árvore próxima. Seus dedos se envolveram firmemente no cabo do machado, preparando-se para o que pudesse surgir.
— Meu corpo é fraco, mal tive uma refeição decente. Como vou transportar dez troncos de árvore? Mas se eu não levar…….
Enquanto ela pensava, algo escuro apareceu. Entre os matos uma espiral apareceu. Algo escuro com uma linha branca rodando bem no meio.
A garota de cabelos brancos fitou a espiral branca com curiosidade e desconfiança. Aquela visão era incomum, e ela não sabia ao certo o que significava. Enquanto olhava fixamente para a minhoca, sentiu uma estranha sensação de familiaridade, como se a espiral estivesse conectada a algo profundo dentro dela.
Lembranças fragmentadas invadiram sua mente novamente. Imagens de um ritual antigo, símbolos misteriosos e uma voz sinistra falando palavras incompreensíveis. As vozes dos seus pais, as exigências impossíveis que a cercavam, agora pareciam se misturar com algo mais obscuro e sinistro.
A garota sacudiu a cabeça, tentando afastar essas memórias perturbadoras. Ela não entendia completamente o que estava acontecendo, mas tinha certeza de que aquela espiral branca estava ligada a algo além da sua compreensão.
Curiosa e, ao mesmo tempo, temerosa, ela decidiu se aproximar da espiral. Ao dar os primeiros passos em direção a ela, algo estranho acontecia: a espiral parecia se distanciar. Mesmo assim, ela persistiu, avançando com determinação.
A cada passo, a sensação de desconexão com seu próprio corpo aumentava. Ela não conseguia controlar seus movimentos, como se algo além de sua vontade a conduzisse. A voz em sua mente ecoava: “Eu não consigo parar. Não consigo controlar meu corpo! Essa coisa está mexendo na minha cabeça!”
Profundamente imersa na floresta, ela seguia a espiral como se estivesse sendo guiada por uma estrada de flores. A confusão sobre seu destino e o propósito daquela estranha caminhada a assolavam: “Para onde estou indo? O que está acontecendo? Essa espiral…”
Cada passo era mais desesperado do que o anterior, e sua mente se enchia de pensamentos obscuros e angustiantes: “Uma corda, talvez? Um lugar alto, preciso pular de um lugar bem alto? Eu quero morrer logo.”
Seus olhos se tornaram uma espiral, refletindo o turbilhão de emoções que tomava conta dela. Lágrimas rolavam pelo rosto, mas ela continuava avançando, incapaz de deter sua própria jornada. Sabia que não podia chamar por ajuda; seus pais não a ajudariam, e ela se sentia totalmente sozinha.
No entanto, um momento inesperado interrompeu o controle da espiral sobre ela. Uma explosão surpreendente destruiu a espiral, liberando-a de sua influência hipnótica. A cortina de fumaça erguida pela explosão pairava no ar enquanto a garota, incrédula, observava o que havia acontecido. Seus olhos voltaram ao normal, e ela finalmente se viu livre daquele domínio perigoso.
Uma voz masculina quebrando o silêncio atrás dela a assustou. Era um garoto de longos cabelos pretos e olhos vermelhos, dando-lhe uma aparência selvagem. Vestindo roupas negras e com unhas afiadas, ele aparentava ser uma menina à primeira vista, mas logo ficou claro que não era esse o caso.
— Ele controla mentes, estimula os desejos mais sombrios do alvo e, no final, faz com que tirem a própria vida. — explicou o misterioso garoto sobre a espiral que ela acabara de enfrentar
A garota olhou para ele, seus olhos cheios de pavor e confusão. Ele desceu da árvore e ficou de frente para ela, emanando uma aura assustadora. Ele era um pouco mais alto que ela.
— Quero dizer, você não parece tão bem. Ele fez você pensar em coisas horríveis, hein? — O garoto revelou seu entendimento da tormenta que ela enfrentara
Ela mal conseguia responder, ainda abalada pela experiência que acabara de passar.
— Ou você está com medo de mim? Acho que um pouco dos dois?
A garota abaixou sua cabeça e colocou suas mãos uma na outra, esfregando-as perto de seu peito. Ela estava formulando suas palavras, sem ter muito o que dizer, mas decidiu se apresentar.
— M-meu nome é Light…. Tenho 13 anos….. E…… Eu agradeço por ter me ajudado. Por favor, me perdoe pelo incômodo…
O nervosismo de Light era evidente, e o garoto logo ficou confuso sobre o que ele precisava fazer. O nervosismo dela parecia estar se transferindo para ele.
Ele olhou para o lado com uma expressão confusa, mas decidiu se apresentar também.
— Você acabou de me dar muitas informações… Meu nome é Victor Jarabahad, eu tenho… Bem, meu corpo tem 12 anos e sou um metamorfo.
A garota ficou surpresa, mas não disse nada. Ela apenas olhou rapidamente para ele e logo abaixou a cabeça novamente.
Victor pensou consigo mesmo: “Que constrangedor.”
No entanto, algo chamou sua atenção: o curativo no rosto de Light. Ele apontou para ele rapidamente, o que fez Light dar um pulo de susto.
— O que é isso no seu rosto? Onde você se machucou?
A garota colocou sua mão no curativo e pareceu se distanciar ainda mais.
— Eu me machuquei em casa…
Victor aproximou sua mão direita em direção à garota, o que fez Light fechar os olhos com força enquanto pensava: “Ele vai me bater também? Se sim, vai doer muito.”
Mas, de repente, uma voz falou em sua cabeça.
» Ferimento está sendo curado. «
» 『Habilidade de Regeneração Rápida』 adquirida.«
Uma luz verde começou a circular no local do ferimento, e o curativo caiu no chão.
» Ferimento curado com sucesso.«
— Prontinho, sumiu. — disse Victor
A garota começou a chorar. Aquela foi a primeira vez que alguém foi gentil com ela, algo tão estranho, mas ao mesmo tempo confortável, que ela não conseguia parar de chorar.
— Ei! O que foi? Ainda está machucada? Ei! Me responde! — Victor repetia, claramente preocupado.
Light secou suas lágrimas na manga de sua camisa.
— É que ninguém nunca foi tão gentil comigo.
Ao ver aquilo, Victor colocou suas duas mãos no rosto da garota.
— Eu não sei o que aconteceu com você, mas olha só, tá tudo bem agora. — ele disse com uma expressão serena
A garota permitiu-se ficar ali parada, e um pensamento passou por sua cabeça: “Que estranho, esse sentimento de segurança. A mão dele é tão quente, ser tocada assim está me acalmando.”
Victor retirou sua mão, o que deixou Light surpresa e envergonhada de certa forma.
— Mas o que você está fazendo aqui?
— Eu preciso levar dez troncos de árvore até o final da tarde. Mas não sei bem como vou fazer isso….
— Tudo isso? Você vai se machucar desse jeito. Eu te ajudo com isso, tá bom?
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E então, mais escuridão. Mas um brilho levemente foi aparecendo, no céu havia aquela bela Lua brilhante.
Victor abriu seus olhos e viu a floresta à sua volta. Aquilo rapidamente o levou de volta ao presente. “Esse sonho de novo. Claramente não consigo ter paz.”
Em cima de uma árvore estava um garoto ruivo dormindo silenciosamente, aquele era Sariel. Victor então olhou para baixo e viu que Eloá estava dormindo em sua perna, parecia estar bem confortável.
Victor suspirou e decidiu agir. “Shapeshifter, cubra ela”, ordenou com uma voz baixa.
Shapeshifter obedeceu imediatamente. Victor olhou para o céu novamente, suas emoções vinham e sumiam sem deixar rastros, mas ele pensava em algo: “Merlin, eu tô fazendo o certo?”
A incerteza pairava sobre Victor enquanto o tempo avançava. O ataque se aproximava rapidamente, e ele se perguntava se suas ações estavam no caminho certo. A responsabilidade pesava em seus ombros, e ele sentia a pressão da decisão que tomara.
Enquanto a noite avançava, Victor permaneceu acordado, contemplando as sombras que se moviam ao redor. Cada instante era crucial, e ele precisava se certificar de que estaria pronto para o que estava por vir.
A escuridão parecia envolver a floresta, amplificando a tensão no ar. Victor olhava atentamente para os arredores, observando cada movimento suspeito e preparando-se mentalmente para caso precisasse lutar contra algum monstro que tentasse atacar.
O tempo passava lentamente, e o sol começava a despontar no horizonte. A aurora trazia consigo um misto de esperança e apreensão. Era o último amanhecer antes do confronto decisivo.
Victor sentia a adrenalina correr em suas veias, impulsionando-o a enfrentar o desafio com coragem: “Se eu passar por isso, posso ter uma chance de ver Merlin outra vez, não posso recuar, mas se eu não conseguir vencer….. Não. Eu vou vencer, vou passar por cima de todos os inimigos na minha frente, como um verdadeiro monstro faz.”
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