Venante - Capítulo 25
— Diferente…? — perguntou o garoto, tentando acompanhar o provecto.
O que estava dizendo era algo que Leonardo pensou muito desde que se tornou um Singular, afinal, por mais que houvesse algumas figuras famosas entre os Singulares, ainda eram minúsculos em comparação com os de outra Categoria.
Ser um Singular era raro, mas ser um e famoso era um feito para poucos.
— Lembro que você falou disso na sua entrevista com Isabela… — Abriu um documento no Nelink, analisou por cima e continuou: — Você falou dos três casos onde Venantes fracos venceram os Graus de Energia.
Ele queria dar uma pequena risada, visto que esses três casos eram um pouco exóticos para qualquer jovem na atualidade.
— Ah…! — Leonardo acabou por lembrar. — Verdade. Eu falei. — Ele pareceu impressionado com o fato que o Dragão Verde tinha verificado tudo o que falou no dia do teste. — O Rei das Bestas, o Espada Suprema…
Sem deixar o garoto dizer tudo, o provecto finalizou: — E a Catalyzer. E é dela que quero falar contigo.
O adolescente sentiu seus pelos arrepiarem quando ouviu o título da Venante. Afinal, nesse mundo, o nome dela era como um tópico que poucos comentariam. Foi por conta dela que o sistema de Auct sofreu uma reestruturação, pois era…
— A Singular mais perigosa do mundo… — Leonardo sabia que esse assunto seria de altíssimo sigilo, afinal, tudo o que a mulher realizou foi escondido e apenas a ponta do iceberg era disponível ainda.
Rafael suspirou. Quando tinha acabado de ativar o seu Auct pela primeira vez, o nome de Catalyzer já estava nas alturas, cerca de 40 anos atrás. Ele viu a mudança acontecer com os próprios olhos.
— Como sabe, o Rei das Bestas foi o primeiro. Mesmo sendo um Grau C, ainda foi capaz de bater de frente com o Grau S. Só que foi morto em uma rampage. Depois veio o Espada Suprema, um Grau E. Morto em uma raide em um Portal de Ameaça Iminente, aos 25 anos.
Por mais que o Dragão Verde estivesse falando o resumo do resumo dos Venantes que conseguiram feitos imensuráveis, Leonardo sentia que era só para alcançar o assunto principal. Em sua mente, pedia que esses dois fossem abordados em uma aula futura, com foco no Espada Suprema, já que era um de seus ídolos.
Nessa hora, chegando no ponto que desejava, o provecto soltou um longo suspiro e fechou os olhos para pensar como abordaria daqui para frente.
— E Catalyzer… A Singular de Grau F- capaz de absorver Energia de tudo nesse mundo.
— Tudo?! — Ele gritou pasmo. — Mas eu li que era apenas dos Anômalos.
— De fato, era dos Anômalos, mas isso foi durante a Fase Infantil. Diferente de nós, que liberamos nosso Auct graças a droga de ativação, ela foi capaz de ativar sozinha aos 12 anos.
Chegando nesse ponto, era complicado falar sem tocar em informações confidenciais, logo, teria que pensar muito antes de falar. Leonardo ficou apenas encarando com os olhos brilhantes. Era tanta informação nova que tinha exposto sua personalidade aventureira.
— Não foi cedo que Catalyzer ganhou sua alcunha, mas após alcançar o Grau B e registrar sobre os Despertares.
— Despertares? O que é isso?
Apesar do descanso, o coração do jovem começou a bater mais vigoroso, semelhante à quando entrava em combate com um Anômalo. Quanto mais o Agente falava dessa Singular, mais queria saber.
— Bem, como ela foi uma das fundadoras da Associação e fascinada em pesquisas, ela amava registrar qualquer nova descoberta, principalmente no campo da Energia. E seu último registro foi sobre a sua ida até o meteorito…
Com a pausa longa do outro, o garoto completou por ele: — Foi quando ela morreu… No ano 110, no caminho do meteorito na Romênia.
Rafael deu uma demorada encarada em Leonardo, como se quisesse dizer algo. Porém, só finalizou dizendo: — Ao menos é o que dizem.
— Você não acha isso? — Duvidoso, ainda perguntou, já que poderia tirar algo mais. Estava criando milhares de teorias só com essa curta conversa. — Não teve ninguém que voltou do meteorito até hoje.
— Catalyzer, antes de ser uma pesquisadora, era uma maníaca por poder. Dizem que, depois de ter chegado no Grau S, tinha a capacidade de absorver a Energia até de outros Venantes. Se ela foi para aquele lugar, era para conseguir algo. — Suas sobrancelhas apertaram ao terminar de falar, não entrando em detalhes maiores.
— Mas… ela nunca voltou.
A curiosidade estava estampada no rosto do menino, mas não havia como falar mais do que já tinha falado, então, preferiu manter para si.
O Agente pigarreou e exclamou: — Enfim. Despertares foram a forma como Catalyzer nomeou o efeito que acontecia ao subir de Grau. Porém, isso só é possível com os Singulares, já que eles…
— Não tem Revoluções? — refletiu em voz alta, completando o provecto.
— Exato. As Revoluções são o resultado de treinos constantes com os Aucts. Algo que um Singular jamais conseguiu atingir.
O que Rafael estava citando era uma das bases desse mundo. Desde as Fases de Crescimento até as Revoluções, eram os conteúdos que todas crianças aprendiam de seus pais e nas escolas. Sendo o último algo comum para todas Categorias, exceto pelos Singulares.
— Vou focar apenas na sua Categoria, já que vai estudar ainda mais as outras no colégio. — Ao terminar, o holograma das Categorias entrou em ação outra vez.
Como era um conhecimento comum, as Fases de um Auct eram o evento mais precioso de um Venante. Durante a Fase Infantil, assim como uma criança, o Auct estaria em constante aprendizado, havendo melhoras fortes a cada uso. Era durante essa fase onde acontecia mais Revoluções, mas não era em si o principal efeito.
Leonardo já tinha feito uma lista mental de todos os problemas que teria com o seu Auct até o momento, então estava ciente que não podia contar com uma Revolução para uma melhora. Seu foco era treinar bastante para aproveitar a Fase Infantil.
Por mais que tivesse alguns Singulares famosos que poderiam falar um pouco como foi o crescimento de seus Aucts, ainda era uma informação muito pequena. Assim, teria que aprender sozinho como crescer. Para a surpresa dele, hoje, aprendeu que havia uma forma parecida com a Revolução para Singulares, mas, para isso, teria que aumentar o Grau de Energia.
Nessa hora, para cortar os pensamentos do garoto, Rafael falou em um tom mais alto: — Como eu sei que é um garoto estudioso, já deve saber me dizer a Rivalidade dos Singulares.
Rivalidade era um dos dois efeitos comuns das Categorias — Harmonia e Rivalidade — onde o Auct do lado oposto seria o Rival, demonstrando fatores opositores em um nível mais básico. Assim como um Transmorfo e um Invocador, onde o primeiro poderia se transformar em uma fera e o segundo seria capaz de invocar uma fera para lutar por ele.
O adolescente de olheiras já parecia preparado para responder, visto que era um assunto que dominava.
— Os Manipuladores. Eles são os que mais passam por Revoluções também. Ao contrário dos Singulares, são capazes de externar os seus poderes.
Externar. Era outro termo comum nesse mundo. Existia a ordem dos Internos e a ordem dos Externos. Singulares, Físicos e Transmorfos faziam parte do primeiro, enquanto Manipuladores, Suportes e Invocadores eram do último. Isso se devia ao fato de seus Aucts inicialmente não serem capazes de realizar o mesmo efeito que o Rival.
Por exemplo, os Suportes eram capazes de curar mais rápido outras pessoas, enquanto um Físico, que seria seu Rival, seria capaz de ter uma regeneração poderosa. Durante a Fase Infantil, os Internos e Externos eram bem mais destacados. Porém, conforme seus Aucts cresciam, mais conseguiam demonstrar capacidades de variar de papel.
O provecto estava ciente que Leonardo já sabia muito do assunto, porém era importante fazê-lo notar que, por mais especial que fosse, ser um Singular era perigoso e muito difícil.
E, instintivamente, sabia que o garoto tinha percebido o motivo de estar sendo caçado por um espião agora. O medo que Catalyzer trouxe ao mundo não era algo que foi esquecido. Um Singular era uma poderosa arma estratégica, então, deveria ser escondida muito bem.
— Porém, um Despertar é algo que apenas Catalyzer conseguiu. Isso é algo que não será possível para você agora. Então, vamos focar apenas no que importa: A Fase Infantil. Você pode me dizer para o que ela serve?
Para trocar o foco da discussão e fazer o jovem parar de encará-lo com os olhos brilhantes para saber mais da Singular mais perigosa, o provecto fez perguntas para testar os conhecimentos básicos.
— Bem, além das Revoluções… tem o crescimento básico para a Harmonia.
Leonardo parecia um pouco relutante, já que era um assunto ainda em estudo — por mais sólido que fosse — depois de saber da Catalyzer, podia haver mais coisas escondidas sobre a história dos Aucts.
— Está correto. De início, vamos desconsiderar as Revoluções; por mais que elas também ajudem muito na Harmonia, não fará diferença para você. Contudo, a Fase Infantil de um Singular, sim.
A Fase de Crescimento dos Aucts — ou como chamavam, “Fases” — era algo que todos Aucts passariam. Já a Harmonia, diferente do Efeito da Rivalidade, era a capacidade de uma Categoria alcançar a vizinha. Assim como um Transmorfo era categorizado como um Auct Interno, após alcançar a Harmonia, seria capaz de demonstrar feitos como o Rafael, que podia criar fogo verde de sua mão, que também era relacionado ao seu poder original.
— Diferente de todas as Categorias, os Singulares demonstram uma lógica básica. Um Singular por natureza é colocado na Classe Exclusiva, ou seja…
— Não existe outra pessoa no mundo com o mesmo Auct. — Leonardo nem esperou e completou, mostrando que estava acompanhando o assunto.
— Sim. Parecido com a Classe Mítica, como a minha, os Singulares são dotados de uma Harmonia de início, mesmo sem precisar de Revoluções. Por exemplo, você é capaz de invocar um espaço na sua mente onde é capaz de simular incontáveis vezes e diferentes criaturas, além de poder mudar a forma como é colocado nesse espaço. E essas duas características combinam muito bem com as suas Categorias vizinhas: Invocação e Físico.
Ele traçou uma linha com o dedo pelo holograma dos Aucts, esperando a reação do garoto.
— Eu escutei sobre isso antes… — Colocou a mão no queixo e continuou: — A Invocação é uma Categoria muito aberta, já que existe Invocadores capazes de trazer até Anômalos que nunca foram vistos… Esteve em estudos por muito tempo e não conseguiram encontrar o motivo. Mas isso quer dizer que pode ser por causa de ser vizinho do Singular? Se for assim… Eu conseguir sentir como se fosse a vida real no mundo Simulado é por causa do vizinho Físico também…?
Leonardo começou a falar consigo mesmo, refletindo constantemente em voz alta. O Agente queria continuar, mas ao ver o que sua explicação gerou na cabeça do outro, ficou quieto e deu um pequeno sorriso.
Depois de um tempo falando sozinho, estava em êxtase, mas começou a se controlar.
Rafael pigarreou e disse: — Terminou? — Com o aceno constrangido da outra parte, ele só pôde balançar a cabeça. — Estou dizendo isso para não se preocupar com o Efeito da Harmonia. O que você precisa focar agora é usar constantemente o seu Auct e desenvolver diversos estilos, utilizando-o com total capacidade. Só assim a Fase Infantil será bem desenvolvida.
— Entendi, entendi. — Animado, balançou a cabeça.
— Certo, você deve ter ouvido sobre…
Rafael e Leonardo aproveitaram a conversa. Um ensinando e o outro preenchendo as lacunas que faltava em seus estudos. Dessa forma, o descanso foi bem mais rápido e pareceu passar em um piscar de olhos.
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Logo, mais de vinte horas se passaram…
Leonardo se via de frente com uma Anomalia sem olhos e de pele branca.
— Essa é a décima segunda, a última, rapaz. Depois de perder e morrer tantas vezes, acredito que vencerá sozinho dessa vez.
O garoto se encontrava sem camiseta, por conta de tantas vezes que foi atingido, tendo a roupa de cima rasgada em pedaços. Seu peito inflava pesado. O físico magro, pálido e frágil que exibia era preenchido de uma aura confiante dessa vez.
Por mais abatido que parecesse, com o cabelo sujo e bagunçado, um sorriso de alívio surgia de sua boca. Enfim aquele inferno terminaria.
Sem dar um segundo para o inimigo agir, falou com ânimo: — Ativar!