Uma Nova Lenda Surge - Capítulo 24
— Eiii…! Shorn! O que você acha de aprender um pouco mais sobre as coisas do universo?
Falo descontraído com o livro que estava lendo, para relembrar sobre o seu conteúdo, em meio à biblioteca da qual fomos colocados.
— …
— Sabe… Eu estava aqui pensando comigo, talvez tenhamos começado com o pé esquerdo, mas nada que não possa ser mudado né?! Por isso estou dispondo para você a chance de obter parte de meu conhecimento para compensar!
— Com esse… Conhecimento… Eu poderei… Salvar outros…?
— Talvez, isso não depende de mim, depende de você!
— Aceito… — Ela resmunga, se escondendo com o livro em mãos.
— Que tal responder olhando os meus olhos?!
Ela se virá calmamente ainda com o livro em mãos, escondendo parte de seu rosto com ele, antes de continuar:
— Eu… Aceito… — Ainda em um resmungo ela responde.
— Realmente você não tem jeito. — Respondo em um suspiro. — Certo, vamos começar com o básico do básico, algo que até um tolo como você entenda.
Ela se aproxima calmamente da mesa e senta na cadeira a minha frente abaixando o livro que segurava e o pondo sobre a mesa.
— Antes de mais nada Shorn, eu quero que você esqueça tudo o que sabe e aprendeu, abandone até seu nome se possível e inicie uma nova vida.
Talvez eu veja isso mais como uma forma de redenção que tutela, quem sabe algum dia me perdoem pelos meus pecados cometidos no passado.
— Agora que você já se esqueceu vou lhe contar um pouco sobre nossos arredores. Estamos em Kazi Cadere, uma região separada do que chamamos de Universo, um lugar onde criminosos se escondem e planetas condenados são lançados.
— Por quê?
— Bom, nessas terras criaturas, como aquelas que te atacaram, vivem e se reproduzem, devorando tudo que tem ao redor acabando aos poucos com a vida das coisas, às vezes algumas dessas criaturas podem acabar escapando e indo parar em outro planeta o destruindo por completo.
— E não tem… Como detê-las…?
— Até tem, mas… Como você viu, essas criaturas são extremamente poderosas e podem matar qualquer ser não divino com um golpe, no entanto existe pessoas que foram encaminhadas para trabalharem matando e eliminando esses seres, mesmo custado as suas vidas, o nome que foi atribuído a eles é Caçadores, apesar de não serem fortes o suficiente para aguentar mais de um golpe, eles sabem se cuidar.
— Os homens… De assas pretas…. São caçadores…?
— Não! Eles são o que chamamos de Corvos, criaturas entre o sacro e o profano aos olhos humanos, mas na verdade eles são só uma espécie de ser humano que pode-se dizer que evoluiu a partir dos corvos, de certa forma.
A jovem Shorn agora permanecia com os olhos brilhantes por aprender coisas que nunca poderia sequer ver durante a sua vida normal.
— É uma pena ver que alguns planetas ainda não tiveram a oportunidade de evoluir para aprender mais sobre as coisas ao seu redor, tolos e ingênuos que acreditam estar acima de todas as espécies, é por isso que a maioria é escravizada ao sair de suas terra natal.
— Escravizada…
— É mesmo… A escravidão em seu planeta natal foi “abolida” a mais de mil anos, bom de qualquer forma isso é algo comum por aqui, o que me lembra que… Você terá que fingir ser minha escrava por um tempo.
Ela me encara com espanto, vendo onde seria colocada na hierarquia do local.
— Não precisa se preocupar, você não terá que fazer nada de absurdo, apenas algumas simples tarefas, como, me dar banho, me servir durante refeições, trocar minhas roupas e acredito que só. Pense que isso é apenas para manter as aparências.
— Não! — Ela responde em um rouco berro
— Sinto muito Shorn, mas é isso ou se prostituir para mim, e sem duvidas eu prefiro a primeira opção, não quero ter a inconveniência de relações sexuais, isso deixa a mente do ser mais tola, por isso prefiro usa-lo só para questões reprodutivas.
— Não… Tem… Outra opção?
— Até tem, mas nela você não fica ao meu lado e a sua segurança estará totalmente fora de questão, o que pode ocasionar até em sua morte ou a ativação de sua libido.
— Ce… Certo…
— Muito bem! A partir de hoje você será a minha empregada pessoal, e os seus deveres são simples, não precisa se preocupar eu cuidarei bem de você.
Três batidas são dadas na porta, antes de um Corvo abrir a porta com calma.
— Os aposentos do Senhor já foram preparados. Me chamo Jsnark, serei a responsável por vocês dois durante a sua estádia aqui, por favor Senhor Kardurins, siga-me por aqui.
A figura escondida em meio às placas de metal pesado segue pelo longo corredor a passos sinuosos e elegantes nos guiando até o pequeno quarto de cama de casal no qual eu e Shorn ficaríamos alocados durante os próximos dias.
— Se precisarem de qualquer coisa, não hesitem em me chamar.
— Não se preocupe, só desejo que tragam se possível uma série de livros para os meus estudos e três refeições a cada vinte e quatro horas perante o sol Dicidia.
— Quanto às refeições o senhor não precisa se preocupar, no entanto sobre os livros verei o que posso fazer pelo senhor, mas não espere muito de mim.
— Não precisa se preocupar, não serão livros de grande peso, serão mais para instruir a pequena ali para me servir mais adequadamente.
— Compreendo meu Senhor, mas nesse caso não seria melhor acorrenta-la e deixar junto dos outros?
— Me desculpe, mas preciso que ela cuide de meu corpo durante a nossa estádia também.
— Sinto muito meu Senhor, nesse caso posso pedir para que enviem outras mais maduras para o Senhor também.
— Ela será o suficiente, agora se não se importa, tenho assuntos importantes a tratar com ela.
— Mil perdões. Se o Senhor me der à licença.
Fechando a porta, dava-se para ouvir os passos pesados da Jsnark se afastando do quarto para ir realizar os seus demais afazeres.
— Pronto, não seremos mais incomodados por um tempo, agora Shorn, vou pedir para que retire a sua roupa, se quiser pode se manter com as roupas de baixo, preciso fazer uma pequena analise medica em seu corpo.
— O senhor… Falou que… eu não teria… Que fazer esse… Tipo de coisa!
— Não precisa se preocupar preciso só analisar a saúde de seu corpo e ver se não contraiu nenhuma doença parasita nas ultimas horas, por isso falei que poderia permanecer com as roupas de baixo, então vá logo.
Ainda com o medo no olhar a pequena criança segue as minha palavras e começa a retirar lentamente a roupa que a cobria, o pequeno shorts e a pequena camisa foram as primeiras, logo em seguida a longa meia que é deixada sobre as pequenas sapatilhas.
— Ótimo, por favor faça a pose de um T.
Ela abre os braços fazendo a pose, eu me aproximo e vejo calmamente a sua pele branca com o suor, sangue e poeira que se mantiveram desde que viemos do metro.
As suas axilas permaneciam normais e sem resquícios de nenhum parasita ou ferida que poderia vir a causar algum problema.
Seu peito ainda intocado pelas energias do mundo, o coração batendo ritmicamente em uma velocidade agradável.
Infelizmente o pequeno corpo humano dela não possuía músculos e colocar uma grande preção sobre ele poderia causar até a sua destruição.
— Certo, se vista temos muito que fazer, mas antes durma, você precisa repor as suas energias se quisermos prosseguir.
— …
Sem falar mais nada a pequena Shorn põem as suas roupas com lagrimas sobre os olhos, talvez estivesse com medo do que está por vir, não posso negar que a partir de agora ela estaria condenada, mas talvez eu consiga fazer ela ter um destino melhor que a morte.
O silencio toma a “noite”, a pequena criança dormia tranquilamente na única cama do quarto, enquanto eu relia alguns livros para reabsorver seus conteúdos.
— A cada dia me lembro mais quem eu sou… Mas afim de que?
A cada minuto que passava a minha mente era mergulhada por memórias de meu passado, e tudo por causa do gatilho dado por aquele cubo.
As mortes que causei, as pessoas que salvei, as almas que condenei, e tudo isso para que? Para rever uma pessoa que está cada vez mais próxima de mim.
Para onde quer que eu olhasse lá estava o seu doce sorriso me chamando, os seus longos fios de cabelo balançando em meio ao vento, a sua pálida pele reluzindo em meio aos raios que a atingem.
Diria até que ela seria o meu primeiro amor se a minha história fosse uma comédia romântica, mas não passa de uma verdadeira tragédia, contada a partir dos olhos do verdadeiro demônio tolo…
— A Verdade é como uma bela jovem correndo pelos grandiosos campos floridos… É por isso que quero vê-la antes que eu desapareça…
— Noooohw… — Uma espécie de miado ressoa pelo cômodo de uma maneira um tanto quanto hipnotizante.
— Eles não limpam esse lugar?
Eu me viro na direção da cama onde a pequena Shorn permanecia adormecida e vejo próxima a cabeceira à criatura que emitia os sons.
Um ser que lembrava a uma pelúcia com cara de gato, o seu corpo era comprido e esguio tendo cerca de uns quarenta centímetros de altura, se apoiando pelas patas traseiras ele observava a pequena garota dormindo, com seus olhos sem vida.
Levanto-me e ando lentamente até a cama, onde a criatura já abria a sua boca grande o suficiente para arrancar a mão da menina em uma única mordida, mas antes que realizasse o ataque à criatura se vira em minha direção, ainda com a boca aberta.
Seus olhos sem vida penetram em minha carne, mas quem fica extremamente assustada é a criatura, que logo retrai a boca e começa a recuar lentamente para trás ainda me encarando.
— Meow! Para você também.
Dou mais dois passos para frente e a criatura desiste de sua vitima colocando as duas patas, felpudas, da dianteira no chão e se põe a correr rumo à ventilação do quarto.
— Como se eu fosse deixar você correr!
Avanço na direção da criatura que pulava em desespero para os tubos da ventilação, mas sem sorte, eu agarro uma de suas patas e a puxo faltando pouco para que ela conseguisse fugir pela ventilação.
— Aonde é que você pensa que vai?! — Falo segurando a criatura pela pata, a dependurando de ponta cabeça, enquanto encaro o seu rosto inexpressivo.
Ela tentando se defender retira suas grandes garras e as finca em minha mão a arranhando inutilmente.
— Antigamente a sua espécie começava pela cabeça, talvez seja uma tática de vocês já que os shirglitsus podem se regenerar…
— Nooooohw….
— Calma, calma eu já lhe solto por toda a eternidade, brincadeira eu vou te matar mesmo.
A criatura arranhava a minha mão em desespero para se soltar à medida que eu fechava cada vez mais ela, não demoraria muito para que a pata do animal se partisse.
— Se eu não estou errado a sua carne é conhecida por ter uma quantia extrema de proteínas e vitaminas, acho que será perfeita!
Enquanto ainda seguro a pata da criatura levo a minha mão até a sua cabeça onde começo a puxar com força até separa-la do resto do corpo, enquanto a melodia da criatura em tormento ecoa no ambiente.
— Shorn, eu sei que está acordada. — Falo segurando a cabeça e o corpo do animal, agora morto, em minhas mãos, com seu sangue ainda pingando sobre os meus pés.
— O que… É isso…?
— Um Shisparno, pode relaxar que eu já matei ele, irei pedir para que façam ele para comermos, por sinal, fome?
A pequena barriga da criança ronca respondendo a minha pergunta.
— Certo, pode esperar aqui lendo aqueles livros, mesmo que você não entenda nada, tenta se esforçar um pouco, pois não terei o dia todo.
— Por que… Você… Matou ele…?
— Hum… Ele é mau, acho que seria isso? Não… Acho que a melhor forma de explicar é a lei do mais forte, ele é mais forte do que você logo ele iria te matar para se alimentar, mas você é a minha protegida no momento e eu sou mais forte do que ele, logo quem vai comê-lo somos nós.
— Entendi…
— Deixe-me levar essa carcaça logo, caso contrario não iremos comer tão cedo.
Vou até a saída do quarto, deixando manchas de sague sobre o velho soalho de madeira, que era polido todos os dias.
— Tenho pena de quem limpa isso. — Falo em um tom sarcástico.
Sigo até a recepção onde o Corvo que ficava como porteiro me olha assustado e corre em minha direção com um pano para embrulhar o animal.
— O que o Senhor está fazendo fora dos seus aposentos?
— Queria pedir para cozinharem a carne desse animal, apenas isso, e por sinal, é bom enviar um dedetizador para os dutos, pois esse não deve ser o único.
— Entendo a situação Senhor, mas lhe peço para não sair mais de seus aposentos a menos que seja pedido.
— Certo, certo! Não precisa repetir, mas antes você tem algum livro na língua desse planeta? É que eu preciso ensinar a minha escrava mais sobre o universo, sabe ela foi abandonada ainda pequena e eu não preciso de inúteis sem conhecimento.
— Verei o que posso fazer Senhor, mas agora você se importaria?
— Tá bom, o maluco estressado…
Volto para o quarto antes que alguém mais me visse, Shorn permanecia quieta acima da cama, tentando entender a língua de outros mundos mais avançados que o dela, mas provavelmente não estava entendendo nada.
— Uma pena que o seu mundo seja tão subdesenvolvido, não chegaram nem na viagem espacial…
— Mas… Nós já… Enviamos… Vários foguetes… Para fora dele…!
— Vai por mim, vocês nunca fizeram uma viagem de verdade, são limitados e fracos e agora o seu planeta não passa de uma terra sem leis, onde os monstros caçam, os assassinos se escondem e pessoas são escravizadas e mortas.
— Mas…
— Tem certeza que vai discutir comigo? Minha memória não foi cem por cento reestabelecida, mas eu com certeza sei muito mais do que você, afinal eu tive que sobreviver nessas terras.
Afinal eu caminho sobre esse universo desde seu inicio…
— Certo…
— Mas não se preocupe, como eu disse você é a minha protegida por agora, em outras palavras assim que eu tiver uma oportunidade lhe abandonarei, mas você já será mais forte do que é.
Quanto tempo será que iria durar? Não poderia deixar a mercê da sorte, será que os Corvos estão recrutando?
Ficamos um tempo ali no quarto, e progredimos um pouco na fala Zarcamach, mas Shorn ainda enrolava a língua no Sha e Kak, já que o som é similar.
Até que batem três vezes na porta antes de abri-la, segurando um carrinho com uma grande panela e tigelas em sua parte superior, e algumas pilhas de livros na inferior, Jsnark entra cuidadosamente no quarto.
— Como o Senhor pediu.
— Shorn pode se servir e ir comendo, enquanto isso irei conversar com a Jsnark, pode comer tudo se isso lhe satisfazer.
— Gentil de sua parte chamar um escravo pelo nome.
— Eu sei, mas apesar de tudo ela é um ser vivo.
— Chega a ser engraçado ouvir essas palavras do Senhor.
— Bom, se você não se importa podemos conversar fora do quarto, não quero que ela ouça.
— Entendido.
Seguimos para fora do quarto fechando a porta em sequencia, ficando apenas a alguns metros do próprio quarto em si.
— Então sobre o que o Senhor gostaria de falar.
— Sabe… Na verdade eu quero me livrar dela, apesar de útil ela é uma pedra em minhas botas, e eu sei que vocês poderiam torna-la em uma guerreira excepcional.
— Em outras palavras o Senhor quer que treinemos a sua escrava?
— Não, eu quero que a aceitem em seu exercito, ela não responderá mais a mim, mas sim a você, vai por mim ela é bem obediente.
— Posso ver o que dá para fazer, mas preciso testa-la antes, por isso vou pedir para ficar com ela a partir de hoje.
— Perfeito! Eu literalmente não tenho saco para crianças, teve uma vez que “adotei” dois irmão, e até hoje estou tendo problema com eles, mesmo depois de adultos…
— Lidarei com isso de imediato, por sinal recebi uma resposta da central, o chefe quer ter uma reunião com o Senhor, ele chegará em doze horas, então a tempo para descansar.
— Agradeço desde já, é o seguinte entre lá e apenas leve a Shorn sem contar nada para ela.
— Entendido.
Retornamos ao quarto onde Shorn já alimentada permanecia sentada lendo um dos livros trazidos por Jsnark.
— Shonr, você irá passear para conhecer um pouco mais do prédio, não se preocupe com nada que a Jsnark cuidara de você!
— Isso é… Um adeus…?
— Olha não é bem assim… Tá na verdade é, eu consegui uma forma de lhe proteger sem que você sofra e ainda por cima treina-la para ter uma vida no futuro, coisa que eu nunca conseguiria lhe dar, já os Corvos sim.
— Obrigada…
— Você ficará bem, nas minhas mãos você provavelmente morreria em dois a três dias aqui em Kazi Cadere.
— Senhorita Shorn, por favor me acompanhe.
— Sim…
As duas caminham até a saída do quarto me deixando sozinho novamente, eu caminho até a cama e me deito relaxando todos os meus músculos.
— Você tem certeza que essa foi a melhor decisão. — Uma voz feminina ressoa em minha mente, em um tom de desprezo.
— Não sei quem é você e nem estou afim de me mexer!
— Gostava mais de você quando lutava nos campos da justiça.
— Acho que me confundiu com outro.
— É devo ter me confundido, afinal eu nunca faria um pacto de sangue com um fracote como você.
— Eu não ligo, te conheci quando não tinha boa parte de minha memória mesmo!
Infelizmente eu sabia quem estava falando, a katana que permanecia embrulhada não era uma espada, ela era um ser vivo, só era de uma raça pouco conhecida, afinal não havia muita informação sobre esses seres.
— Você sequer se lembra sobre o ritual que fizemos quando ainda éramos pequenos…
— Não lembro nem de trinta por cento das coisas que vivi!
— Isso me entristece… Afinal, você foi o meu primeiro amor…
— Uma pena!
Ela suspira e logo prossegue:
— Você se corrompeu mesmo… Mas ainda não lhe deixarei, irei resgatar essa sua alma que se corrompeu.
— Fique a vontade para tentar, enquanto isso eu correrei atrás da minha primeira paixão.
— Ainda lhe terei novamente.
Ignoro a doce voz que se entristecera, e tento me colocar para dormir, afinal em breve eu deveria me encontrar com o líder dos Corvos.