Trupe Elemental - Capítulo 59
— John, eu não posso fazer isso. Você sabe muito bem que terá consequências, e olhe para você. Desfazer o selo seria o mesmo que aceitar sua dominação por completo, acredito que não seja isso que você queira. — Disse Mary.
— Não me importa as consequências, Mary. Já está acontecendo, uma hora ou outra ele vai conseguir, com ou sem sua ajuda. É por isso que eu preciso que faça isso manualmente, antes que ele faça. — John respondeu.
— Desde quando isso tem acontecido? Não era para ser assim, este selo tem uma das maiores capacidades possíveis que eu conheço! — Disse Mary.
— Há um bom tempo, para ser sincero. A última vez que ocorreu foi quando finalmente encontrei minha espada. Quando eu a toquei, era como se eu tivesse congelado no tempo, não conseguia sentir meu corpo, e muito menos o que estava acontecendo ao meu redor. Quando eu recobrei a consciência, a batalha já havia terminado, e adivinha só? Nós éramos os “vencedores”, Mary… — Disse John.
— Desde sempre eu tento lutar contra isso, mas está ficando cada vez mais difícil, cada dia que passa eu tenho a impressão que se torna quase que impossível dominá-la. Vai chegar a hora em que eu voltarei a ser quem eu era. Impiedoso e implacável, este atual irá sucumbir ao vazio absoluto. — Completou.
— Eu não irei permitir que isso aconteça. Eu te fiz a promessa de suprimi-lo até o dia em que você irá conseguir, não vou parar até lá! — Mary respondeu.
— Eu só não entendo como você está perdendo para ele. — Mary perguntou.
— E acha que eu sei? A minha hipótese, talvez seja que ele sempre soube como desfazer o selo por si mesmo, e com isso foi se enfraquecendo com o tempo, bem debaixo do meu nariz, sem eu saber. — John respondeu.
— Eu venho tendo alucinações, e às vezes em meus sonhos, ele aparece para falar comigo. É sempre um mistério o que ele diz, nada faz sentido, mas eu ainda sinto que há uma mensagem por trás de tudo que ele fala, só não consigo interpretar ainda, ambos estamos cientes do que somos, mas eu ainda não aceitei. — Completou.
— Então é melhor que faça o que eu havia pedido. Retire o selo, e libere o que foi perdido para o tempo e as memórias! — Disse John, olhando bem nos olhos de Mary.
— Eu já entendi. Mas eu devo te lembrar novamente. A remoção do selo pode causar efeitos colaterais, os quais não posso medir. Até mesmo que parte de sua vida seja retirada de você como um catalisador do feitiço… — Disse Mary.
— E que diferença isso faz? Minha vida já está sendo tomada de mim, há muito tempo desde que decidi carregar comigo esta espada… já virou algo comum, não tem problema algum. Vamos logo com os preparativos! — John respondeu.
Sem mais questionar, Mary inicia os preparativos para remover o selo presente em John. Primeiro ela pega de sua estante, uma jarra vazia e coloca no chão, logo depois ela empurra a mesa para o lado, deixando o centro do lugar livre de quaisquer obstáculos. Em seguida, ela pega um punhal e faz um corte na mão esquerda de John, para depois pedir para que ele derrame o sangue dentro da jarra.
Mary volta à estante, e pega um pote, tampado e cheio de líquido vermelho dentro, Ela então derrama todo o conteúdo do pote na jarra onde continha o sangue de John e os mistura lentamente.
— O que era aquele líquido vermelho que você colocou ai? — John perguntou.
— Sangue. Sangue de Cobra Grande, você deve se lembrar. — Mary respondeu.
— Falta pouco para eu terminar. Por último, vou precisar que você se sente no chão, de pernas cruzadas e não se mexa, por favor. — Completou.
John se senta no chão exatamente como ela disse e permanece parado de olhos fechados. Mary pega um pequeno pincel, e com ele desenha em volta de John um círculo mágico utilizando ambos os sangues misturados que estavam na jarra, ao terminar ela recita uma magia que cobre o lugar onde estão com uma barreira.
— Está pronto. Podemos começar quando estiver pronto. — Disse Mary.
— Pois então comece! — John respondeu.
Mary se afasta de John e do círculo mágico, em seguida ela retira da cintura, seu grimório e o abre no chão. Ao começar a recitar o feitiço, o grimório começa a flutuar em sua frente e runas saem de dentro dele, cada uma delas se dirige aos extremos do círculo mágico e se gravam no chão, como se tivessem sido desenhadas. Mary então, ergue ambos seus braços e finalmente começa.
“Sob o poder do sangue e da impureza, os justos que caíram em agonia uma vez retornam a si, clamando por sua redenção. Eu evoco as chamas purificadoras para corroer os males e libertar este homem!” — Diz Mary recitando uma parte do feitiço.
Uma pequena chama surgiu do círculo mágico, e o cobriu de chamas, deixando John em torno delas, que por sua vez se assustou por um breve momento. Em torno do círculo e do grimório, era possível ver algo semelhante a almas flutuando próximo de Mary enquanto ela recitava o feitiço.
“Os espíritos, uma vez presos e privados de sua liberdade, revelem-se! O que foi perdido há de retornar, tudo que foi esquecido pelo tempo e pelas memórias, há de retornar, liberte-se de seu confinamento eterno e volte para quem você um dia foi. Retorne do vazio, eu ordeno que quebrem suas correntes e destruam o selo da Dualidade Infinita!” — Disse Mary, o final do feitiço.
Em um instante, as almas que flutuavam em torno de Mary, entram dentro do círculo mágico, e John começa a gritar como se estivesse sentindo uma dor insuportável, correntes espectrais, vermelhas como sangue surgem do círculo e se agarram a John, fazendo seus gritos ficam ainda mais intensos. O entorno do lugar começa a tremer e tudo ao redor cai, a pressão é tão grande fazendo com que John fique no chão, sendo a única a ficar de pé seja Mary.
Enquanto John está caído no chão, uma enorme sombra se ergue atrás dele, Mary ao olhar para ela em meio a todo aquele caos, consegue sentir perfeitamente as emoções negativas dela e de sua aura avassaladora. Apontando sua mão para ela, Mary conjura uma magia que a estilhaça, fazendo com que ela desapareça.
Quando Mary achava que havia tudo sob controle, a sombra aparece novamente, diante dela e sussurra em seu ouvido “Você me aprisionou uma vez. O mesmo truque não funciona duas vezes comigo, Serpente.” Ela faz com que Mary tenha uma visão, ela se assusta e se desequilibra, perdendo o controle do ritual, as páginas de seu grimório começam a se rasgar e mais almas começam a sair dele e entrar no círculo.
Com John agonizando, e temendo que ele fosse se machucar ainda mais, Mary fecha o grimório e interrompe o ritual. As chamas presentes no círculo se extinguem e aquela pressão avassaladora no lugar some completamente, fazendo com que tudo volte ao seu estado normal.
— Não…! Isso deveria ser impossível, como ele saberia?! — Dizia Mary.
Ainda sem entender o que havia acontecido, e se recuperando, John se levanta lentamente do chão, o corte que estava em sua mão esquerda sumiu e seus ferimentos da batalha contra o Devorador estavam se curando aos poucos sozinhos.
— Ugh… Mary, o que você fez?! O que aconteceu!? — John perguntou.
— Eu… eu fiz o que você pediu… Mas temo que algo tenha dado errado, algo muito sério aconteceu, John… — Ela respondeu.
— Hã?! Você não está sendo clara! Eu quero uma resposta concreta, quero saber o que você fez! — Disse John.
— Me dê um tempo, está bem? Podemos conversar melhor daqui alguns minutos, não acho que vou conseguir dormir hoje a noite, não depois disso tudo. Me espere aqui, eu vou… tomar um pouco de ar. — Disse Mary.
Mary deixa o lugar sem dizer mais nada, John também não a questiona, mas fica pensativo, olhando para seus ferimentos que estavam se cicatrizando sozinhos com o passar dos minutos. Ele começa a desconfiar de que Mary havia feito algo que ele não sabia. Inúmeras coisas passavam por sua cabeça naquele momento, mas uma em específico perdurou. “O que exatamente eram aquelas coisas que se assemelhavam a almas?” John não havia notado muita diferença em si, mesmo após o término precoce do ritual.
— Ela não fez isso porque eu mandei… — John sussurrou.
— Tem razão, ela deve ter feito por outros motivos… — Uma voz próxima disse.
John se virou rapidamente procurando de onde vinha a voz, mas ele não a encontrava. Ele ouviu a voz mais uma vez de longe. A voz continuou a falar com ele, até o momento em que Mary retornou, foi só então que cessou. Atribulado com tudo aquilo, John tentou obrigar Mary a lhe explicar o que ela havia de fato feito. Ele sacou sua espada e apontou contra ela, dizendo que só abaixaria caso ela contasse a verdade.
— Mary! O que você fez! É melhor você me dizer, agora! — Disse John, com raiva.
— Você tem certeza de que quer saber? Eu não acho que seja uma boa ideia, John, acredite em mim, pelo menos desta vez! — Disse Mary.
— Me diga, Mary. Esse ritual que você conduziu, não foi meramente para desfazer o selo, não foi? — John questionou.