Trabalhe! - Capítulo 46
Dia 3
12:09
— Crédito ou débito. — Lembro dessa pergunta, depois disso já não estamos mais naquele café.
Só sei que segui aquele calor que me confortava, entrei num carro e acabamos em um parque, ou seja, fui sequestrado pela Susi, só pode ter sido isso!
Andamos lentamente, direita, esquerda, direita, esquerda. Permaneço focado nas minhas penas que se movem. O medo é realmente assustador, confiar nos outros, pedir ajuda, ou se abrir, sei que existem aqueles que fazem isso com naturalidade, mas para mim parece pavoroso, assustador, um grande monstro.
Por que? Por que? Por que? Isso nem faz sentido, eu devia confiar neles, mesmo assim não consigo,. Merda! Me sinto culpado por isso, mesmo que queiram me ajudar não consigo confiar em ninguém.
— Desculpe por isso, mas podemos sentar aqui, ainda tem coisas que quero falar — Por algum motivo, invento de dizer isso quando vejo um banco.
Nenhum dos dois responde. Nos sentamos no banco. Palavras não são necessárias. Silêncio. Pii! Canto dos pássaros, ou o alarme de um carro, não sei imitar som, nem enche.
— Naquele momento meu otimismo se foi, me senti tão desesperado que cogitei tirar minha vida, me senti sem razão para existir. — Eita porra! Eu falei isso mesmo? Tipo, fui eu, ou tô ouvindo coisas.
Minha mente entra em negação.
Palavras, elas são esse negócio que a gente usa para se comunicar e eu acabei de dizer várias delas, né?
O peito aperta muito, tem uma obesa sentada nele, só pode.
— Ha! Ha! Ha! — Para piorar, me falta fôlego.
E o silêncio reina.
Olho o céu azul, sem nuvens, sem nada, o sol já está descendo. Inclusive, sou bom em supor o horário olhando para o céu, chuto que três da tarde, talvez um pouco mais cedo, me pergunto como todo esse tempo passou.
— Por sorte, não tive coragem de o fazer; mas… daquele dia em diante, não era mais capaz de imaginar um futuro. — Porra, de novo!
Por que tudo parece tão distante?
Será que é um sonho?
Sim, tem que ser um sonho! Não falaria disso tudo em outra situação.
Me belisco… MERDA! PORRA! VAI TOMAR NO CU! Não é um sonho.
Olho para cima, não acho que tenha mais como eu parar a esse ponto… que saco! — Nesse período comecei a frequentar uma igreja, já não lembro seu nome, também, foda-se.
Sim, eu lembro o nome, mas não vou entrar em mais detalhes do que isso, me recuso! Me recuso e me recuso! Não quer lembrar e foda-se, vai se foder.
— Honestamente, todas as minhas lembranças daquele tempo são confusas. Lembro de… sorrisos, me senti acolhido, doei dinheiro que não tinha; sorrisos, desabafava lá todos os dias; sorrisos, me diziam para ficar longe de psicólogos eles são malignos. Sempre com sorrisos acolhedores, fiquei cada vez pior… ou melhor?
Tecnicamente, só não me matei por causa deles, mas não quero pensar sobre isso! Odeio tudo sobre o meu passado, sim, tudo sobre aquilo é ruim e ponto, ficar pensando muito é um saco!
Vou só continuar contando o resto da história de merda e pronto, já tá bom, né?
— Me lembro bem disso, fantasiava, todos os dias… Sério, sem exceção, fantasiava com alguém me salvando todo santo dia. Achava que merecia, tinha sofrido tanto, por isso o mundo tinha que me recompensar, todos me deviam, todos tinham obrigação de me salvar.
Por que entrei no papo tão filosófico? Que merda! Não podia só… na verdade, cansei de reclamar, vamos só acabar com isso.
— Egoísmo, solidão, auto piedade, desespero, um pequeno crime, estava com muita fome naquele dia, um furto, fui pego em flagrante. — Começou a chover, acho.
Continuo falando sem parar, mesmo que de maneira confusa, infelizmente não consigo conjecturar de maneira melhor.
E parece que a chuva fica mais forte, vejo até umas gotas caírem no chão na minha frente.
Não sei como minha voz está soando, ou como minha explicação se parece, mas, provavelmente, é algo confuso, patético, agoniante.
— Preso, dívidas, nome sujo, injusto, injusto! Eu gritei, bati no policial, agressão; às coisas apenas pioraram, mas consegui me acalmar. Fingi estar bêbado, queria evitar ao máximo ter que ver um psiquiatra ou algo do tipo.
Nem lembro das informações direito. — Peguei uma pena, não lembro ao certo quanto.
— Eram para ser 4 anos, mas isso apenas se tivesse tido um bom comportamento. Nunca descobri o porquê, mas soube que aumentou sua pena por má conduta. — E Felipe sabe mais da minha vida ue eu, tô bem, foda!
— Sim, estava indignado, apenas 25 anos, mas sem qualquer perspectiva, o primeiro ano foi de ódio, me sentia abandonado, mas sabia que mesmo naquele tempo nunca te odiei. — Começo a explicar para meu velho amigo, quero tirar esse peso das costas dele. — Até hoje lembro que estava triste ao olhar para mim, mas já morava e vivia muito longe, não teria como ter dinheiro para ficar me visitando, muito menos para me ajudar, por isso nunca te culpei.
Pelo seu rosto ainda sente culpa. Infelizmente não posso fazer muito sobre isso, arrependimento é uma corrente e fardo que colocamos em nós mesmo, não sou eu que pode… pera! Desde quando eu penso em assuntos complicados assim? Sério, o que estou fazendo?
Pior, por que estou chorando? Dá vergonha, eu preciso fugir disso, já chega, se continuar assim eu vou acabar contando tudo. Não quero isso!
Eu paro de falar.