Trabalhe! - Capítulo 26
Dia 1
7:37
Susi tenta me provocar com a gravação, imagino que como uma forma de deixar o clima melhor, mas isso não funciona.
Sem saber como reagir ao que eu mesmo disse, digo: — Desculpa te pegar de surpresa, mas esses sentimentos começaram a surgir…
Merda! Idiota, essa frase não melhorou nada, e por que eu estou agindo como um retardado ficando nervoso assim? Que saco!
— En-entendo, eu achei que você me odiasse. — Os olhos da Susi vasculham a casa procurando onde olhar.
— Já te perdoei há muito tempo…acho. Não sei, eu te odeio um pouquinho, mas ao mesmo tempo… — Que situação merda, eu até queria falar mais sobre isso, porém…
Não consigo, porra!
— Êh… Eu vou contar sobre o orfanato agora, vou só pegar alguma água para beber. — Qualquer coisa serve, só preciso mudar o assunto.
— Sim, sim, vamos.
10:23
Acabamos ignorando minha declaração, pelo menos por enquanto, de qualquer jeito não tenho coragem para comentar mais nisso.
Sou genial consegui destruir o clima e forçar o assunto para o que não queria, tô indo bem.
Resolvemos sair de casa para conversar enquanto andamos Por isso fomos a um belo parque ao ar livre, o clima já parece estar melhor.
— Não sei se ficou sabendo, mas algum tempo depois de sua saída a administração do orfanato foi trocada. — Acabo com o silêncio.
Susi concorda com a cabeça. — Eu fiquei sabendo, também trocaram a maioria dos professores, né? Não sei os detalhes, mas acabei descobrindo sobre isso quando pesquisei.
— Entendo, bem depois que a troca de gerência ocorreu, houve também uma mudança de mentalidade, o foco do orfanato se tornou esportivo, naturalmente os focos de investimento mudaram.
Ela mostrou um rosto de compressão. — Por isso quando visitei havia apenas alguns computadores sobrando, assim como novas quadras.
Digo que sim com a cabeça. Logo depois, nos sentamos para contemplar as pessoas correndo, andando de bicicleta e se exercitando.
— Claro, não é como se fossem pessoas ruins, posso dizer que sem dúvidas se importavam com os alunos, simplesmente acreditavam que teríamos muito mais chance nos destacando em esportes do que estudando.
Por que estou falando sobre isso? Achei que nem lembrasse direito.
— Além do mais, na época houve uma redução na verba bem grande, por isso ficamos cada vez mais dependentes de doações, consequentemente a gerência foi atrás de apoiadores.
Susi observa atentamente, isso é desconfortável, não olhe tanto.
— O novo gerente era um ganhador olímpico, por isso naturalmente foi atrás daqueles com quem já tinha contado. Conclusão, recebemos apoio de várias bases de times profissionais, que doaram equipamentos velhos entre outras coisas, de certa forma foi alcançada uma solução.
— Porém um certo alguém não poderia aceitar isso, né? — Me pergunto que pessoa estranha é essa que se esforçaria para ir contra o status quo? Provavelmente um idiota.
Um ciclista passa rápido, logo, porém, o silêncio retorna. Naturalmente Susi já deve ter entendido o que houve, preciso mesmo assim colocar em palavra, não sei por que, mas preciso.
— Sabe bem como era naquela época, sem dúvidas achei a solução boa, inclusive os ajudei com algumas questões administrativas, no entanto não podia aceitar a piora nos estudos, queria dar a todos essa chance esse caminho, por isso fui várias vezes contra.
— Ai você foi expulso?
— Não, eles não fariam isso com uma criança, além do mais eu realmente era útil na administração, porque aquele bando de incompetentes nunca tinham visto tantos números juntos!
Reclamar sobre o velho Gil sempre é gostoso, maldito coroa que errava calculo toda hora.
—Não só eu era útil, como também era tipo um líder entre os mais velhos e também me dava bem com nos esportes, num geral tínhamos bastante diálogo e as coisas foram até que bem.
— Só por curiosidade, quantos anos você tinha.
— 15, mas eu saí com 17.
— E você já conseguia fazer trabalho administrativo, depois você reclama que eu não sou normal. Além do mais, eu sabia que você tinha experiência nisso, mas agora tenho certeza que posso ser mais exigente.
Merda de de boca grande! — Espera, isso foi há muito tempo, não sou mais a mesma pessoa, eu mudei para pior.
Um olhar de desgosto é direcionado a mim. — Que tipo de perturbado diz que mudou para pior com tanto orgulho? Tome vergonha na cara!
— Ahan! Continuando a história, — chega de assuntos que vão me comprometer — nem tudo foi flores, logo os problemas começaram a aparecer, no fim, faltava dinheiro.
Um ciclista arrombado passa fazendo um puta barulho.
— Não tínhamos recursos para conciliar esportes e uma biblioteca pica, os livros caros foram vendidos, os computadores diminuíram e, mais importante, os professores diminuíram. Não importava o que eu fizesse, a qualidade da educação decaiu rapidamente.
Novamente, é desconfortável quando essa garota olha com tanta atenção para mim, mas seus olhos são bonitos.
— Não só a qualidade do ensino decaiu, entre esportes ou estudar os alunos foram para a segunda opção, principalmente porque nela podiam ganhar medalhas e elogios.
Susi de um olhar de compreensão, naquela época muitas vezes buscamos na aprovação dos adultos que nos criaram, professores e funcionários, os elogios e aprovação que sentimos não ter ao sermos abandonados pelos nossos pais e não sermos escolhidos por ninguém.
— No fim, eu só conseguia barrar uma coisa ou outra, mas contrataram um administrador de verdade, eu perdi influência e…
Paro, penso um pouco no passado, me lembrando de coisas que tinha jogado fora, já faz tanto tempo.
Fico alguns segundos parado, para contemplar a paisagem, enquanto penso. Admiro tudo em volta, é um belo parque, hoje é um dia ensolarado, não tão quente, temos várias árvores e pássaros para ver.
Não sei ao certo quanto tempo fiquei pensando, relembrando, porém por todo esse período Susi decide ficar quieta, apagar sua presença e esperar que eu continue.
— Quer ir visitar o orfanato? — Eu sei, ela já não tem mais aqueles problemas de antes, mas ouvir a Susi sugerindo ir visitar aquele lugar soa tão estranho.
A surpresa me atrasa por uns segundos, mas no fim ainda respondo…