Sua Alma Amada - Capítulo 19
Enquanto isso, Zac e Kyron caminham pelos corredores da academia sem trocar uma só palavra, e quando chegam perto da sala dos professores o professor entra e pede para que Zac o espere ali no corredor.
Enquanto aguarda, sua mente voa para longe, sua pupila dilata e seus olhos mudam de coloração, assumindo um tom azul claro. Zac então vê uma imagem um pouco turva de seu amigo olhando para um objeto que está na mesa do lavatório, mas o que mais lhe chama atenção é o reflexo que Dionísio projeta no espelho, uma mistura de medo e tristeza.
Ver seu amigo chorando causa uma certa dor, porém também serve de combustível para terminar o que foi pedido e voltar o mais rápido possível. Zac ouve os barulhos de passos dentro da sala dos professores e imediatamente seus olhos voltam a coloração normal.
Kyron sai da sala dos professores com duas sacolas douradas e entrega uma para Zac, as sacolas possuem um tamanho médio e bem no centro apresentavam a logo da academia, formado por dois triângulos, um dentro do outro que juntos apontavam para letra A.
— Zac, essas são as roupas que a diretora separou. Precisamos adiantar um pouco, pois o nosso guia está chegando.
Ao ouvir as palavras de seu professor, Zac começa a tirar sua roupa ali mesmo, sem nem ligar para nada ele começa a desabotoar a sua camisa. Pois ele só quer acabar com isso logo.
— Ei rapaz, não precisa ser assim não. Bota essa camisa de volta no lugar, perto da porta dos fundos tem um banheiro, dá tempo até de você jogar uma água e lavar essa cara aí de morto.
— Ahhh sim professor — Zac abotoa seu uniforme e começa a seguir seu professor.
— Rapaz, você está bastante inquieto, entendo que deve estar passando muita coisa na sua cabeça. Como vamos passar um bom tempo juntos, pode ficar tranquilo para me perguntar e contar sobre as coisas.
— Então, até agora não entendi muito bem o porquê disso tudo. Eu desci e segui o seu pedido, mas até agora não entendi. Tudo isso é muito confuso, porque a Flora apagou a mente de todo mundo, era só me banir do colégio e eu seguiria minha vida normalmente.
— Jovem, o caminho para a porta dos fundos é por aqui. — Kyron aponta com sua mão a direção que os levará a saída — Continuando, talvez você não saiba muito bem como funcionam as coisas na família do Dionísio, ele por acaso te contou algo?
— Nada muito profundo, ele só falou um pouco sobre alguns irmãos deles, sua sobrinha e nada mais que isso.
— Imaginei que não falaria, porque a família do Dionísio é muito rígida e por serem a família mais poderosa de Uranos. Eles mandam e desmandam em todo comércio, tudo que acontece nas ruas eles sabem.
— Eu sabia que a família dele tinha certa importância aqui, mas para mim não era tanta.
— Você não achou meio estranho ser atacado no dia que chegou? Ou até mesmo a fala do Lacer para o Dionísio? Ou o fato de ter lutado com um professor que era ex-general do exército comandado por Apolo, ou melhor irmão do Dionísio?
— Como assim, o que você está querendo me dizer? Isso é muito confuso.
Kyron para de caminhar, segura no ombro de Zac e diz:
— Jovem, o que estou para te falar é algo muito sério então por favor, preste muita atenção. A família de Dioniso só está abaixo da família do rei, e até mesmo o rei obedece a pedidos feitos por aquela família.
— A família do Dio é importante, beleza? Mas o que isso tem haver com o que preciso fazer?
— Calma, irei chegar até essa parte. Você precisa saber que Dionísio desde sempre foi uma grande promessa. Ele era o diamante bruto de sua família, pois quase não existiam curandeiros em Uranos, imagine um vindo da linhagem de Zeus. Muita pressão foi colocada nesse garoto, a possibilidade de criar poções para venda e gerar comércio caiu tudo sobre ele. O peso foi tão grande que dentre os curandeiros ele ficou com a pior classe, ele se tornou um bardo, sua família começou a olhar para ele com outros olhos.
— Mas Zac, você conhece ele melhor que ninguém, Dioniso não tava nem aí para isso, ele queria ser ele mesmo e curtir a sua vida. Só que sua família não pensou assim, ele foi deixado de lado, pois dentre seus irmãos, até mesmo de linhagens não tão boas, ele era o pior e o mais fraco. Uma vergonha para sua família, desde muito cedo ele foi humilhado por seus pais e sua família.
— Eu não entendo isso, o Dio é a melhor pessoa que já conheci neste lugar. Ele tem um poder que só ele tem, mas ninguém.
— Eu sei disso Zac, mas a família dele não pensa assim, muito menos as pessoas de Urano. Agora imagina se a vergonha da família se aproxima de um rapaz que possui um poder sujo e obscuro?
— Hehe, aí que eu entro né? Acho que tô entendendo. Não podemos deixar essa conversa para depois não? Como você falou, o guia está nos esperando — seus olhos enchem de água, mas ele cerra os dentes para não chorar.
— Sim, a amizade de vocês não foi bem vista pela família dele, ele se tornou ainda mais rejeitado, as pessoas começaram a falar. O segundo fracasso agora está se envolvendo com gente impura, como poderia alguém da alta sociedade caminhar pelas ruas de ouro usando animais tão nefastos? Essas falas maldosas chegaram até a família do Dionísio.
— Era por isso que ele evitava tocar e andar com eles. Sou um péssimo amigo, cheguei a pensar que ele tinha nojo deles. Quando essas pessoas daqui vão entender que os sujos na verdade são eles? — Zac acaba se exaltando um pouco e consequentemente aumentando o tom de sua voz — como podem? É isso que chama de paraíso?
— Te entendo perfeitamente Zac, as coisas estão erradas e isso precisa mudar. Voltando para o que estava contando, a família do Dionísio viu como bom o pedido de você participar da academia, pois aqui eles poderiam ter acesso direto a você. Por isso toda essa correria, tudo tão atípico, viver tudo isso em menos de dois dias sempre foi o plano deles. A ideia era te pegar e levar você para longe do Dioniso, eles não queriam que o vexame se repetisse.
— Peraí, vexame se repetindo e agora pouco você tinha falado de segundo fracasso. O que isso quer dizer? Teve alguém antes do Dio?
— Então, é por isso que estamos indo em nossa missão. Você é a chave que ajudará a resolver este mistério, mas que isso não posso te falar Zac, entretanto peço que confie em mim.
— Pode deixar professor, muito obrigado por toda ajuda e cuidado. Vou fazer de tudo para ajudar o Dio.
— Não precisa agradecer, aliás pode me chamar de Kyron, em nossa viagem não pense em mim como seu professor e sim como um amigo.
Após esse breve diálogo, Kyron solta os ombros de Zac e continua a seguir o caminho em direção ao lavatório.
— Pode deixar Kyron, até meio engraçado falar assim com você — ao acabar de falar ele solta um suspiro de tranquilidade, pois receber essa enxurrada de informações pesa bastante em sua mente e sentir que tem alguém de bom coração está perto lhe traz paz.
Os dois chegam no lavatório, que mesmo sendo na parte de fundos não perde para nenhum outro, repleto de espelhos e cheios de detalhes feitos do puro ouro. Porém algo chama atenção, pois há um lado repleto de plantas, folhas e flores, a cor azul das flores geram uma sensação de paz e só de entrar Zac sente seu corpo sendo renovado.
Zac entra debaixo do chuveiro, coloca a sacola no lado direito e as roupas que estava usando no lado esquerdo do box. Ele liga o chuveiro, mas ao olhar para cima, percebe que é bastante diferente, pois na ponta que sai água possui algo brilhante que parece afetar positivamente a água que sai. Às águas que caem no seu rosto acabam se misturando com as suas lágrimas, nesse momento ele desabafa, entre soluços e pequenas risadas ao relembrar tudo que passou com seu amigo.
Neste momento ele não lava somente o corpo mas sim a alma, ele sente uma mancha saindo de seu corpo, ele tenta te segurar mais ele não consegue e acaba gritando de dor.
— AHHHHHHhh, porquê tem que ser assim. — olhando para seu cordão ele vê marcado “filho da promessa” se questiona que promessa é essa e pensa que nunca quis ser chave de nada, somente queria viver em paz.
Kyron percebe tudo que está acontecendo, ele toma seu banho rapidamente, coloca só a parte de baixo da roupa e sai do banheiro, diferente do que faria normalmente, onde gastaria todo tempo do mundo para se apresentar impecável.
— Zac acabei aqui e to indo lá para fora, fique a vontade, o guia ainda não chegou. — isso ocorre no exato momento que ele percebe que seu comunicador, uma espécie de anel feito de lenho de madeira, imbuída de uma mana com afinidade ao som, emite a seguinte mensagem:
— O guia acabou de chegar, a viagem está prestes a começar. Boa sorte nessa jornada Kyron, conto com você.
— Muito Obrigado pela confiança, o menino ainda não está pronto. Creio que Thome não ficará chateado por aguardar alguns minutos. O Jovem realmente precisa desse momento.
— Tudo bem, confio em você. Ah e só para lembrar que o comunicador só funciona aqui, então qualquer coisa envie-nos uma carta ou peça que Thome nos avise.
— Entendido, assim que o jovem acabar sairemos.
Enquanto isso, após ouvir o barulho da porta no chão, Zac desaba completamente em um choro profundo. Era como se já tivesse passado por isso no passado, como se alguém muito importante em seu passado tivesse sido tirado de perto dele e ele não pudesse fazer nada para mudar isso.
A cena é deprimente, Zac caído no chão sem força para se levantar, seu único desejo é sentir as gotas d’água caindo sobre seu corpo. Até que seu grimório que estava jogado no chão dentro de sua bolsa começa a brilhar e liberar uma fumaça bem densa que muda o ambiente completamente e vai em direção do box que o Zac está, ela passa pelas aberturas na parte de baixo e de cima.
Chegando perto de Zac elas vão se solidificando e aos poucos Jack e Holy ganham forma. Jack escora seu corpo dando apoio para Zac ficar de pé, já Holy com seu pelo macio se esfrega na direção do rosto de Zac, tentando de alguma forma fazer o seu amigo parar de chorar.
Vendo tudo isso, Zac não tem outra opção senão abraçar os dois e sorrir, não era como se a dor tivesse ido embora, não, não, muito pelo contrário a dor estava mais viva do que nunca, porém a sensação gerada por Jack e Holy é única, ele não sentiu isso no passado, ou seja, tudo pode ser diferente agora.
— Vocês são incríveis tah — Zac tira forças de tudo o que acabou de acontecer e se coloca de pé para terminar de arrumar.