Passos Arcanos - Capítulo 100
Wallace negou carruagem para a viagem até o Acampamento Cedero. O melhor seria uma viagem a cavalo de duração de no máximo uma semana, porém, Tito alegava que não seria nem cinco dias.
Orion esteve ajudando Cristina com Arcanismo desde que tinha chegado. Ela aprendia mais rápido do que as pessoas normais, e Fazin assistia de primeira mão a forma como era dada as lições sobre mana, magia e afins.
O velho Mago gostava de estar com Orion, mas sempre fazia uma pergunta diferenciada no Meio da explicação. Se era dúvida ou apenas uma forma de entender a mente de Orion, o próprio Orion não sabia.
No final da tarde, um dos garotos que veio de Drax apareceu no pátio.
— Senhor Orion — chamou ao se aproximar. Tinha roupas novas, mais confortáveis e estava limpo, com um odor melhor do que lama e terra. — O senhor Rob pediu para chamar você.
— Obrigado, Sid.
O garoto abriu um sorriso e saiu andando apressado.
— Sabe o nome de todo mundo? — Cristina perguntou com um livro na mão. Lia os ‘Cinco Tipos de Comunicação por Mana’.
— Eu tento. É importante para as pessoas que elas sejam reconhecidas. — Orion pegou o papiro que esboçava e saiu do banco de pedra. — Continue praticando por mais uma hora, depois pode descansar até amanhã. Já arrumou suas coisas?
Sem tirar os olhos da página, ela acenou com a mão.
— Ótimo.
Ele atravessou o pátio e seguiu para o quarto de Rob. No Meio do caminho, encontrou Truman e Sind caminhando juntos, de mãos dadas. Era bom vê-lo com menos raiva na mente e mais um pouco de felicidade.
Nas Caldeiras, sua conjuntura de querer seguir até o topo era insaciável, porém, bruto demais para entender como os degraus se comportavam. Não era questão de derrotar todos os inimigos, mas Truman nunca tinha entendido muito bem isso.
Orion entrou no escritório e viu Rob comendo biscoitos em um pote metálico. Estava sentado, usando uma roupa mais formal, um terno negro e um camisa branca, com os cabelos penteados e um lenço avermelhado no pescoço.
— Está seguindo a moda agora? — brincou ao fechar a porta. — Está tão social que parece que vai a um baile.
— Não sei se falou brincando ou se realmente sabe que vou a uma baile. — A mão de Rob apontou para a cadeira em sua frente. Esperou que se sentasse para continuar. — Fui convidado por Economia a comparecer o Baile de Xiaq. Queria que fosse comigo, mas sua viagem vai ser no mesmo dia.
— E já está de terno?
— Hoje tenho outro compromisso envolvendo os banqueiros. Sabe, por sua causa, eu tive muito trabalho. — Deixou um sorriso escapar. — Um pouco do que meu pai tinha quando era vivo, estou vivendo agora graças a você. Pedi que viesse para te agradecer.
Orion beliscou um dos biscoitos, jogando na boca.
— De nada. — Cruzou as pernas um no outro. — Só isso?
— Se fosse, eu tinha te enviado uma carta— Rob deu uma risada. — Quando estiver em Cedero, quero que continue seu caminho.
Orion estreitou um pouco sua atenção.
— Meu caminho?
— Sei sobre as Leis Intermináveis e o motivo de sua família não poder se tornar um Mago. Eu busquei muitas respostas nesse meio tempo que esteve fora, e quero te mostrar uma coisa interessante.
Ele foi até a estante na parede e pegou um pequeno livreto, era bem velho e carcomido, com sua capa erosada e folhas amarelas pelo tempo. Ele segurou o fio no meio e abriu-o, dando a Orion. Sentou-se novamente.
— Leia em voz alta, por favor.
Havia uma marcação no começo de um parágrafo.
— “Se há, mesmo que mínima, uma forma de suavizar os pequenos feitos do mundo, também existe maneiras de curvar as maiores. Assim como os ladrões são vistos como vilões, os Arcanos, Magos e Sacerdotes, quaisquer que sejam seus títulos, são tão vilões quanto. Virgo de Sallute, um dos pioneiros sobre direitos Arcanistas, decretou uma lei muito tempo antes das piores e mais desumanas existentes, ela foi conhecida como Situações Honrosas e Desesperadas. O que ela significa? Que qualquer pessoa que tenha sido amaldiçoada pelas vozes odiosas de algum grupo mágico tem a possibilidade, repito, tem a possibilidade de recorrer a corte do Conselho Negro, e não pode ser acusado caso use esse mesmo artifício como defesa de suas ações.”
Os dedos foram da ponta da página até a outra. Ele ergueu o olhar devagar, e viu Rob com um sorriso largo, mostrando os dentes brancos.
— Isso é real? — perguntou, descrente. — É realmente possível?
— Eu procurei alguns políticos de São Burgo e também alguns Escolásticos. Eles estudaram as leis mágicas por muito tempo, e sim. — Rob apontou para o livro. — Virgo de Sallute viu que haveria problemas parecidos no futuro, e criou essas Situações Honrosas e Desesperadoras. Não é o melhor nome do mundo…
— Nunca li nada desse cara. — Se fosse realmente possível dar a oportunidade de usar magia, Orion teria como utilizar toda a sua capacidade sem precisar se preocupar com algum Arcanista vindo atrás dele ou de sua família. — Onde achou?
— Eu fui até um Historiador Politico, Josean Harrsun. Ele me deixou a par da lei e de como usar, então, vou ser direto. Apenas uma pessoa da família pode usar essa lei, isso porque ela remete sempre que está procurando uma maneira de ganhar de volta o renome que perdeu.
— E isso inclui a minha família? — Orion nem percebeu que seu tom mudou para um mais agudo. — Posso usar magia para proteger minha família?
— Pode. — Um papel foi retirado da gaveta de sua mesa e entregue. — Aqui está a lei, vista e revista por quase dez Escolásticos, todos eles comprovam a veracidade. — Encarou Orion e deixou os lábios se curvarem mais ainda. — Você pode usar magia para salvar a sua família, meu amigo. Apenas você.
A delicadeza para pegar o papel, Orion simplesmente deslizou os olhos por cima. Era verdade, a lei existia com um único propósito: dar a chance aqueles que um dia foram amaldiçoados por Arcanistas.
— Eu nunca vi nada parecido — disse baixo. — Se eu soubesse antes…
— Essa lei foi oculta do Ministério da magia muito bem. Tive que ir até o diretor Paan, ele me deu uma dica de onde achar e como dar procedimento aos tramites. — Rob curvou na cadeira, cruzando os dedos sobre a própria barriga. — Foi mais demorado do que achei. Os ativistas do ministério não queriam entregar uma cópia, mas acionei Economia e Josean. Eles me ajudaram.
— Te agradeço, Rob. Muito.
A chance de praticar magia estava sendo dada a ele de graça. Não era um sonho porque Orion tinha feito de tudo para acordar naquele momento. Seu pai nunca acreditaria se contasse, nem mesmo que tinha a possibilidade de crescer no mundo da magia.
— Só tome cuidado — alertou Rob no mesmo instante, bem sério. — Quando fui até lá para pegar o documento, algumas pessoas me alertaram sobre a possibilidade de problemas futuros. Parece que essa lei é escondida do mundo porque dá opção de luta.
— Eles não vão conseguir me derrotar — falou com tanta força que a convicção abalou seu colega. — Nem em armas, nem em magia, em nada. Qualquer um que tentar prejudicar minha família, São Burgo ou o Tomo vai ser destroçado.
No ar de graça, Rob deu um suspiro aliviado.
— Eu sei que vai fazer de tudo para proteger quem gosta, mas tome cuidado. E também existe uma segunda coisa. Quando nos conhecemos, eu te dei um ultimato sobre missões que eu gostaria que fizesse, lembra?
— Sim. Fui até o Templo de Maio.
— Exato. — Rob retirou um segundo papel da gaveta. Era uma carta lacrada com um símbolo negro a selando. — Eu recebi um pedido vindo de um amigo. Ele deseja muito que uma pessoa esteja próxima da Escola Mágica de Magnus. Ele precisa de um ouvido sobre os acontecimentos por lá já que os Krasios colocaram alguns dos seus membros mais promissores lá e existe Santa Helena que separou alguns Magos de primeiro Núcleo para ingressarem também.
— Quer que eu entre como um Aprendiz?— A ideia soava engraçado a Orion. — Rob, sou formado em Arcanismo Avançado e todas as suas variações químicas e físicas.
— Sim, eu sei. Já tentei explicar a situação ao meu contato, mas ele é uma pessoa difícil. — Pela cara que fazia, as mãos dele foram atadas. — Por aquelas bandas, eu não tenho ninguém de confiança e…
A carta voou da mão de Rob para Orion num estalo de dedos. Ainda dando uma olhada no símbolo, respondeu:
— Pode deixar comigo. Pode ser que eu aprenda algumas coisas novas estando em uma sala de aula. E existem muitas variações do Arcanismo que não estão nos livros, vai ser interessante. Vou me apresentar depois de chegar em Cedero.
— Agradeço por isso. — Rob, então, ajeitou a gola do terno e se levantou, ainda tendo seus um metro e sessenta. Parecia um pagem com aquela roupa, mas sua face era dura, e seus olhos agradecidos. — Vai ser triste não ter mais você por aqui, mas vamos manter contato, correto?
Orion esticou a mão para ele e concordou com firmeza.
— Completamente correto, meu amigo. Obrigado.
— Eu quem agradeço. — Rob largou sua mão e saiu caminhando até a porta. — Existe um pouco de esperança no que faço hoje, e é graças ao nosso encontro meses atrás. Quem diria, não é?
Sim, quem diria.
— Faça uma boa viagem, está bem? — completou Rob dando uma ultima olhada pra trás. — Estarei te observando, saiba disso. E se achar que não vai conseguir, lembre-se que veio de São Burgo, e aqui as pessoas morrem, mas não desistem.
Ele saiu em seguida, não dando espaço para Orion responder. Aquele escritório, seria a última vez que Orion o veria? Só por desencargo de consciência, gravou cada parte dele em sua mente, como um refúgio quando estivesse com saudades.
Agora, poderia ir adiante, sem temer a dor.