Os Contos de Anima - Capítulo 52
Retirando sua arma da árvore, Lucet grunhiu com o esforço ao sentir a dor das trincas nos ossos do seu braço e mão, além disso, quando respirou com um pouco mais de esforço para tentar suportar com mais facilidade a dor, sentiu pontadas dolorosas em seu plexo solar, esterno e costelas que, ao circular sua mana pela região notou que estavam danificados, contendo trincas e lesões.
“Droga!” Lucet reclamou em sua mente, “Lutar corpo a corpo com o cara sem usar o lampejo logo no inicio para poupar energia foi uma péssima idéia! Eu devia ter acabado com ele rápido, se eu tivesse ido com força total desde o inicio talvez não estivesse tão arrebentado agora.”
O garoto então se direcionou e caminhou devagar na direção do centro da arena, onde daria de cara com a alfae de cabeços prateados, sua última e certamente mais dificil oponente, especialmente ao considerar que ela não havia gastado uma gota de energia que fosse além de o assistir lutar e ter a chance de analisar sua capacidade de combate.
— Bem — Lucet suspirou — Ficar reclamando não irá ajudar em nada, então é melhor eu focar em recuperar o pouco de força que eu conseguir já que não dá para eu fazer uma poção agora.
Respirando devagar para conter a dor, Lucet acalmou seu coração que a pouco estava martelando contra o peito lhe causando um bocado de desconforto. Ele colocou a adaga em sua bainha e caminhou lentamente, tentando o melhor que podia estabilizar seus ferimentos ao passo que tentava recuperar sua mana.
Após alguns minutos caminhando, logo chegou novamente ao “túnel” de árvores no centro da arena. Ele virou seus olhos para o lado norte da arena e avistou a alfae vestida em branco, com cabelos prateados e olhos violeta, sua varinha e espada já em mãos, a menor na mão esquerda e a maior na mão direita, com um leve sorriso em seus lábios caminhando em sua direção.
— Não pôde esperar foi? — Lucet riu, tossindo com dor — Seu colega mal foi derrotado e você já está aqui pronta para me enfrentar?
Diferente de todos os oponentes anteriores, a alfae riu e, com uma voz suave e encantadora, respondeu animada.
— Mas é claro que estou — ela disse, um sorriso tão belo em seu rosto que Lucet ficou distraido por um instante antes de chacoalhar a cabeça — Aliás, eu estive esperando para enfrentá-lo esse tempo todo.
— É o que? — Lucet perguntou confuso — Se estava tão ansiosa, porque não foi se ofereceu para ir primeiro?
— Que espécie de guerreiro avança cegamente contra seu oponente se tem a oportunidade de estudá-lo e conhecer sua força, e fraqueza, com antecedência? — Ela retrucou com um riso gracioso, sua mão que segurava a varinha rapidamente cobrindo sua boca com o pulso.
— Tch! — Lucet bufou, tendo que concordar com ela — Decisão inteligente.Então me diga, o que achou do que viu?
— Impressionante! — Ela respondeu, acenando a cabeça empolgada — Simplesmente impressionante! Você é um corvo, mas luta com o poder de um paladino e ainda por cima manipula terra e, como se não bastasse, ainda tem a “Garra do Corvo” como arma que é feita para combater aqueles que se especializam em magia, como eu. E como se não bastasse todo esse arsenal, ainda tem um corpo muito forte, com excelentes reflexos e percepção extraordinária, você é simplesmente impressionante Lucet.
— Hehe — Lucet deu um risinho — E sabendo de tudo isso, ainda quer lutar comigo? Tem tanta confiança assim de sua vitória?
— Se você estivesse lutando contra mim com a mesma energia e integridade fisica que possuía no inicio dos combates, eu não teria certeza da minha vitória, mas, com o seu estado atual… — ela disse, rolando os olhos com um sorriso travesso em seus lábios rosados — Digamos que vai ser bem dificil você ter qualquer chance de sequer encostar um dedo em mim, quem dirá sonhar em me derrotar?
— Oho… — Lucet disse, sorrindo, uma determinação reluzente surgindo em seus olhos — Não vou conseguir sequer encostar em você? Agora você pediu garota, se prepara para uma senhora derrota.
— Digo o mesmo para você, Lucet — ela respondeu com um riso, parando a alguns metros de distância dele, uma aura eterea e enevoada surgindo ao seu redor, seus joelhos levemente dobrados numa posição de combate.
— Antes de começarmos — Lucet disse, sacando a garra de sua bainha e assumindo sua própria posição combativa — Será que poderia me dizer seu nome, senhorita “estou prestes a ser derrotada”?
— Só se você conseguir me derrotar, senhor “estou prestes a tomar uma surra” — ela retrucou com sua própria provocação e riu.
Sem dizer mais uma palavra, Lucet soltou um breve riso antes de disparar na direção da alfae. De repente, ele sentiu um frio se aproximando do seu corpo com grande velocidade e, quando se deu conta de onde vinha a súbita queda de temperatura, viu dez lanças de gelo voando na sua direção, prestes a lhe acertar.
“O que? Quando foi que ela…” ele gritou mentalmente, assustado com o ataque que sequer teve a chance de detectar. O garoto se jogou no chão, mirando um chute deslizante nas pernas da alfae, a garra sendo usada para defletar duas lanças de gelo que estava mais próximas de si.
A alfae saltou para o lado e cortou o ar verticalmente com sua espada de lâmina tenuamente azulada como uma safira, mirando um corte no pescoço do oponente. Lucet reagiu a tempo e bloqueou o ataque, desviando-o para cima de sua cabeça, assim fazendo a lâmina arrancar um chunco de terra que desacelerou a reação da alfae por um momento.
Ele então contraiu o corpo e, usando sua aura cinzenta na forma de pequenas mãos, se impulsionou para frente antes de rolar e se erguer, porém, antes que ele pudesse erguer sua arma para se defender, ele sentiu novamente o frio se aproximando e, quando conseguiu olhar direito, viu uma lança de gelo prestes a penetrar seu peito.
Por sorte, seu braço já estava no movimento de se erguer, o que o permitiu ativar sua aura da fé a tempo de cobri-lo com a armadura dourada e golpear a lança no último segundo, despedaçando-a com total facilidade. Ele então se ergueu por completo e desfez a armadura luminosa, optando por cobrir seu corpo com um manto de sombras enquanto saltava na direção da alfae, desferindo um corte horizontal reverso, ou seja da direita para a esquerda, mirando no peitoral de sua armadura no intuito de demolir a armadura com sua lâmina imbuida com propriedades antimágicas.
A alfae, vendo a lâmina negra prestes a colidir com sua armadura encantada saltou para trás e, após desviar do perigo, contraiu seu braço e, no instante seguinte, desferiu uma estocada na direção do peito do oponente. Lucet virou seu torso levemente para a direita e desviou da estocada, justamente graças a sua falta de um braço que lhe proporcionou a oportunidade de virar a lâmina em sua mão e então realizar um corte horizontal que a alfae não pode desviar a tempo.
Como se a própria morte houvesse tocado a armadura, no momento em que a lâmina negra acertou a ombreira, a mesma praticamente se desfez, suas defesas encantadas destruídas com a mesma facilidade que uma lâmina quente derrete manteiga. Obviamente, devido a tamanha facilidade do corte, logo uma linha escarlate surgiu no braço da garota, rápidamente dando lugar para um fio escarlate que logo começou a pingar no chão, manchando a manga da alfae.
A garota retraiu seu braço e, mais uma vez, Lucet sentiu uma brisa congelante se aproximando, novamente descobrindo uma lança de gelo prestes a lhe acertar o estômago, entretando, o garoto foi capaz de girar seu corpo rápido o suficiente para evitar uma perfuração e, ao invés disso, acabou sofrente um corte raso no abdomen que, ao contrário da garota, não sangrou pois a ferida foi instantaneamente selada com gelo.
Os olhos do par fitaram o oponente com um ânimo que não pertencia a uma batalha e, instantes depois, ambos riram.
— Você é boa, garota — Lucet disse, um largo sorriso em seu rosto — E muito rápida com esses tiros de gelo! Não consegui nem mesmo ver quando disparou seus ataques!
— Rápida? — ela sorriu e respondeu — E você que conseguiu desviar tantas vezes? É o que então? E essa sua garra? Ela é diferente, não era para demolir minha armadura de adamantina encantada com tanta facilidade!
— E tem mais — Lucet continuou — Você estava errada.
— Errada? — ela questionou.
— Sim, eu já consegui encostar em você — O garoto riu — Parece que não vai ser tão fácil assim me derrubar, não?
— Pelo jeito você é ainda melhor do que eu esperava — ela concordou — Mas, ainda não é bom o suficiente.
Lucet sentiu novamente o ar esfriar ao seu redor, e quando se deu conta, vinte lanças apareceram a menos de um metro de si, vindas de todos os cantos. “O que!? Mas como é que ela fez isso!?” O garoto pensou, assustado e preocupado “Droga, assim minha aura não vai durar muito tempo!”
Sem opções, Lucet concentrou toda a energia que pôde e conjurou o escudo dourado, erguendo-o sobre sua cabeça e projetando o domo dourado decorado de runas luminosas.
— Me entregue a verdade!
Declarando imperiosamente sua vontade, seu olho direito se transformou no olho de uma fera, sua púpila novamente se tornando vertical enquanto sua íris se tornava vermelho dourada,o filtro azulado recaindo sobre o mundo enquanto os ataques ao seu redor começaram a desacelerar em sua percepção, o que lhe deu tempo de rastrear exatamente de onde eles surgiram e descobrir que, na mão esquerda da alfae que estava parcialmente escondida por seu torso levemente virado para a esquerda, a varinha ainda reluzia com resquicios de mana enevoada.
“Aquilo deve acelerar a velocidade de conjuração” o garoto concluiu, rápidamente traçando seu plano “Preciso me livrar daquilo antes de finalizá-la, senão, vou acabar virando um picolé!”
As lanças de gelo atingiram o domo dourado e explodiram, erguendo uma leve nevoa gélida ao redor da proteção, porém, sem causar qualquer dano ao escudo em si. Lucet aproveitou a oportunidade enquanto a alfae estava surpresa pela resitência anormal do domo dourado que parecia tão frágil e desfez a proteção que lhe custara energia para o bastante para lhe deixar com apenas mais um uso do lampejo restando e inclinou seu corpo, galgando a distância entre os dois com um salto antes de disparar um chute com sua perna direita na direção do braço esquerdo da garota.
Percebendo o intuito do oponente, a alfae tentou retrair seu braço, porém, antes que pudesse reagir, sentiu uma imensa dor em seu braço e costelas que a forçou a largar a varinha enquanto fora arremesada para o lado pela força do súbito impacto.
Com apenas meio uso do lampejo restando, Lucet apoiou todo o peso seu corpo sobre a perna esquerda e executou um último lampejo, instantaneamente alcançando a alfae e, usando sua perna direita, a tropeçou, fazendo-a cair de costas no chão, ao passo que Lucet prontamente avançou sobre ela, sua lâmina negra voando para o pescoço da garota e habilmente parando a menos de um centimetro da pele pálida da alfae.
— O que você disse sobre eu te derrotar? — ele disse ofegando enquanto um largo sorriso triunfal decorava seu rosto.
A alfae porém não parecia desanimada de qualquer maneira, e ao invés disso falou com um sorriso e riso tão belos que a mente do garoto parou por um breve instante antes dele ser desperto por uma leve pontada que sentiu em suas costelas que, quando olhou com o canto do olho, viu ser a ponta da espada azulada da alfae cutucando-o através de um furo em sua roupa.
— Que você não ia conseguir.
— Empate? — ele sugeriu.
— Empate — ela concordou com um aceno — E apesar de não ter me derrotado — ela continuou num tom um pouco mais baixo e suave como um sussuro, praticamente magnético aos ouvidos de Lucet — meu nome é Luna.