Os Contos de Anima - Capítulo 100
Deixando para trás a usual segurança do palácio, o par viajou através de uma série de pontos de transporte até que chegaram ao primeiro destino, o ponto central da nação Faeram, bem como a aglomeração da mais abundante diversidade de fauna e flora em toda anima, a capital de Treanna, Jungla Iroko.
Antes de partir, a dupla rapidamente assumiu disfarces, bem como executaram diversas medidas arcanas para salvaguardar suas identidades e bem estar, então, ao chegar lá, facilmente se misturaram com a leva de turistas e mercantes que utilizaram o transportador, especialmente para que não fossem tão facilmente detectados.
Contudo, tais medidas foram desnecessárias, ao menos nesta parte do mundo. O fluxo de visitantes era muito maior que o previsto e, para a surpresa do garoto, o número de pesquisadores se mostrava ainda mais prevalente, tanto que os mesmos eram imediatamente escoltados para diferentes partes da capital. Alguns, estes carregando identificadores da organização de sua mãe, a Lybra, até mesmo indo em direção a grande árvore mãe acompanhados por guardas reais.
— Esse lugar é tão… — Lucet comentou, inalando profundamente o ar fresco e aromático da imensa floresta, momentaneamente embasbacado pela grandiosidade do local, sofrendo alguma dificuldade em formular uma descrição adequada.
— Bonito? — Luna interviu com um pequeno riso, enumerando opções — Grande? Excepcional? Fragrante?
— Extraordinário — o garoto disse com um sorriso, sua face logo se fechando em uma expressão mais séria — Até gostaria de aproveitar mais, contudo, temos muito o que fazer aqui para perdemos tempo com o cenário.
Durante os próximos oito dias a princesa e o corvo executaram as duas missões do local com o máximo de eficiência. Lucet era perfeitamente capaz de realiza-las sozinho, obviamente, mas, com o auxilio da alfae, tudo correu com ainda mais rapidez do que o esperado, fazendo com que ambas as missões fossem finalizadas dois dias antes do prazo estimado de dez.
Em seguida, após tomarem um dia para descanso e reparos, o par repôs alguns suprimentos gastos durante as tarefas, bem como aproveitaram para vislumbrar um pouco do cenário esplêndido que era a grande floresta de Jungla Iroko. Lucet aproveitou a oportunidade para adquirir alguns livros e receitas novas para poções e pastas curativas enquanto que Luna usou a chance de descanso para adquirir alguns amuletos xamânicos, bem como conhecer um pouco mais sobre este local que poderia ser um poderoso aliado para sua nação no futuro.
O passeio, entretanto, uma hora tinha de findar, afinal, ainda restavam duas missões particularmente complexas de serem realizadas e, por mais que a dupla estivesse aproveitando a companhia um do outro em meio as grandes árvores da capital de Treanna, era inevitável que tivessem de progredir. Portanto, após acertarem as contas com a pousada onde resolveram descansar após a missão, partiram então para o transportador mais próximo e desataram em um flash de luz arcana rumo ao fim de sua jornada.
Devido a questões diplomáticas, como diziam os alfaes, ou simplesmente o fato de que os reinos humanos eram compostos de líderes gananciosos, qualquer transporte que adentrasse a capital diretamente era severamente monitorado.
Mesmo que os dois tivessem plena confiança em suas habilidades mágicas e a capacidade das mesmas de ludibriar os oponentes quanto a suas verdadeiras identidades, optaram por agir com mais cautela. Em primeiro momento, o plano seria adentrar a cidade pelas partes mais pobres, utilizando a entrada do ramo do ninho local para que pudessem passar despercebidos.
Este seria o cenário ideal, contudo, como o próprio Lucet já notara anteriormente, o ninho não era perfeitamente seguro. Por um lado, trazer a princesa através das conexões das sombras não era algo que ele tinha plena certeza de realizar, afinal, o plano de Noctis era imprevisível para aqueles que não partilhassem de seu poder. Em outra consideração, existia grande risco em passar pelo ninho com uma visitante, especialmente agora que ele sabia do estado precário de confiança da organização em relação a puritas.
Ele não tinha qualquer noção do quão profunda era a influência da congregação dentro do ninho, portanto, fazê-lo seria um risco. Então, o garoto optou por retornar para Lumina primeiro, finalmente utilizando seu status como aliado da coroa diretamente ao comandar, com a autorização direta de Luna, que um transporte para uma vila próxima a capital, mas movimentada o bastante para que dois viajantes passassem despercebidos.
Assim, o par desapareceu em feixes de luz arcana, transportando-se a uma cidade próxima a capital, o condado de Amica, comandado por um conde com relações favoráveis com os alfae, Macula Amicus. De lá, a viagem para a capital demoraria algumas horas utilizando o curioso maquinário humano movido a carvão e vapor, uma grande besta de aço e engrenagens intermináveis capaz de carregar dezenas de toneladas de materiais e passageiros por sobre faixas de ferro e madeira, o trem.
Utilizando algumas peças de prata, Lucet e Luna compraram passagens no tal transporte que, para a surpresa de ambos tão acostumados com a conveniência da magia, não utilizava sequer um traço de mana em sua estrutura.
Em sua cabine, o par discutiu sobre os tantos detalhes que observaram na máquina. A presença da mesma era estabelecida de forma engenhosa, beirando ao luxo e extravagância em alguns compartimentos, contudo, a estrutura metálica se mostrava extremamente desconfortável para qualquer que estivesse mais conectado com os poderes sobrenaturais de Anima.
Com seus anos de treinamento, ambos os viajantes já haviam dominado o controle de suas expressões, bem como o fluxo de sua magia, por tal, eram capazes de disfarçar com eficácia o desconcerto em seus corpos que ansiavam por liberdade daquela construção férrea.
Acostumados com a presença da energia mágica ao seu redor, estar em um lugar tão separado da mesma que parecia até mesmo rejeitar o poder arcano era incomodo para a dupla. Sua mana fluía mais devagar e com certa dificuldade, como se estivesse sendo arrastada e acorrentada ao status mais comum da humanidade.
Observar a presença de fluxo mágico não era estranho entre a raça dos filhos do pó, entretanto, este era um caso de minoria. Eram capazes de aprender, mas a maestria eternamente os iludia e, mesmo com sua quantia exageradamente maior de membros, a qualidade dos mesmos era medíocre, assim, era severamente mais complexo encontrar aqueles que eram capazes de efetivamente fazer uso destes talentos.
Chegando a esta conclusão, a dupla foi capaz de entender porque um lugar tão hostil para com aqueles capazes de utilizar a magia existia.
— Não é à toa que a humanidade realmente só tem números e essas máquinas… — Ponderou a princesa enquanto conversavam.
— Se apenas uma pequena maioria da população pode utilizar a magia, uma forma de elevar os outros — um sorriso amargo então surgiu na expressão do corvo — Ou pelo menos torna-los úteis, tinha de ser criada — então o jovem se lembrou das analises que fizeram da estrutura — Essa coisa não utiliza mana, nem precisa de muito conhecimento para ser manejada, perfeito para a grande maioria dos humanos que não usam aura ou possuem capacidade arcana.
— Ainda assim, não podemos subestimá-los — a princesa subitamente alertou.
— Sei disso — o garoto acenou com a cabeça — Essa coisa é apenas uma máquina, tenho certeza que o poderio humano é bem maior que isso.
Em progresso constante, a dupla finalmente chegou a famigerada capital, Concordia, onde as duas últimas missões aguardavam confirmação. Após encontrarem uma pousada em um canto remoto, Lucet então desatou na direção do ramo mais próximo, afinal, precisava confirmar as informações da missão o quanto antes.
Por alguma razão que não compreendia, sentia certa apreensão no local, como se alguma espécie de mal agouro estivesse-lhe circulando a cabeça feito um abutre que encontrou uma carcaça para se alimentar.
As ruas da capital, bem como se lembrava da projeção demonstrada por Kaella anos antes, eram feitas de paralelepípedos cinzentos. Dependendo de onde observasse, era capaz até mesmo de enxergar musgo crescendo nas pedras devido a humidade lamacenta presente nos cantos mais pobres da capital.
Ainda que fosse uma das cidades mais prósperas e importantes para os filhos do pó, Concordia, ao menos no olhar do jovem corvo, não era lá grande coisa. Com exceção das ruas principais por onde passavam os mercantes mais influentes e os membros da aristocracia dos quatro reinos humanos, era fácil enxergar um certo descaso a partir de um ponto especifico.
Existindo em níveis, a cidade era subdividida em três áreas: A área superior, extravagante e luxuosa, populada apenas por membros aristocráticos e do clero de puritas, conhecida como “A Corte”, a área média, repleta de toda sorte de mercante renomado e cavaleiros, conhecida como “O Burgo” e a área inferior, lar da plebe, dos criminosos e do povo esquecido em geral, nomeada “Favela”.
Após encontrar o ramo do ninho em um canto mais distante da favela, Lucet confirmou o status e informações das missões, prontamente retornando para a pousada onde Luna o aguardava. Chegando lá, o par revisou as informações e então, desataram pela cidade a fora em busca de realizar os objetivos necessários.
Mesmo em dupla, a dificuldade do território humano em si provou ser um desafio para eles. A estimativa geral do tempo de missão era três dias, sendo a primeira missão uma escolta, essa facilmente executada pois, por coincidência, o cliente era justamente o conde por cujo domínio ambos passaram, mas, a missão de pesquisa era para o teste e desenvolvimento de armas para o exército humano.
Além do uso de alguns truques, o par necessitou exercer o máximo de seus conhecimentos e capacidades cognitivas para aprender e desenvolver processos alquímicos e mecânicos.
Obviamente, com a inteligência da dupla, não foi exatamente difícil fazê-lo, mas certamente foi um desafio realiza-lo em tão pouco tempo. Ao fim do processo, Lucet recolheu as recompensas especificas e, após se reencontrar com Luna na pousada, se prepararam para partir de volta a cidade vizinha e então tomar um transportador de volta para Lumina o quanto antes.
Este, porém, fora apenas um plano, algo que não chegou nem perto de acontecer tão pacificamente.
Na estação, logo após comprar as passagens e se dirigir em direção a plataforma de embarque, problemas rapidamente se apresentaram. Tudo começou quando o par procurou um lugar para aguardar a chegada da massiva besta ferro que estava atualmente em percurso para chegar até ali, a estimativa de chegada e subsequente partida era de uma hora e, como nenhum dos dois possuía como prioridade esperar tal tempo em pé, exploraram em busca de bancos para repousar.
Não foi difícil encontrar um local, especialmente considerando que a maioria da população sequer tinha o dinheiro para adentrar as acomodações mais baratas da tal maquina de vapor e carvão. Sentados, o par conversava, sempre atentos a possíveis complicações, mas, devido ao recente sucesso nas missões, levemente mais confiantes.
Foi quando, caminhando pela plataforma, um grupo de cavaleiros de puritas surgiu, andando com passos barulhentos devido ao tintilar de suas armaduras, rindo e conversando sobre assuntos triviais. Com uma rápida analise da vestimenta, esta sendo a armadura de aço escovado e espadas em suas cinturas, Lucet determinou que não fossem grande coisa, especialmente considerando o quão mais… pristinos costumavam ser os oponentes que encontrara da congregação que encontrara previamente.
Ali, o corvo identificou uma das facetas do poder que sua mãe mencionara anos atrás, mais especificamente sendo uma que ensinou posteriormente, a da autoridade. Existiam muitos na estação, sejam mercantes ou mercenários, ou pessoas de origem mais simples, mas que ainda eram capazes de viajar entre uma cidade e outra e, caso unidos, facilmente poderiam derrocar aquele grupo de imbecis, porém, devido a reputação de puritas, ninguém sequer tinha coragem de erguer a cabeça em direção ao grupo uma vez que determinassem suas identidades.
E foi justamente por isso que tudo desandou.
Eles pareciam aproveitar os olhares amedrontados do público, alguns até mesmo colocando as mãos nos cabos de suas espadas enquanto outros fingiam avançar os espectadores, provocando tremores e leve pânico. Quando, entretanto, eles se aproximaram da dupla e tentaram fazer o mesmo, se viram diante das expressões estranhas que suas pequenas mentes já encontraram.
Na face disfarçada de Lucet e Luna existia nada mais nada menos que o mais escancarado tédio e desprezo existente. A princesa, ainda que soubesse do risco que corriam neste território, não pode conter o orgulho que surgia em seu peito. Em que momento parecia razoável ela, a próxima líder da nação magicamente mais poderosa de anima abaixar a cabeça diante de alguns patetas de puritas?
O corvo, por outro lado, tendo enfrentado perigos tão imensamente maiores que um mísero bando de cavaleiros fanfarrões, não era capaz de processar esse perigo seriamente. Seu rosto era incapaz de sequer fingir o medo necessário, ao invés disso permanecendo apático diante da falsa investida.
No primeiro instante, o grupo hesitou, apreensivo para com a identidade destes viajantes, mas, após alguns momentos observando as vestimentas simples da dupla, sua coragem prontamente retornou e eles formaram um semicírculo em volta dos dois, mãos em espadas, prontos para atacar.
— Como ousam demonstrar tanta insolência diante da santa igreja!? — esbravejou o líder do grupo, o aperto de seus dedos firme em volta do cabo de sua espada, a lâmina levemente erguida.
Lucet, entretanto, achava a situação apenas uma inconveniência. Com uma rápida olhada, ele identificou que não havia mais nenhum grupo de puritas por perto e que provavelmente os reforços demorariam um pouco. Olhando para relógio da estação, o garoto pode ver que faltavam por volta de quinze minutos para partirem, portanto, queria encerrar logo isso. Com um suspiro, ele respondeu:
— E como é que vocês ousam sujar o nome dela sendo tão — e nisso um sorriso confiante surgiu em suas feições — Patéticos?
A palavra pareceu congelar o cérebro do líder, mas, logo ele retornou de sua estupefação com um rosnado de ira, tentando sacar sua espada. O meio-sangue, entretanto, pôs sua mão sobre o pomo que ascendia, forçando-o de volta para baixo antes de dizer:
— Não tente, não vai gostar do resultado, é sério.
O homem, porém, ignorou o aviso, cerrando um punho antes de dispará-lo na direção da face do garoto. Com um suspiro, Lucet desviou ao soltar a espada e reclinar suas costas no banco. O líder, agora mais confiante, agarrou sua espada e tentou sacá-la novamente, o jovem, entretanto, não aprovou essa ideia, erguendo uma das pernas antes de chutar a bainha do cavaleiro, prensando o armamento contra o metal protetor e desequilibrando o guerreiro de pobre postura que prontamente caiu com o traseiro.
A proteção tintilou ao colidir contra o solo e logo, a multidão que observava o conflito não pode conter alguns breves risinhos. Era satisfatório ver o grupo de cavaleiros arrogantes passar vergonha, isso, entretanto, não foi algo que eles gostaram. O líder gritou em ira, comandando:
— O que estão esperando irmãos!? — ele rosnou, sua face enrubescida pela vergonha — Deixarão este herege sujar o nome da santa igreja? Capturem ele e a vagabunda ao seu lado! — Neste instante, os olhos do cavaleiro pareciam finalmente ter reconhecido a beleza, ainda que disfarçada, de Luna, um luzir ganancioso brilhando neles — Cortem ele, mas não matem, ele tem que sofrer muito mais pelos seus pecados, quanto a garota, esta pagará com outras dores.
O grupo soltou alguns risos sádicos, sacando suas espadas. Lucet inicialmente considerou apenas incapacitar os cavaleiros, afinal, seria um alarde desnecessário perder seu tempo os torturando, porém, quando ouviu o que disseram sobre Luna, uma chama, ardente e furiosa, escalou seus pensamentos. A princesa estava prestes a se levantar para combater, mas, antes que o fizesse, o garoto estendeu sua mão a frente dela.
— Estes são meus, princesa — ele disse ao chacoalhar a cabeça.
Ele então se ergueu, excepcionalmente disposto a causar um bocado de dor.
Não foi difícil prever o resultado do combate a seguir. Em questão de instantes, Lucet golpeou quatro vezes, acertando os pulsos dos cavaleiros, forçando-os a largar seus armamentos antes de, mais rápido do que qualquer um dos cinco era capaz de reagir, dar um passo a frente, executando um giro antes de disparar uma sequência de chutes acertando os quatro ainda em pé no centro do peito com tamanha força que não apenas os ergueu do solo e os arremessou, como também envergou suas armaduras, deixando a marca de sua bota reforçada.
Com baques audíveis, os cavaleiros despencaram ao solo quase que simultaneamente, assustando os presentes com o quão rápido o combate tomara um rumo desfavorável para os combatentes de puritas. Lucet, entretanto, não parou por aí, caminhando em direção a um dos caídos, agarrando a borda de seu peitoral, o erguendo antes de o arremessar uma vez mais, desta vez na direção do líder que tentava se afastar.
— Nem pense nisso — O garoto soltou um breve riso — Você não vai escapar tão fácil depois do que disse.
Os guerreiros mal conseguiam respirar devido a força dos golpes do rapaz, enquanto que o líder, em pânico e raiva, tropeçou no aliado ao tentar se desvencilhar e caiu uma vez mais, desesperadamente tentando se arrastar para longe do garoto que caminhava tranquilamente em sua direção.
Um grande silêncio se instalou no local de embarque. Ninguém sequer ousava desferir um pio que fosse, com exceção das tosses doloridas dos cavaleiros. Tal como era esperado de um corvo, os passos de Lucet eram calmos e quietos, inaudíveis e apenas identificados pela imagem do próprio que se aproximava cada vez mais do corpo trêmulo do cavaleiro. Um largo sorriso surgiu vagarosamente nos lábios do jovem e, a um passo de distância, ele subitamente parou.
O cavaleiro de puritas tremeu involuntariamente diante do rapaz, em sua visão, era como se o próprio diabo estivesse sorrindo para si, avaliando que tormento seria o mais interessante de infligir contra si. Lucet, por um instante, virou sua atenção para Luna e, no instante em que seus olhos se encontraram, sem a necessidade de sequer uma palavra, a garota compreendeu o seu intuito e acenou afirmativamente com a cabeça, um olhar suave seguido de um leve sorriso decorando suas feições.
Ele então olhou para o cavaleiro e disse:
— Se serve de algum consolo, lixo de puritas — o garoto disse, se inclinando na direção do homem — Você, em toda sua insignificante vida fez uma coisa de relevante.
— D-do que e-está falando seu herege imundo!?
— Você acabou de lesar a majestade e soberania de outra nação.
Lucet cerrou seu punho, estalos ecoando de seus dedos firmemente compactos.
— E também acabou de xingar de vagabunda a garota que eu gosto — a expressão do garoto se fechou em uma carranca de ira — Morde os dentes que essa daqui vai doer.
E então, para o cavaleiro, tudo ficou escuro. Não houve sequer tempo de seu cérebro processar a dor pois tamanha foi a velocidade do golpe, em uma fração de segundo, Lucet nocauteou o guerreiro e então, prosseguiu a quebrar ambas as suas pernas. O mesmo procedimento foi repetido em seus companheiros.
O garoto então arrastou seus corpos para um canto da estação e, sob a aprovação tácita dos espectadores e trabalhadores do local, partiu com a princesa na grande besta de aço assim a mesma chegou à plataforma. Em questão de algumas horas o par estava de volta a Lumina.
Ao chegarem, Lucet prontamente desatou para o quartel general do ninho, depositando a quantia necessária para os serviços do Serafim Faeram, bem como os materiais necessários para a prótese. No prazo de uma semana, ambos o especialista e os materiais haviam sido reunidos em Lumina, junto com Iogi que surgira com suas ferramentas e as esquemáticas da prótese.
E então, pelas próximas 72 horas, o mestre Gnoma não apenas forjou todas as peças da peça, como também realizou alguns incrementos de última hora ao observar uma certa marcação rubra no ombro do garoto. Não sabia porque, mas sentia-se absolutamente obrigado a fazê-las quando observou aquela marca, não apenas isso, sabia exatamente como fazê-las, coisa que deveria ser muito difícil de realizar considerando a complexidade das esquemáticas desta que era essencialmente uma tecnologia perdida.
Com o auxílio do Serafim, a prótese foi devidamente instalada. O processo todo foi excepcionalmente doloroso para Lucet, afinal, tudo deveria ser feito com ele acordado para que o funcionamento das vias neurais, os condutores de fluído e circuitos artificiais de mana fossem devidamente verificados e testados. Durante toda a cirurgia, mesmo com os protestos do Faeram, um certo amuleto permaneceu no peito do garoto, pulsando suavemente com energia dourada e ali, o último presente da promessa divina comprado a tanto custo por seu pai, foi inserido no garoto.
O que deveriam ser meses ou até anos de recuperação e fisioterapia foram completamente ignorados pela influência e poder de Faerthalux e, em questão de dias, o garoto já era capaz de movimentar e utilizar o mecanismo como se o braço outrora perdido jamais tivesse sido removido. O amuleto então se partiu, despedaçando-se em fragmentos de luz, sinalizando o cumprimento da promessa.
As forças em Anima então começaram a se mover, preparando-se para este que seria um conflito decisivo que iria certamente mudar a estrutura de todo poder que reinava soberano no mundo. Em um mês, lados e tratados foram estabelecidos, convocados e sinalizados, intenções claras e tudo iria ter seu inicio na fronteira entre Lumina e Barda, um vasto e extenso campo onde neste dia fatídico, o céu noturno reluzia com estrelas, decorado com parcas nuvens e névoa.
Exércitos marchavam em dezenas de milhares, trazendo consigo toda espécie de poderio, mágico ou não. Mas, para um certo corvo, isso não parecia ser tão intimidador. Ele estava apoiado sobre uma pedra uma determinada elevação que antecedia o campo de batalha, observando o mover dos grandes poderes.
A garra, sua confiável parceira de combate, descansava sobre seu ombro enquanto sua veste negra era gentilmente soprada pela brisa. O garoto respirou fundo, lembrando-se dos detalhes de sua atribuição. Ele iria emboscar as tropas inimigas em um ataque que apenas ele era capaz de realizar, um feito corajoso, ou talvez suicida, mas nada que ele temesse, afinal, este era apenas o primeiro passo para destruir aqueles que lhe causaram tanto sofrimento, e agora, ele certamente não iria hesitar.
Gentilmente, uma aura discreta e cinzenta começou a se espalhar em seu corpo e logo, um manto ilusório, translucido, composto de trevas se manifestou e esvoaçou-se. Em seguida, chamas douradas surgiram, acoplando-se ao seu corpo na forma de uma armadura leve, suas peças surreais e ao mesmo tempo repletas de firmeza e inviolabilidade, sacras e aparentemente indestrutíveis.
Então, chamas rubras irromperam de si, mergulhando em direção ao solo antes de trazer à tona uma centúria de guerreiros rubros. Seu olho esquerdo, outrora humanoide, então converteu-se em fera, sua pupila tornando-se uma fenda que contrastava com uma íris vermelha e dourada, decorando o mundo do rapaz com um tom de azul que desacelerava até mesmo o brilho das estrelas acima.
Destes poderes, uma parte logo se infundiu a lâmina sobre os ombros e esta cresceu, tornando-se espada, seu vinco negro com fio dourado e símbolos em seu centro, chamas rubras brilhando ao redor do armamento. Seu braço direito, um armamento por si só, reluzia com relâmpagos escarlate, poder pulsando por sua estrutura. O garoto então olhou para seus companheiros uma última vez e então virou sua atenção para seu objetivo antes de declarar:
— Senhores, vamos a guerra.
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Para todos vocês que chegaram até aqui e acompanharam essa incrível jornada, eu só tenho a agradecer.
Vocês sequer tem noção do quão importantes foram para esse projeto, afinal, sem vocês, meus queridos leitores, o projeto talvez sequer teria chegado tão longe, e por isso, meus mais sinceros agradecimentos.
Espero que tenham se divertido com o segundo volume de Os Contos de Anima ^_^
P.S: E não esqueçam de checar esse link caso queiram uma arte maneira que nem essa: https://www.artstation.com/joaowbenfica