O Dualismo de Yuki - Capítulo 6 - Alea Volumine fati est (2)
Ainda na tentativa de me recompor, tentei afastar o medo que habitava dentro de mim e controlei minha respiração. Eu estava prestes a tentar fugir, mas foi quando…
OOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!
—…
Meu cérebro desligou. Minha mente ficou em branco e todo o esforço que eu tinha feito para me controlar havia desaparecido como se não fosse nada. Por mais que meu corpo continuasse a implorar para que eu reagisse, isso era impossível.
A besta tinha feito um movimento. Não era algo como mover os pés, mas, pelo menos no momento, foi algo pior do que isso.
Um rugido. Um som tão forte que fez com que pedaços de terra se soltassem do chão e voassem para longe. Um grito tão intenso que fez meus cabelos esvoaçarem como se eu estivesse no olho de um furacão. Era um som que separava bem quem era fraco de quem era forte.
Não precisava pensar muito para saber em qual dos dois grupos eu estava. Eu era minúsculo e frágil, se comparado com aquilo.
Nunca tinha ouvido nada parecido com aquele som. Nem nas fábulas contadas pela cidade havia algo tão terrível e amedrontador.
Uma fresta havia se aberto bem no centro da rocha principal — uma boca havia se formado; ou melhor, sempre esteve ali, mas eu não tinha reparado.
Era horrendo, bizarro. Mesmo que não fosse algo humano, eu podia sentir que aquilo estava sorrindo pra mim. No entanto, não era de um jeito agradável, era mais como o sorriso de um predador para com a sua presa, bem antes de dar o bote e destroçá-la por inteiro.
Meu rosto estava branco, completamente pálido. Meus ossos começaram a ranger e minhas vísceras voltaram a arder. Minha mente havia sido destruída.
Contudo, em meio ao meu medo sem fim…
UOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!!!
A besta deu outro rugido, porém, desta vez, levantou uma das suas enormes patas de pedra para me acertar. O objetivo daquele movimento era um só: me esmagar. Isto só confirmava o que eu estava sentido — para aquele ser, eu não era nada mais do que um simples inseto que merecia ser esmagado.
No entanto, para a infelicidade do monstro, meu corpo reagiu; em um passe rápido, rolei e me esquivei para esquerda e depois para trás, me afastando. Foi uma ação abrupta, realizada por puro instinto e que, se eu não tivesse o costume de treinar meu corpo sempre que possível, teria dado errado. Mesmo tendo feito isso, foi uma ação rápida, mas não tão precisa. Pude sentir um ardor no meu rosto, uma parte da minha pele havia colidido com a pata de pedra e com o chão.
Não era nada que eu não pudesse aguentar, só tive a infelicidade de ter sangue escorrendo pelo meu rosto, mas fora isso, não tive nenhum outro ferimento. Meu corpo, é claro, estava sujo; o local era repleto de lama e terra, afinal. As roupas que eu sempre utilizava já estavam todas imundas. Se eu não estivesse em uma situação de vida ou morte, talvez até pensasse na possibilidade de tomar um esporro da senhora Evelyn, mas é claro que pensar nisso não me ajudaria em nada naquele momento.
A única coisa boa que essa situação me proporcionou foi que eu consegui voltar a raciocinar. Claro, o medo ainda estava dentro de mim, mas o choque de quase ter virado uma massa humana foi muito maior.
Meus cabelos, que antes eram brancos como a neve, agora já estavam sujos e terríveis. Sem falar que havia resquícios de musgo — oriundo do forte rugido da besta de pedra —, e terra no meu rosto. Não que minha aparência fosse importante naquele momento, claro.
Como posso sair daqui? Tem lama em todos os lados…
Deixando as pequenas inconveniências de lado, voltei a analisar o ambiente e me deparei com o primeiro grande problema. Como eu ainda estava em minha fase de crescimento, minha altura não era grande coisa; isso, somado com a alta quantidade de água naquela terra, só indicava uma coisa: era óbvio que meu pé afundaria e eu ficaria preso.
A opção de simplesmente correr já estava descartada. O único caminho que poderia servir para a minha fuga, já estava sendo ocupado por aquele ser que era várias vezes maior que eu.
Enquanto minha mente tentava bolar um plano, meu corpo continuava a desviar das incontáveis tentativas do monstro para me esmagar. Como ele estava parado em uma única posição, conseguir esquivar era algo fácil. O motivo dele não ter corrido ou algo do tipo? Simples, ele sabia que no exato momento que saísse do lugar, eu fugiria.
Quando dito desta forma, até parece que os ataques eram fracos, mas esse não era o caso. Cada pata tinha toneladas de força e, cada vez que acertava o chão, a terra tremia. Um ataque daquele e eu morreria.
Fora isso, ele estava usando a sua boca para lançar musgo em mim — nos meus pés, para ser mais preciso. Essa era a forma mais eficaz para me prender e então me esmagar. Pelo menos na visão dele.
Se um mago estivesse no meu lugar, ele provavelmente riria do quão estúpida e simples essa situação era. Contudo, eu não era um mago; muito menos tinha a força e experiência de um.
Depois de desviar dos ataques mais algumas vezes, cheguei a uma conclusão. Eu tinha duas opções: Ou lutar e arrumar um jeito de fugir, ou morrer.
Por mais absurdo que fosse, era óbvio qual decisão tomei.
Meu corpo não possuía mana, mas era ágil.
Agilidade ou poder, qual dos dois ganharia?
Claro, eu queria conseguir fugir, mas em partes teria que contar com a sorte. Eu não era poderoso, nem proficiente em luta, mas uma coisa era certa: Teria que usar a minha cabeça. Por mais inteligente que essa besta fosse, ela não conseguiria pensar da mesma forma que uma pessoa; logo, mesmo sendo fraco, eu poderia ter alguma vantagem. Foi justamente aí que coloquei as minhas esperanças.
Okay, okay… O que posso fazer…? Alguma arma? Não, não tem nada assim por aqui!
Comecei a pensar em vários planos ao mesmo tempo. Diziam que o cérebro humano age mais rápido quando se está em perigo. Se era isso que estava acontecendo comigo, eu não sabia.
Continuava a me esquivar e não parava de tentar pensar em soluções. Vi e revi o local várias vezes… foi quando encontrei algo.
…!!
Todas as vezes em que fui tentar esquivar dos ataques, sempre esbarrava em algo: pedras. Havia algumas pedras no chão lamacento.
Como não havia outros tipos de recursos naquele lugar, usar aquelas rochas seria a única forma de conseguir fazer algo. Sim, era um método ridículo, mas era a única solução pro meu problema.
Quando a besta me atacou mais uma vez, me abaixei rapidamente e peguei um punhado de pedras para poder executar meu plano. Depois de pegá-las, corri em direção à parte mais lamacenta. O piso onde eu estava era mais firme do que nas outras áreas, logo eu poderia correr com tranquilidade.
Fui até a beirada da terra firme e comecei a de fato executar meu plano. Joguei algumas pedras na besta, como se quisesse atrai-la.
OOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!
Em resposta ao meu movimento, a besta se enfureceu. Um novo rugido, mais forte que os outros, foi solto. Foi tão forte que quase perdi o equilíbrio e caí na lama. No entanto, por pouco, consegui me manter em pé.
Após quase estragar tudo, virei meu olhar para a besta e… estava tudo saindo como o planejado.
TUM! TUM! TUM!
A besta estava correndo na minha direção. Seus passos eram tão intensos e fortes que, cada vez que uma pata encostava no chão, a terra tremia igual em um terremoto. Mais e mais pedaços de terra se desprendiam do chão e voavam até se transformar em mera poeira.
O plano estava sendo um sucesso.
A minha tática era simples: Atrair a besta até mim e correr pela passagem que antes estava sendo coberta por ela. Como que consegui fazer com que ela saísse do lugar, no entanto? Simples. Bestas daquele tipo não possuíam olhos, mas seu tato era poderoso; logo, se tomasse vantagem dessa vulnerabilidade, eu poderia virar o jogo. Pelo menos foi isso que pensei, baseado em minhas escassas informações sobre bestas de mana.
A primeira etapa já havia sido concluída com sucesso, agora era só correr e procurar ajuda.
Quando a besta estava a segundos de me alcançar, respirei profundamente, enchendo meu pulmão de ar, e me preparei para correr. A distância foi se encurtando cada vez mais e finalmente disparei. Como se quisesse cortar o vento, corri o mais rápido que pude e evitei o iminente choque físico entre nós dois.
Só mais um pouco…!!
Cada passo… Eu estava cada vez mais perto de sair daquela situação horrível…
Mas não era isso que estava destinado pra mim.
O destino — ou o que quer que fosse —, não queria que isso terminasse dessa forma. Não poderia ser tão fácil; nada é tão simples.
Humanos são sim inteligentes, mas eles também são falhos. Um pequeno erro e tudo poderia acabar — a esperança poderia acabar.
E eu, sendo um humano, poderia falhar. E foi isso que aconteceu.
Em meus últimos passos para alcançar a minha tão esperada saída, algo ocorreu. Por um breve momento, tive um mal pressentimento e resolvi olhar para baixo; quando assim o fiz…
— O qu…!
Uma gota de suor frio. Essa foi a única coisa que senti antes de ter o meu corpo arremessado por um monte de terra. O piso, que deveria ser firme e seguro, havia se transformado em algo como um pequeno monte e atingiu bem no meio do meu estômago, fazendo com que meu corpo voasse para longe.
Tudo aconteceu bem rápido, em questão de segundos, mas pra mim tinha demorado muito mais. Senti cada pequena etapa disso; senti meu estômago sendo esmagado e meus olhos se arregalando por causa do impacto, meus ossos gritando de dor, suco gástrico e sangue saindo da minha boca enquanto meu corpo ainda estava no ar…
Senti tudo antes do meu corpo cair e rolar sem parar naquela terra lamacenta.
UOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOO!!!!
Em meio ao meu frágil corpo caído, a besta rugiu mais uma vez. A escuridão da noite já tinha avançado de uma forma avassaladora. A fraca luz que começava a vir da lua, batia em meu corpo enquanto eu parava de rolar e quase perdia a consciência.
Aquela não era uma besta de mana comum…
Sem saber, acabei provocando uma luta contra um ser que pode usar magia.
***
NOTAS DO AUTOR
Nota 1: Se puderem comentar e dar um feedback sobre a obra, agradeço.
Nota 2: Depois de longos meses sem postar, finalmente estou de volta! Peço perdão aos leitores por sumir de forma abrupta; muitas coisas estavam ocorrendo em mim vida e não tive tempo para cuidar da obra. No entanto, agora será diferente! Começarei a postar de 15 em 15 dias para conseguir manter a obra de um jeito agradável, sem precisar rushar nem cortar nada. Então, dito isto, o hiato de O Dualismo de Yuki acabou!
Nota 3: Por favor, se gostam da obra, peço que a divulguem para me ajudar neste retorno!
Vejo vocês em breve.