Isekai Corrupt - Capítulo 53
Correr de um perigo iminente era algo que ela jamais imaginaria experimentar. Sua vida até então fora tranquila e pacífica, tão protegida que nunca havia sentido o desespero de lutar pela própria vida. Mas agora tudo era diferente.
Desde que o irmão adoecera, o pai não moverá um único músculo para providenciar qualquer tipo de remédio que pudesse ajudá-lo a melhorar. Ela se viu obrigada a tomar a decisão que vinha adiando há tanto tempo: sair em busca de cura, deixando o irmão aos cuidados de sua irmã mais nova.
Seu pai não se importava com nenhum dos três, enxergando-os como apenas mais bocas para alimentar. E, quando não traziam algo de útil para casa, sua fúria era implacável, resultando muitas vezes em espancamentos brutais. Ela sabia que precisava fugir daquele lar, mas lhe faltava coragem para realmente sair dali com seus irmãos.
Agora, sentia o peso dessa hesitação.
— Pare de lutar! Estou com muita fome! Isso vai ser delicioso!
— N-não! Me solta! Me solta!
Uma figura grotesca, que tinha traços humanos misturados a características monstruosas, a prendia contra o tronco áspero de uma árvore. Ela nunca esteve tão longe de casa, nunca saíra daquela vila, e ao se perder durante dois dias seguidos na busca por medicamentos, acabara deparando-se com essa criatura.
A criatura pulou sobre ela com fúria, o rosto magro e os olhos selvagens fixos em seu corpo enquanto a saliva lhe escorria da boca.
Em suas mãos, garras afiadas e uma força brutal que a imobiliza sem esforço. Ela sentia-se apavorada, enquanto olhava para aquela cauda sinuosa e os dentes pontiagudos que o faziam parecer uma fera faminta.
É… é um demi-humano?! Dizem que alguns demi-humanos devoram até os próprios… Se ele faz isso com os deles, então… Ele quer me devorar!
Jamais sentira tanto medo.
Como poderia uma criatura tão semelhante a ela em tamanho e aparência estar tão dominada por esse impulso animal? Ela tentou empurrá-lo, forçando o corpo contra a criatura, mas era inútil; sua força estava em outro nível.
As lágrimas escorriam de seu rosto, e ela gritava, desesperada, em busca de ajuda ou um milagre que a tirasse dali. No entanto, aquele ser não se importava com seus gritos ou o sofrimento estampado em sua face. Tudo o que ele queria era saciar a fome cruel que ardia em seus olhos.
— P-por favor! N-não! Por favor! — ela implorava, a voz embargada pelo terror.
— Pare de se mover! — zombou o monstro, apertando-a ainda mais. — Kukuku, sua pele é tão lisinha! Não como nada há dias e dou de cara com uma humana suculenta… com certeza sou um cara de sorte!
Ele segurou seus braços com uma única mão, forçando-a completamente contra a árvore, enquanto a outra percorria seu corpo, quase como se examinasse a presa antes do abate.
Imobilizada e sem escapatória, ela sentia cada toque horrendo da criatura, e sua mente vagava, buscando refúgio nas lembranças de sua família.
Perdoem-me… Eu queria ter ajudado vocês… queria ter sido uma irmã mais velha melhor… me desculpem…
— AHHHH!
Um grito feroz ecoou na floresta. Ela manteve os olhos fechados, esperando que o fim estivesse próximo. Porém, ao abri-los, viu a criatura no chão, contorcendo-se de dor e segurando o braço direito, que agora jazia decepado e ensanguentado ao seu lado.
— Mas… o que… aconteceu…?
O grito de dor da criatura rasgou o ar ao seu redor.
— AHHH! Meu braço! M-meu… grr! Que dor! Quem fez isso?! — berrava, contorcendo-se no chão.
Era uma oportunidade única.
Ela lutou para se levantar e escapar, mas, por mais que tentasse, as pernas se recusaram a obedecer. Estava paralisada, o corpo imóvel, dominado pelo pavor.
A criatura virou-se para ela, os olhos agora carregados de ódio e uma fúria descontrolada. Ele se aproximava, lento e ameaçador, enquanto ela se arrastava pelo chão, recuando na tentativa de se afastar daqueles olhos selvagens.
— N-não… por favor… — sussurrou, a voz embargada pelo terror.
— Foi você quem fez isso comigo?! Foi você! — a criatura rugiu, avançando ainda mais.
— N-não! Não fui eu! — Ela balançou a cabeça freneticamente, tentando, em vão, convencer a fera.
— Então quem foi?! — exigiu, rosnando de dor e fúria.
— Fui eu.
A voz firme ecoou atrás da criatura, cortando o ar como uma lâmina afiada. Ela desviou o olhar, surpresa, e viu uma figura parada ali.
Um garoto, não mais velho do que uma criança de dez anos, vestido com trajes dourados que reluziam como algo saído de uma história de fantasia. Uma espada descansava em sua cintura, ornamentada com sete joias, cada uma incrustada ao longo da lâmina, cintilando como estrelas. Era uma arma grandiosa, especialmente para alguém tão jovem, mas ele a carregava com confiança, sem sinal algum de peso ou esforço.
A criatura virou-se, hesitando, como se algo no garoto despertasse um temor profundo.
— Quem é você?! — rosnou a criatura, a voz agora vacilante, traindo o medo que o consumia.
— Isso não lhe interessa — respondeu o garoto, a voz calma e imperturbável.
Num piscar de olhos, o menino desapareceu e, antes que a criatura pudesse reagir, ele estava ao lado dela, com a mesma serenidade que antes. Ela mal acreditava no que via: o garoto surgira à sua frente, com a rapidez de um relâmpago, como se fosse capaz de dobrar a distância entre eles sem esforço.
Quem… quem é ele…?
O menino inclinou-se em sua direção, e seus olhos azuis brilharam com um calor acolhedor. O terror que antes lhe apertava o peito começou a se dissipar, substituído por uma calma inexplicável.
— Você está bem, pequena? — perguntou ele, em tom gentil.
— P-pequena? — repetiu, confusa.
Ela tinha vinte e cinco anos, e aquela criança a tratava como se fosse uma menina indefesa. A pergunta ecoava em sua mente como um enigma. Quem era ele?
O garoto ajoelhou-se ao lado dela e repousou uma mão sobre sua cabeça, num gesto protetor que ela jamais experimentara. Era como se, naquele toque, estivesse todo o conforto e segurança que sua vida sempre lhe negara.
— Não precisa chorar. Vai ficar tudo bem. Não deixarei que o mal lhe cause qualquer sofrimento, então fique tranquila, pequena garota… eu sou um herói. E vim para te salvar.
Aquelas palavras carregavam uma força que ela não podia compreender. Cada sílaba parecia aquecer seu coração, e o medo que restava finalmente evaporou. Só conseguia pensar em uma coisa.
— Q-quem… quem é você? — perguntou, a voz fraca e embargada pela emoção.
O garoto lhe ofereceu um sorriso suave, sereno como a aurora.
— Quem eu sou…? — Ele hesitou por um instante, como se considerasse a resposta. — Eu sou o bem.
⧫⧫⧫
O Reino Artóres, uma das maiores e mais influentes nações do País Sacro, era um modelo de paz e prosperidade. Suas terras vastas e bem desenvolvidas se estendiam por grande parte do território, e sua estabilidade era admirada por todos ao seu redor.
No entanto, essa paz era mantida por um grupo seletíssimo, que governava de maneira diferente dos outros reinos. Ao invés de um monarca, Artóres era controlado por uma cúpula de governantes, cada um com um papel crucial no equilíbrio do reino.
Entre eles estavam pessoas poderosas e respeitadas: Eleanor, a comerciante imbatível e astuta; Dolores, o mestre de armas que sabia lidar com qualquer espada ou lâmina; Safira, a mulher mais sábia do mundo, cujas palavras eram tidas como verdade universal; e, por fim, Fernando, o homem misterioso que controlava o submundo do reino.
Esse “submundo”, como era chamado pelas pessoas que pouco sabiam sobre ele, era, na verdade, uma cópia meticulosamente estruturada do mercado negro que se espalhava pelos reinos. Mas, ao contrário de seus equivalentes fora das fronteiras de Artóres, o submundo dentro do reino não apenas envolvia atividades criminosas: ele era uma rede que usava o próprio reino para enriquecer seus membros. Tentativas de erradicá-lo falharam repetidamente, como uma praga que voltava cada vez mais forte.
Após inúmeras tentativas frustradas, Eleanor, Dolores e Safira perceberam que lutar contra o submundo era uma causa perdida.
Ao invés disso, procuraram Fernando, o homem que controlava o caos dentro dos muros do reino, o único capaz de equilibrar as forças que ameaçavam destruir a ordem.
Era uma aliança não oficial: o submundo poderia agir, mas dentro dos limites estabelecidos por Fernando e pelos governadores, evitando que seus crimes deixassem o reino à deriva. Contudo, mesmo com esse pacto, mortes ainda ocorriam de tempos em tempos, vítimas do comércio sombrio e da violência que o submundo trazia consigo.
Era uma manhã fria e silenciosa quando a reunião no castelo central de Artóres estava prestes a começar. Todos os governadores haviam sido convocados, mas como sempre, Eleanor estava lá antes de todos, uma postura que denotava sua pontualidade implacável.
Ela não tolerava atrasos, e sabia que sua presença imponente ajudava a reforçar o peso de sua autoridade. Se alguém faltasse com respeito ou fizesse-a esperar mais que o estipulado, ela não hesitaria em tomar medidas drásticas, como se fosse o seu direito divino. Mas, com seus iguais, ela sabia que precisava de cautela. O poder que ela tanto almejava dependia de suas alianças, e, para conquistá-las, teria que ser paciente.
Sentada à mesa imensa, com suas mãos entrelaçadas sobre a superfície de madeira polida, Eleanor aguardava, seus olhos se perdendo nos pensamentos sobre o passado. Embora fosse respeitada, ainda havia algo que a incomodava profundamente.
Sua falta de habilidades de combate a fazia vulnerável, forçando-a a depender de outros para proteção. Nesse momento, seu olhar se voltou para o guarda-costas que estava à sua direita, sempre atento, em pé, com sua katana pendendo de sua cintura.
Ele era jovem, provavelmente não mais que vinte e cinco anos, e possuía uma habilidade impressionante com a espada, talvez até superior à de muitos homens mais velhos. Eleanor o conhecera quando ainda era um escravo, comprado de um mercador. Seu talento inegável não poderia ser ignorado, e ela sabia que ele era valioso. A confiança que ela depositava nele estava além das palavras.
O guarda-costas percebeu o olhar repentino de Eleanor, que o fixava com uma intensidade rara. Ele manteve o olhar, mas seu semblante estava mais concentrado, curioso. Ele podia sentir que algo estava se passando em sua mente, algo que ela não dizia, mas que seus olhos denunciavam.
— O que se passa, mestra? — ele perguntou, sua voz baixa, mas firme, como um aviso.
Eleanor, ainda pensativa, desviou os olhos para ele e suspirou. Não era um suspiro de cansaço, mas de reflexão. Um olhar de quem sabia que, para manter o controle sobre o reino, precisava se rodear das pessoas certas, e que, muitas vezes, esse controle envolvia não só poder, mas também paciência.
— Nada de mais — respondeu ela, sua voz serena, mas com uma camada de complexidade que ele conhecia bem. — Apenas… pensando nas escolhas que fiz.
O homem permaneceu em silêncio, mas seus olhos não se desviavam. Ele sabia que aquela mulher, por mais impassível que parecesse, era movida por mais do que apenas sua necessidade de poder. Ela era uma estrategista nata, sempre calculando cada passo.
Ele se permitiu um leve movimento, ajustando sua postura para estar ainda mais atento.
Eleanor voltou a olhar para a mesa, seus pensamentos se distanciando de seus sentimentos pessoais e se voltando para o reino e as complexas relações que ela precisava alimentar.
O que viria daquela reunião? O que mais ela teria que fazer para consolidar sua posição no reino? Ela não sabia, mas estava disposta a fazer o necessário para chegar onde queria.
— Senhorita, deseja alguma coisa? — Arthur perguntou, com a voz baixa e respeitosa, embora houvesse uma preocupação nítida em seu tom.
Eleanor suspirou, olhando para a mesa diante de si, antes de cruzar os braços em uma mistura de frustração e impaciência.
— Ah… nada não. É que… eles estão demorando demais! — sua voz demonstrava o quanto o atraso começava a afetá-la.
Arthur, sempre atento, inclinou-se levemente e disse, com uma firmeza que ele mesmo sabia ser excessiva para uma situação como aquela:
— Se a senhorita quiser, irei puni-los assim que chegarem.
Eleanor olhou para ele, uma expressão de desgosto estampada no rosto. Embora soubesse que Arthur cumpriria sua ordem sem hesitar, ela também sabia que atacar seus iguais não traria nada além de problemas.
Além disso, o equilíbrio do poder no reino dependia de suas alianças, e ela precisava de todos ali.
— Não precisa se preocupar, Arthur. Eles sempre se atrasam… E você ainda é bem novo. Não quero que morra tentando enfrentar Dolores, o mestre de armas. — Eleanor falou calmamente, mas havia um toque de carinho na maneira como se referia a seu guarda.
A verdade era que, por mais que o fosse, ele ainda não era o suficiente para enfrentar alguém como Dolores.
Arthur sentiu um amargo nó apertar seu peito, palavras de desprezo murmurando em sua mente.
Ele estava fraco. Sabia disso. Se ao menos fosse mais forte, se tivesse mais poder…
— Me perdoe, senhorita… Eu ainda não sou forte o bastante… — suas palavras saíram carregadas de arrependimento.
Ela percebeu sua frustração, mas não se deixou abalar. Eleanor sabia que ele se torturava em silêncio, ansiando por mais força, mais habilidades. Mas a verdade era que ninguém ali, exceto talvez Dolores, poderia oferecer-lhe o que ele desejava.
— Está tudo bem, não precisa se preocupar com isso agora. Você ainda tem muito a melhorar. Dolores tem o dobro de sua idade, é normal ele ser mais forte, mais experiente… Apenas pense positivo, Arthur. Você vai melhorar com o tempo. — disse ela, com um tom suave, mas com a autoridade que sempre a acompanhava.
Arthur abaixou a cabeça, aceitando as palavras dela, mas o peso da autocrítica ainda o apertava. Então, uma leve batida na porta interrompeu seus pensamentos.
A porta da sala se abriu, e Eleanor se levantou, virando-se para ver quem entrava. Quando seus olhos encontraram os de Dolores, uma tensão se formou no ar, como se uma batalha silenciosa estivesse prestes a começar. Eles não se gostavam.
Era um respeito frio entre os dois, uma coexistência baseada na necessidade, mais do que na amizade.
— Eleanor… hm… vejo que chegou cedo. — A voz de Dolores era grave e poderosa, quase desafiadora.
Eleanor manteve a postura firme, olhando-o sem vacilar.
— Sim, mestre de armas Dolores, como estão indo os treinamentos militares dos soldados do reino?
Dolores deu um passo à frente e estendeu as mãos, um gesto de cordialidade que ela aceitou sem hesitar, apertando seus dedos enormes com a delicadeza de quem tentava demonstrar controle.
Ela era menor, sem dúvida, e sua doença impedia seu crescimento, mas ela sabia como fazer valer seu poder.
— Está indo muito bem. Temos jovens com talentos promissores… — Dolores respondeu, com um sorriso que mais parecia uma linha reta.
Eleanor observava com atenção, não apenas as palavras, mas também os gestos, o tom. Havia sempre algo mais por trás do que era dito.
— Que ótima notícia! … Por acaso aquele jovem está entre eles? — perguntou ela, com uma curiosidade afiada.
Dolores suspirou, parecendo desconfortável ao falar sobre o jovem.
— Ah… sim… aquele jovem? Bom, ele não aparece nos treinamentos. Ele diz que não vale a pena treinar sem arriscar sua vida em uma luta até a morte… Eu acho um pouco preguiçoso da parte dele.
A conversa logo se aprofundou em mais detalhes sobre o jovem prodígio, o garoto que, mesmo com apenas cinco anos de idade, havia derrotado um dragão que ameaçava destruir o reino.
Era uma história que todos no reino conheciam. Mas Dolores, com sua típica franqueza, revelou algo que pegou Eleanor de surpresa.
— Ouvi dizer que ele vai ganhar um título de mestre de armas… Isso é verdade?
Eleanor sentiu seu coração acelerar. Dolores, com um sorriso sutil, respondeu.
— Sim, é verdade. Ele vai ganhar o título em breve. Bem cedo, na verdade…
Eleanor franziu a testa, surpresa e, ao mesmo tempo, desestabilizada pela informação.
— Ele ainda é uma criança, não? Você acha que ele está pronto para assumir essa responsabilidade?
Dolores não hesitou em responder.
— Em termos de força… esse garoto é um monstro entre os monstros. Nunca vi alguém como ele. Ele já me ultrapassou faz tempo…
A revelação fez Eleanor vacilar por um instante.
Uma criança… ultrapassando o mestre de armas em força. Ela olhou para Arthur, que estava ao seu lado, e viu a expressão de incredulidade e raiva em seu rosto. A ideia de que alguém mais novo do que ele, alguém que ele considerava inferior, tivesse superado um mestre como Dolores, tocou sua insegurança mais profunda.
Arthur se amaldiçoou em silêncio, sentindo uma raiva crescente dentro de si. Ele não era o mais forte, e isso o frustrava ainda mais.
O clima na sala estava tenso, com a conversa tomando um rumo cada vez mais inquietante. Dolores se recostava na cadeira, seus olhos fixos em Eleanor enquanto falava com calma, mas seu tom carregava uma preocupação nítida.
— Não é um garoto fácil de se lidar… — Dolores cruzou os braços e continuou, a expressão se tornando sombria. — Ele tem umas manias e pensamentos bem estranhos.
— Que tipo de pensamentos estranhos? — Eleanor inclinou a cabeça, já intuindo que algo não estava certo. — Por acaso ele está passando por aquela fase horrível?
— Hm… fala de puberdade? Não, não é nada disso. Se bem que, pode ser que ele entre nessa fase em alguns anos, mas não é disso que estou falando. — Dolores fez uma pausa, pensando antes de continuar. — Ele é uma criança, então é normal ter pensamentos infantis, mas ele é bem inteligente para a idade dele.
— Isso é ruim? Pelo que você me contou até agora, não parece tão ruim assim… — Eleanor se permitiu um pequeno sorriso, tentando entender melhor.
— Ainda não terminei… — Dolores se interrompeu, respirando fundo. — Essas manias estranhas, como eu disse, ele insiste na ideia de que ele é o “bem”.
— O “Bem”? — A dúvida na voz de Eleanor era palpável.
— É difícil de entender assim, mas vou explicar. — Dolores olhou fixamente para Eleanor, tentando escolher as palavras certas. — Ele olha para toda a humanidade como o bem, e todas as outras raças como o mal. Já tive algumas conversas com ele sobre isso, e ele me disse, “Não tenho interesse em ter contato com o mal, a não ser que seja para exterminá-lo.”
— Isso… — Eleanor engoliu em seco. — Isso é bem estranho para uma criança, não é? Eu não sou a única que acha isso, né? Como nunca tive filhos, não sabia se era paranoia minha ou se ele realmente tem algo de errado.
— Bem, de certo modo… — Dolores fez uma pausa, refletindo. — Não é uma ideia comum. Sabemos que existem muitos reinos humanos no nosso país, mas em outros lugares, há reinos de outras espécies, como demi-humanos e outras criaturas. Não é como se nós odiássemos outras raças, mas simplesmente não convivemos com elas, pois nossos meios de vida não são compatíveis. Até mesmo há aqueles que viajam para outros países para aprender sobre diferentes culturas.
Dolores suspirou e olhou para o teto, tentando formular suas palavras.
— Será que isso não é uma fase? Talvez seja uma daquelas fases em que ele pensa coisas estranhas, afinal, ele tem apenas dez anos.
— Seria uma fase bem estranha… — Dolores balançou a cabeça, sua voz grave. — Quando eu o conheci, ele já pensava dessa forma. Não é algo momentâneo, ele já tinha essa mentalidade antes de entrar para o exército do reino, e provavelmente ainda pensa assim.
Eleanor o olhou, intrigada, querendo entender melhor.
— O que te faz achar que ele ainda tem esses pensamentos?
— Ele tem aceitado muitas missões de procura de escravos fugitivos… — Dolores hesitou antes de soltar a bomba. — A maioria dos fugitivos são demi-humanos.
— Bom… isso não é comum? — Eleanor franziu a testa. — Às vezes, para aumentar suas habilidades e conhecimentos, é normal um membro do exército do reino pegar missões de aventureiros ou algo assim…
— Seria normal, se ele completasse as missões de forma eficaz. — Dolores cruzou os braços, seu olhar sério. — Mas não é isso que acontece.
— Do que você está falando? — Eleanor se aproximou um pouco, curiosa. — Ele vai ganhar um título de mestre de espada, duvido que tenha problemas para caçar e capturar um simples escravo humano ou demi-humano.
— Ele não deixa os escravos escaparem… ele os mata. — Dolores soltou as palavras com um peso tremendo.
— O… O quê? Como assim? — Eleanor ficou boquiaberta. A surpresa e o choque em sua voz eram claros.
— Ele simplesmente mata qualquer demi-humano que encontra. Mesmo quando vai atrás de escravos humanos, ele não os mata, já houve alguns casos em que ele realmente matou humanos, mas são poucos em comparação com os demi-humanos.
Eleanor ficou em silêncio, processando o que acabara de ouvir.
— Ele realmente é… devo dizer, estranho. — A dúvida estava estampada no rosto de Eleanor. — Talvez ele odeie os demi-humanos por algo do passado… não é tão comum, mas ainda assim, existe essa parcela de pessoas que nutrem esse ódio.
— Se fosse apenas um ódio profundo, eu entenderia… — Dolores balançou a cabeça, sua expressão de desgosto era evidente. — Mas não é ódio. O que aquele garoto sente não chega a ser ódio. Eu me lembro de uma vez que fui com ele em uma expedição, tivemos que matar alguns demi-humanos famintos que queriam nos devorar. Depois de matá-los, eu o vi chorando no canto, pela morte deles. Naquele momento, eu percebi… aquele garoto, ele chorava de pena…
Eleanor se calou, observando a profundidade da dor nas palavras de Dolores.
— Isso… — Eleanor começou, mas não sabia como continuar. — Isso não é uma coisa ruim, certo? Ele tirou uma vida, então é normal sentir pena.
— Ele sentiu pena… por eles não terem nascido humanos. — Dolores falou baixo.
Eleanor ficou sem palavras, tentando entender a complexidade da situação.
— Esse garoto é completamente… — Ela não sabia o que mais dizer. — Eu não gostaria de me encontrar com ele…
— Ah, é verdade… sua família tem uma parte que é demi-humana, não é? — Dolores perguntou com um sorriso amargo.
— Xiu! Não fale sobre isso, o sangue demi-humano na nossa família já causou muitos problemas… — Eleanor imediatamente se alarmou. — Devo dizer, prefiro manter isso em segredo. Quanto menos pessoas souberem, melhor.
Ela estava visivelmente desconfortável. O médico que a examinou sugeriu que sua doença, que dificultou seu crescimento, poderia ter sido causada pela mistura de sangue humano e demi-humano, algo que ela preferia manter em segredo.
— Desculpe, — Dolores disse, percebendo o desconforto de Eleanor. — Eu sei que é um assunto difícil, mesmo no nosso país.
Eleanor sorriu, forçando um tom leve.
— Minha mãe é demi-humana, mas meus irmãos não tiveram o mesmo problema que eu. Devo dizer, fui a sortuda da vez… — Ela fez uma pausa, rindo para si mesma. — Kukuku.
— Sortuda? — Dolores levantou uma sobrancelha, intrigado com a reação dela.
— Kukuku, é uma brincadeira… — Eleanor respondeu rapidamente.
Nesse momento, as portas da sala se abriram novamente. Duas figuras adentraram o local. Uma delas era Safira, com seus longos cabelos negros, visivelmente cansada, mas determinada. Ao seu lado estava seu guarda pessoal, um homem imponente de dois metros de altura, com um saco na cabeça e uma foice gigantesca nas costas.
— Safira, atrasada como sempre… — Dolores comentou com um sorriso irônico, observando-a se acomodar na cadeira. O guarda, com seus músculos visíveis e presença marcante, ficava de pé ao lado dela.
— Não enche, ainda estou com sono… — Safira respondeu com um tom entediado, sem dar muita importância.
— O que ficou fazendo a noite toda? Ao invés de dormir… — Dolores perguntou, um pouco mais curioso.
— Dormir? Quando estou tão perto de concluir uma das minhas mais grandiosas pesquisas? — Safira respondeu com um sorriso satisfeito, claramente obcecada pelo que estava fazendo.
As olheiras sob seus olhos eram profundas, como se ela não tivesse dormido há dias.
— Que tipo de pesquisa demanda tanto tempo assim? — Eleanor perguntou, intrigada.
— O tipo de trabalho que me tornaria a pessoa mais poderosa do mundo inteiro… — Safira respondeu com um sorriso misterioso.
Eleanor e Dolores se entreolharam, ambos com o mesmo pensamento: o que ela estaria fazendo?
— A mais poderosa? Do mundo? Não acha uma ideia um pouco exagerada? — Eleanor questionou, tentando obter mais informações.
— Kukuku… quando estiver tudo terminado, tenho certeza de que não pensarei mais dessa forma. — Safira respondeu com confiança, como se soubesse algo que os outros não sabiam.
Eleanor e Dolores estavam cada vez mais curiosos. O que Safira estaria realmente pesquisando?
Dolores olhou fixamente para Safira, sua voz carregada de desconfiança.
— Não gostaria de compartilhar? Se isso for realmente algo tão relevante, temo que seja de interesse geral entre todos nós. — disse ele, com a voz firme, mas carregada de um tom de provocação.
Safira se recostou em sua cadeira, cruzando os braços com um olhar indiferente.
— Entre todos nós? — ela respondeu, o sarcasmo evidente em suas palavras. — Dolores, se não me engano, minhas pesquisas não têm nada a ver com vocês a partir do momento em que recusaram ajudar na parte financeira, lembram? Falaram que era bobagem apostar tanto dinheiro em uma pesquisa sem grandes chances de sucesso… Não preciso compartilhar nada com ninguém.
Dolores apenas a observou em silêncio por um momento, como se ponderasse suas palavras. Então, ele suspirou e respondeu.
— Hm… você não está errada. Não deve nada para nenhum de nós.
Safira inclinou ligeiramente a cabeça, mas não deixou transparecer nem uma pitada de arrependimento.
— Não precisamos saber, Dolores. — disse a voz tranquila de Eleanor, que até então se mantivera calada. — Safira, se o que você está pesquisando serve ao bem e à prosperidade do reino, não há motivo para questionarmos.
Safira esboçou um sorriso sutil, como se tivesse esperado exatamente essa resposta.
— Não há motivo, e eu não falaria… — disse ela.
Dolores, porém, não parecia disposto a deixar a conversa ir embora sem mais provocações. Ele se levantou e se aproximou de Safira, seus passos rápidos e cheios de uma intenção difícil de disfarçar. O guarda de Safira, Tyler, imediatamente se moveu, bloqueando o caminho de Dolores com sua postura imponente e sua foice em punho.
— Gyorr… — grunhiu ele, um aviso claro em sua voz.
Dolores, sem hesitar, olhou para o guarda e disse, com um sorriso irônico:
— Não precisa se preocupar, Tyler, não irei fazer nada.
O grande guarda parecia estar à espera de algo mais. Safira, no entanto, se manteve impassível.
— Esse seu gigante cabeça oca não tem chances contra mim, sabe disso, né? — disse Dolores, com uma risada baixa.
— Me atacar só porque eu não quero compartilhar algo que me pertence não seria um ato muito bem pensado, não é?
Safira manteve o olhar fixo em Dolores, sem um sinal de intimidação.
— Te atacar? Não. Eu só queria que soubesse disso… Se esse seu projeto de “não sei o quê” causar mais problemas do que ajuda, eu o acabarei na hora. Compreende?
Um silêncio caiu sobre a sala enquanto os olhares se cruzavam. Safira, com a mesma calma de sempre, respondeu.
— Eu entendi, não precisa me dizer. Se não fosse algo realmente bom, eu nem estaria indo atrás disso. Kukuku.
Foi então que Eleanor se levantou, tentando mudar o rumo da conversa.
— Vamos dar início à reunião? Acho que já perdemos muito tempo esperando todos chegarem.
Dolores, ainda em silêncio, observou a movimentação à sua volta. Estava prestes a falar quando algo a fez parar. Uma presença inesperada parecia ter se manifestado dentro da sala.
— Quando ele entrou aqui?! — Dolores pensou, sentindo uma pontada de desconforto. Ela não percebeu a entrada do homem. — Teletransporte? Invisibilidade? Não… Esta sala tem proteções contra essas habilidades…
Antes que Dolores pudesse concluir seu raciocínio, o homem já estava sentado à mesa, com as pernas cruzadas. Ele se chamava Fernando, um nome que era bem conhecido entre os três governantes.
— Desculpem pela demora. Tive alguns problemas… Já podemos começar? — disse Fernando com um tom casual, como se já soubesse que nada disso era novidade para ele.
Dolores, ainda surpreso, olhou para ele, mas não pôde deixar de perguntar:
— Quando…? Como você entrou aqui?
Fernando não pareceu se incomodar com o questionamento.
— Isso não importa, Dolores. — ele respondeu, com uma leve risada. — Podemos continuar?
Dolores ficou sem palavras por um instante. Mas, ao ver a expressão séria de Eleanor, ele sabia que não havia mais espaço para questionamentos. Fernando não estava ali por acaso, e as questões mais urgentes precisavam ser resolvidas.
Eleanor, com um tom incisivo, cortou a tensão.
— Você disse que tinha algo importante para compartilhar, Fernando. O que é?
Fernando se recostou em sua cadeira, seu olhar penetrante se voltando para os outros à mesa.
— Vocês souberam da aparição de um monstro rank bestial, ou até mais forte, no nosso país vizinho?
— Rank bestial?! — exclamou Dolores, sua expressão tomada por surpresa e incredulidade.
— Isso é verdade?! — perguntou Eleanor, agora visivelmente interessada.
— Se isso for verdade… não acham estranho? Tantas aparições de criaturas de ranks tão altos? — comentou Safira, sua voz fria e calculista. — Nosso país, Sarovan, Alema e agora Dieres… Todos esses países sofreram ataques ou avistamentos de monstros de rank tão elevado…
Fernando não deixou a conversa se arrastar mais tempo. Sua voz se manteve calma, mas havia uma gravidade em suas palavras.
— Isso é verdade, Safira. Isso me faz pensar que esses ataques podem ter um propósito. Nunca tivemos tantos relatos em apenas três anos.
Dolores franziu a testa, pensativo.
— Como? Motivos? Desde quando bestas rank bestial atacam seres fracos por motivos? Mesmo que tenham intelecto, é difícil acreditar que planejem algo tão abrangente… Onde ocorreu essa aparição?
— O monstro apareceu em Dieres, no território do reino Xellivia. — respondeu Fernando, com uma leve pausa.
— Dieres? — repetiu Dolores, sua expressão mudando para uma mistura de ceticismo e curiosidade. — Algum atentado ao reino ou algo assim?
— Não exatamente. — Fernando continuou. — Foi uma cidade central, onde uma cobra gigantesca atacou uma cidade central. Houve fatalidades, mas conseguiram matar a criatura.
Eleanor, com um olhar intrigado, questionou:
— Uma cidade? Quem conseguiu matar a cobra? Se me disserem que foi um morador local… acho difícil acreditar que alguém tão poderoso viva em uma cidade central.
Fernando revelou, então, mais uma peça dessa história intrigante.
— Não foram só humanos… Mas também sim feras que moram em uma floresta próxima. Elas atacaram e mataram a cobra. Isso aconteceu há um mês.
Dolores, finalmente, quebrando o silêncio, comentou:
— Um mês… Levamos tanto tempo para obter uma informação tão importante… Isso é preocupante.
Safira, com um olhar firme, corrigiu:
— Dolores, sem comentários inúteis. Conseguir informações de fora do nosso território já é difícil. Agora, de outro país? Isso demora. E, sinceramente, foi até rápido, se pensar bem.
Ela virou-se para Fernando, o olhar perscrutador.
— Como conseguiu essas informações? Duvido que tenha sido fácil.
Fernando riu, mas sua expressão não era de diversão.
— Fácil não foi, mas também não foi difícil. Eu tenho alguns contatos fora do reino… Um amigo, devo dizer. Ele me contou logo após tomar algumas medidas contra a situação.
— Medidas? — perguntou Safira, seu interesse agora totalmente aguçado.
— Eu não sei o que exatamente ele fez. Não adianta me perguntar. — respondeu Fernando, com um tom de quem não tem todas as respostas.
Eleanor, agora mais intrigada, fez sua última pergunta.
— Essas feras, para derrotar um ser de poder tão grande… Como conseguiram? Não me diga que havia outra fera rank bestial entre elas?
Fernando, então, revelou o que parecia ser o ponto central dessa história.
— Na verdade, eles foram coordenados por um grupo de humanos chamados “Corrupt”. Um bando de ladrões em busca de uma relíquia que estava dentro da barriga da cobra. Usaram os lobos para matar a cobra em troca de ajuda para derrotá-la. Entre os lobos, os guardas sobreviventes disseram que um deles andava sobre duas patas… Como se fosse um lobisomem das lendas.
— O que!? Um lobisomem!?… Isso é verdade?! — exclamou Safira, seu entusiasmo evidente.
Fernando, calmamente, respondeu, seus olhos brilhando com uma mistura de mistério e malícia.
— Sim. Safira, ficou bastante interessada…
— Claro! É uma das raças raras que procuro há tanto tempo! — ela não conseguiu esconder a excitação, mas suas palavras fizeram as outras figuras à mesa trocarem olhares desconfortáveis. — Uma cobaia fresquinha… — completou ela com um sorriso quase cruel.
Dolores não teve paciência e cortou a fala de Safira com um tom ríspido.
— Cobaia? Quer fazer do líder dos animais que derrotaram uma fera de rank bestial uma cobaia sua? Safira, não se meta com eles. Nem agora, nem nunca.
Safira, porém, não se intimidou.
— O que está dizendo? São apenas animais!
Fernando, sem mudar sua postura, continuou com sua narração, ignorando os embates que se desenrolaram ao redor da mesa.
— Eu disse, não disse? Eles foram coordenados por um grupo de humanos, e não eram ladrões comuns. Pelo que parece, essa organização já existia há muito tempo, e só agora eles começaram a mostrar a cara.
Dolores não poupou palavras.
— Tem certeza? Uma organização dessas, e ninguém ouviu falar?
— Profissionais como esses não aparecem todo dia, então acho que sim. — Fernando respondeu com um leve sorriso, claramente convencido da gravidade da situação.
Eleanor se inclinou para frente, cética.
— Você fala para não mexermos com eles, por quê? Duvido que com nossa força não poderíamos acabar com esses animais.
Fernando manteve-se impassível, seu olhar distante como se visse algo que os outros ainda não conseguiam compreender.
— Primeiro, porque eu quero esperar e ver mais movimentos desse pessoal da ‘Corrupt’. O comandante deles, chamado Zero, coordenava as tropas de feras. Vamos esperar suas ações, ver como ele age. Além disso, com a ajuda do lorde da cidade, as feras da floresta criaram uma cidade própria.
O impacto das palavras de Fernando foi instantâneo. A sala parecia respirar por um momento.
— Uma cidade?! Isso… isso é novo… — murmurou Eleanor, incrédula.
Mas Fernando não parou.
— Não é só isso, eles assinaram um tratado com o reino de Xellivia, um tratado de não agressão. Talvez o rei de Xellivia esteja pensando em usar essas feras como uma arma, caso surja uma guerra entre reinos.
A sala ficou em silêncio. Todos pareciam digerir a magnitude das palavras de Fernando.
Foi Safira, sempre tão impetuosa, quem quebrou o silêncio.
— Então essas feras mágicas agora têm seu próprio terreno para morar, livres de ataques humanos… Isso é muito…
Ela parecia maravilhada com a ideia. Para ela, os animais eram mais do que simples criaturas. Eram uma paixão, uma obsessão.
— É incrível! Não acham!? Eles estão evoluindo cada vez mais! Não seria admirável um dia termos um país de feras? — a animação dela era inegável, mas para os outros, sua visão parecia, no mínimo, bizarra.
— O que?! Está louca, Safira?! — Dolores disparou, mas Safira estava além da razão, embriagada por sua própria excitação.
— Louca? Eu amo as feras! Estudar sobre elas, aprender sobre elas! — ela respondeu com um brilho nos olhos.
Mas Dolores, já farta, interrompeu a conversa.
— Não ouviu o que o Fernando disse?! Temos que esperar e ver os movimentos do líder da organização humana!
Fernando, com calma, confirmou.
— Sim, todos da ‘Corrupt’ usam máscaras e são extremamente habilidosos. Acho que esperar antes de agir é a melhor opção.
A discussão seguiu para outro ponto, mais inesperado do que os anteriores. Dolores, com uma expressão preocupada, voltou para Fernando.
— Me diz, Fernando, o reino de Xellivia pensa assim? Você falou sobre tomar medidas, o que você acha que eles vão fazer?
Fernando respirou fundo, preparando-se para revelar algo ainda mais incomum.
— Bom, eu não tenho certeza. Mas vindo do rei deles, talvez eles não façam muita coisa. Aquela região não leva a sério bandidos sem fama, mesmo vendo a força em primeira mão. Talvez tomem algumas medidas, mas duvido que façam qualquer movimento agora.
Dolores, aliviado, murmurou para si mesmo.
— Isso é bom. Assim, temos tempo para ver o quão habilidosos eles realmente são.
Mas Fernando não parecia interessado em descansar. Ele já estava preparado para a próxima revelação.
— Sim, agora vamos para o segundo tópico da reunião.
Todos se olharam, tentando entender o que mais poderia vir.
— Sobre o que seria? — perguntou Eleanor, com um tom curioso.
— Luke.
Os olhos de todos se fixaram em Fernando. A menção daquele nome era como um peso na sala.
— L-Luke? Não entendo… — Dolores tentou entender o que aquilo significava.
— Esse garoto é extraordinário. Não podemos mais fazer vista grossa para isso.
— Luke? Esse não é o seu protegido talentoso, Dolores? — Safira questionou, sem entender o que aquilo significava para a reunião.
— Sim, é ele mesmo… Não entendo, o que tem Luke?
Fernando falou com a convicção de quem já havia decidido o destino de todos.
— Quero que ele se torne o guardião do nosso país.
A sala explodiu em um clamor.
— O QUE?! — Exclamou Eleanor, incrédula.
— Tem certeza?! Ele só tem dez anos! — Dolores também não podia acreditar.
— Um garoto? O guardião de um país inteiro? — Safira murmurou, atônita.
Fernando, no entanto, não vacilou.
— Ele é poderoso, é talentoso. Se demorarmos para usá-lo, talvez percamos a chance.
— Que chance? Ele só tem dez anos! Não está preparado para isso! — Dolores retrucou, indignado com a ideia.
Mas Fernando, com uma calma implacável, respondeu.
— Está mais que preparado, Dolores. Este reino, não. Este país precisa de uma reestruturação. Eu andei de olho nele. Ele pode ser a pessoa que o nosso reino… talvez nosso país precise.
— Não entendo… que tipo de mudanças você quer implementar em nosso país? — ele questionou, a incerteza em seu tom evidenciando o quanto a situação estava se tornando cada vez mais complexa.
Fernando, no entanto, apenas sorriu. O sorriso não era de prazer, mas de um entendimento profundo, como se ele soubesse algo que ninguém mais sabia.
— Kukuku… Eu irei contar, mas antes, saibam que isso pode causar uma confusão em um primeiro momento. Mas isso… é pelo futuro da humanidade!