Guerra de Deuses - Capítulo 12
— Quem é você? Responda logo. — A lâmina cortou um pouco o pescoço fino do rapaz.
— Se acalma! Eu só vim conversar — Ele levantou ambas as mãos e se afastou um pouco da lâmina. — Você é nervosinho, hein.
Arskan continuava com a espada apontada na direção dele. Era um jovem um pouco mais baixo que ele, tinha um grande sorriso amarelo, um rosto bobo de playboy e um amontoado de cabelos amarelos, mas não eram totalmente; estava mais para aqueles surfistas que pegavam sol de mais e os cabelos descoloriam.
O jovem usava roupas comuns; camisa branca, calça. A arma que escolheu, porém, era um diferencial. Um arco e um aljava cheia de flechas.
Um único detalhe no rapaz chamou a atenção de Arskan. Os olhos dele eram estranhamente afiados como o de uma águia.
— Não vou perguntar outra vez. Quem é você?
O desconhecido reconheceu que Arskan não estava para brincadeira. Engoliu seco e finalmente deu uma resposta.
— Me chamo Kyler. Eu só vim fazer companhia.
— Companhia? — Arskan não queria companhia. Achava irritante lidar com as pessoas; ainda mais aquelas que ele provavelmente nunca mais veria.
— É. Você é o único aqui que parece que não vai surtar e ter um treco. Eu cheguei perto de um cara e ele se mijou todinho.
Arskan nem prestava mais atenção ao rapaz.
Ele olhou para a carne e começou o preparo. Como não tinha sal, que era algo quase indispensável, precisou usar a pasta como condimento.
O sabor não seria dos melhores, mas a grama ainda daria um bom tempero. Caso conseguisse preparar com maestria, ajudaria até a aumentar um pouco o seu vigor.
Observou o tempero adentrar à carne até ela ficar macia e moveu as mãos ao fogo enquanto fingia prestar atenção a ladainha do rapaz.
Iniciou o processo de assar devagar. Ele girava o galho com o grande pedaço calmamente. Era importante que todos os lados cozinhassem bem.
Ele se concentrou no processo o tanto que se concentrava em batalha. O ritmo continuo continuou até que uma fragrância começou a exalar.
Kyler parou de tagarelar como uma matraca e seus olhos ficaram paralisados no processo repetitivo de Arskan.
O perfume se espalhou pela Clareira Branca inteira e os olhos e narizes se viraram em direção ao centro.
Porém a alegria daqueles olhos durou pouco. Viram quem preparava a carne e imediatamente desistiram de qualquer pensamento de pegar um pedaço.
No entanto isto não os impedia de babar e engolir em seco se imaginando devorar o que estava ali.
Arskan estava tão concentrado que nem jogou que, outra vez, tornou-se o alvo de olhares selvagens e invejosos. A carne era seu objetivo e nada tiraria sua atenção dela.
Conforme se passou mais um tempo, a carne estava completamente dourada e um som ressoou quando os sucos da carne tocaram a chama ardente.
Arskan piscou um par de vezes e proclamou:
— Está pronto!
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Cortou um pedaço satisfatório com a espada. O perfume contido vazou ainda mais.
Passou a tarde inteira em busca daquela gostosa e suculenta fatia de êxtase.
Agora, finalmente, receberia sua recompensa.
Arskan abriu a boca, mas foi interrompido por um grito.
— Nossa! Isso é bom demais.
— Hã?
Olhando para o lado, viu Kyler já devorando um grande pedaço da carne do Touro.
— Isso é a coisa mais gostosa que comi na vida. Falta um pouco de sal, mas ainda assim.
Arskan estava faminto demais para ficar com raiva. Decidiu comer logo sua parte antes que esfriasse.
Imediatamente uma mensagem ressoou.
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+1 Ponto Vigor
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Ficou satisfeito com a surpresa agradável. O crescimento das suas estatísticas era muito retardado, então ganhar um ponto apenas por comer era um presente dos céus.
Logo terminaram de comer. A carne que Arskan achou que duraria dias foi consumida em poucos minutos.
Ele voltou seu olhar para o rapaz que agora deitava no mármore com a barriga para cima.
— Moleque, qual o seu nome mesmo? — Já havia esquecido do nome dele. Aproveitou para chutá-lo levemente.
— Ei! Pare! A minha barriga dói… Meu nome é Kyler. Eu já disse isso a você.
— Sim, mas você não disse o que quer.
Kyler olhou para o rosto de Arskan e achou que ele fosse um idiota.
— Eu também já te disse porque vim aqui.
Puxou a espada outra vez e colocou no pescoço do rapaz.
— Acha que vou acreditar naquilo?
— É sério! — exclamou levantando as mãos em sinal de que era inofensivo. — Eu não fui claro, mas quero lhe fazer companhia por duas razões. Primeiro pela carne…
Uma veia surgiu na testa de Arskan e ele ergueu a espada pronto para atacar.
— Acalme-se! A segunda razão é segurança. Estou sendo sincero.
Escutando-o, decidiu abaixar a espada e se sentou outra vez. Viu que o garoto não era tão burro como pensou.
— Então, acha que vai ficar mais seguro comigo? Acabei de colocar uma lâmina na sua garganta.
— Acho sim. — Ele tinha um olhar convicto. — Eu não tenho nada que você queira, porém tenho muitas coisas que os outros querem. Pessoas são loucas, você sabe.
— Hm… — A sinceridade do rapaz não tocou Arskan, mas ele conseguia entender. — Você foi um dos dez melhores?
— Fui sim. Por isso sei seu nome, Arskan, o primeiro colocado.
Kyler levantou a mão para um cumprimento; Arskan retribuiu. Ambos sentiram as mãos calejadas do outro.
O rapaz já tinha noção disso, mas Arskan teve um certa surpresa ao toque. Para ter mais assim, era necessário passar por um treinamento intenso.
— Você é livre para ir e vir, não posso impedir, mas não espere que eu o ajude — falou Arskan.
Kyler abriu o largo sorriso. Para ele era suficiente dormir próximo dele.
Arskan pegou suas coisas e deitou-se. Ele tranquilamente dormiu no chão de pedra branca.
As pessoas na Clareira Branca ficariam tão nervosas que a grande maioria nem pisca rua os olhos à noite.
Kyler seguiu o exemplo e também se deitou em uma distância relativamente próxima.
Um pequeno grupo saiu da floresta carregando vários feridos. Uma mulher acompanhava o grupo e exclamava enlouquecida.
— Isto é o inferno! O inferno! — dizia.
Agnus também estava no grupo. Ele não deu atenção para a mulher e apenas passou por ela sem nem olhar no seu rosto.
“Fraca…”
Carregava um grande animal nas costas; um antílope parecido com um cervo. Logo atrás seguiram outras três pessoas.
Dois homens altos e uma mulher bonita.
— Ela endoidou de vez, Agnus — contou a mulher.
— Não podemos fazer nada. Deixe-a. Vamos levar carne para a Natália.— O estresse lhe fazia mostrar sua verdadeira face.
Os três que o seguiam se olharam, mas decidiram interpretar aquilo como apenas o cansaço.
A noite dentro da mata era algo assustador.
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Na manhã seguinte, Arskan levantou bem cedo assim que o sol raiou no céu. Ele levantou, colocou a mochila nas costas e chutou o ainda dormindo Kyler.
— Hã? O que foi? Você acorda com as galinhas, hein — resmungou.
— Em breve a próxima onda vai começar. Prepare-se.
— Assim tão cedo?
— Sim. Assim tão cedo.
Arskan escutou Kyler reclamar por mais um dúzia de segundos e o deixou por ali, seguindo para perto da floresta.
Ele sentiu a mana se propagar, o silêncio da floresta profunda assombrar e um calafrio descer pelo corpo.
Olhou rapidamente para as pessoas. Olhares vazios e vidrados. “Não devem ter pregados os olhos durante a noite”, pensou ele.
Logo Kyler surgiu atrás dele e um segundo depois virou-se para a floresta.
— Deve começar agora…
Ouviu-se o farfalhar das plantas, passos, grunhidos e gritos mórbidos, além de corpos sendo arrastados.
As criaturas esverdeadas surgiram da mata outra vez.
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2° Onda: Vingança dos Goblins
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