Entre Neve e Cinzas, As Memórias Daquele Amor Doentio Permanecem - Capítulo 80
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- Capítulo 80 - Mas afinal, quando este inferno irá acabar? (1/2)
3º Dia
03h14
Um minuto.
Assim como ocorreu nas minhas tentativas passadas, o cadáver da garota que envenenei a bebida será encontrado por sua colega de quarto. Basta esperar que o seu susto ressoe em um forte grito para chamar a atenção de todos os dormitórios deste andar.
Esta é a forma mais eficiente que eu encontrei para agir sem levantar suspeitas. Como Manabu e Shou não descolam da minha órbita em condições normais de temperatura e pressão, resta-me utilizar de um pequeno caos para ganhar abertura e a partir de então o caos irá se retroalimentar mais e mais.
Uma pequena perturbação é mais do que o suficiente para desestabilizar tudo.
Como premeditado, escuto um grito de pavor.
Assim como meus colegas, levanto-me bruscamente.
— Que susto! O que foi isso?!
— De onde veio esse grito?!
— Vamos ver o que foi isso! — um deles vai em direção ao corredor.
Naturalmente, Takashi irá contrariar esta reação inesperada, afinal as ordens da Mikoto são absolutas, não podem ser contrariadas.
— Ei, esperem aí! Não foram autorizados a sair. Eu irei checar o que houve — tenta bloquear a saída.
Não seja prepotente, a sua posição como vice-presidente não diz nada. Você não esbanja nenhuma autoridade sobre os outros. Se fosse a própria Mikoto, a história seria diferente, ela representa uma aristocracia natural, enquanto você é apenas um farsante.
A pressão dos meus colegas forçam Takashi para fora da sala, e então todos seguem em direção ao dormitório feminino onde ocorreu o incidente.
— Manabu, Johann, vamos ver o que aconteceu! — exclama Shou enquanto corre para fora da sala.
— Espere, Shoucchi!
Ainda tenho algum tempo até que eles notem a minha ausência. A sala de aula está esvaziando rapidamente até sobrar somente um colega que termina de se arrumar.
Atrasar-se é definitivamente algo problemático, por isso prezo tanto por manter a minha pontualidade. Este caso é, sem dúvidas, um excelente exemplo do quanto se atrasar pode ser algo ruim.
Caminho em sua direção enquanto puxo a lâmina escondida em minhas calças.
O alcançando, puxo a sua cabeça pelos cabelos para trás e rapidamente corto a sua garganta. Assim, o seu corpo cai no chão sem condições de gritar.
Em seguida, limpo a lâmina nas próprias roupas da minha vítima e deixo o dormitório o mais rápido possível.
Corro em direção ao dormitório feminino e me disfarço no meio da multidão.
…
Conforme constatam o que aconteceu, a aglomeração começa a se dispersar, de modo que é só uma questão de tempo para encontrarem o corpo ensanguentado no nosso dormitório. Em meio a esta confusão, ninguém deve ter notado que eu fui o último a sair de lá.
— Bem, já vimos que a Miyucchi está bem. Então vamos voltar? Não há nada que possamos fazer aqui — diz Manabu.
Se minhas estimativas estiverem corretas, dentro de quinze segundos, terei uma nova brecha para agir.
Volto meu olhar para Mikoto que está conversando com Keiko, Takashi, Haruki e outros alunos subordinados ao conselho estudantil.
Desta vez… será que desta vez eu conseguirei finalizar este jogo de uma vez por todas? Centenas de tentativas, e ainda prossigo voltando para o ponto de partida. Mas não me resta alternativa senão tentar de novo, de novo e de novo.
Ailiss e Mikoto precisam se tornar aliadas, e eu preciso ser morto. Este é um fim que não pode ser alterado, é algo que jamais posso desistir, não posso voltar atrás sobre nenhum pretexto.
Um estudante apavorado surge no ambiente e exclama.
— O Hiro! Mataram o Hiro!
A atenção do conselho e da multidão volta-se para o rapaz, e o clima de tensão se intensifica ainda mais. Novamente, aproveito-me da situação para deixar o local sem levantar suspeitas.
Esta morte, um tanto mais impactante quanto um mero envenenamento é mais do que o suficiente para começar a aflorar o pavor alheio de ter um assassino no bloco, bem como criar desconfiança entre si.
Desço as escadarias e vou até o disjuntor para dar continuidade ao meu show. Já fiz todos os preparativos, e agora basta derrubar a energia elétrica de forma permanente.
Corto a energia danificando o disjuntor para que não possa ser religado, deixando todos na escuridão.
Posso ouvir o grito de pavor das garotas.
Com isso, gerei um caos dentro do reinado de Mikoto, o passo seguinte é atrair Ailiss para dentro do bloco. Das minhas experiências passadas, pude constatar que só há uma forma de atraí-la sem um contato direto, isto é, roubando um pertence seu.
Caminho até uma sala de zeladores e pego a sua metralhadora que furtei durante a tarde. Dou dois disparos no teto e deixo o local.
…
A escuridão por um lado me dá a vantagem de matar sem ser visto, porém também é um problema para mim. Neste sentido, guardo a metralhadora em um novo local e volto a me camuflar na multidão que está cada vez mais ingovernável.
— O assassino ainda pode estar dentro do bloco, então vos peço que evitais andar a sós pelos corredores sem um acompanhante do conselho, especialmente à noite — discursa Mikoto em frente às janelas para aproveitar da pouca iluminação externa — Verificaremos a possibilidade de instalar os dormitórios em outro bloco que possua energia elétrica.
Os estudantes usam seus celulares como lanterna e frequentemente voltam as luzes para os longos e escuros corredores.
Logo, Ailiss toma a mesma medida que eu e se integra a aglomeração, noto a sua inquietação em buscar o responsável pelo furto da sua arma.
A minha prioridade agora é me livrar do vice-presidente problemático.
…
Aproximo-me do local onde Mikoto está passando as ordens e escuto ela falar com Takashi e Haruki.
— Hasegawa-kun, com um bloco secundário selecionado para a implantação dos dormitórios, leva algum reforço e mantenha a vigilância constante para que o assassino não repita o mesmo procedimento. Enquanto isso, Tanaka-kun, poderias inspecionar o que de fato ocorreu? Talvez tenhamos alguma evidência do paradeiro do responsável.
— Entendido. Cumprirei as suas ordens o mais rápido possível — replica Takashi.
Sem nenhuma nova distração, eu não vou conseguir segui-lo sem levantar suspeitas tão facilmente. Alguém certamente notará se eu deixar o local sozinho, neste sentido a maldição dos três me orbitando veio bem a calhar.
— Ei, Shou, sabe que oportunidade você tem aqui? — sussurro em seu ouvido.
— Oportunidade? Não vejo nenhuma oportunidade tendo um assassino a solta.
Ora, até que você possui um mínimo de sensatez.
— Garotas gostam de caras corajosos, não?
Ele fica pensativo por alguns segundos e responde.
— De certa forma sim, mas se eu não voltar vivo não terá sentido eu bancar o corajoso.
— Podemos dar uma pequena explorada no andar e dizer que descemos até o térreo. Ninguém estará lá para saber o quanto nos arriscamos, e podemos levar o Manabu junto.
— Boa ideia! — abaixa o tom de voz — Bem, mas por que você quer fazer isso? Há alguma garota que queira impressionar?
— Pode se dizer que sim.
Mas o sentimento que pretendo causar nestas garotas não é bem o que você está imaginando…
…
— Shoucchi, você realmente acha que isso é uma boa ideia? — Manabu fala tremendo.
— É claro que é! Alguém precisa fazer o trabalho sujo e garantir a segurança de todos!
— Se você está dizendo…
— Garotos, ainda acho que isso é muito perigoso — diz Miyu.
— Não se preocupe, Miyu-chan, estarei ao lado deles. O assassino jamais ousaria enfrentar alguém como eu!
Alguns nas proximidades olham para Shou com desaprovação. Excelente, ninguém irá desconfiar de um grupo de idiotas.
Caminhamos pelos corredores, e a luminosidade decai conforme nos afastamos da multidão. Viramos à esquerda, e prosseguimos em silêncio.
— Será que já foi o suficiente, Jocchi?
— Se vocês quiserem parecer legais, teremos que demorar um pouco mais.
— Podemos esperar por aqui, né? — diz Shou.
— Sim, funcionará do mesmo jeito.
Deixo-os distraídos por algum tempo enquanto divago em meus pensamentos sobre os acontecimentos destas centenas de repetições nas quais estive preso.
Há sentido em continuar forçando os meus ideais sistematicamente a esta realidade? Não seria este jogo uma negação direta aos meus desejos e a minha pessoa? Bem, a minha vontade não é minha escolha, sequer sou livre para escolher salvá-las ou não. Salvar Ailiss e Mikoto simultaneamente é um fato que cumprirei enquanto estiver vivo e ciente da minha vontade.
…
Já deu a hora de me livrar dos dois.
— Ei, vocês ouviram isso?
— Ouviu o quê?! Não me assuste, Johann!
— Escutei algo no corredor ao lado, vamos verificar.
— Isso não vai acabar bem… — murmura Manabu.
Seguimos até o cruzamento com o outro corredor e paramos para observar o meu falso alerta.
— E então? Quem vai espiar? — pergunta Shou suando frio.
— Deixe, comigo — dou dois passos e acendo a lanterna do meu celular.
Olho primeiramente para a esquerda e em seguida para direita. Neste instante, forço uma expressão de surpresa no meu rosto enquanto gesticulo para que Shou e Manabu fiquem parados.
— O q-que foi Jocchi? — gagueja Manabu.
— Eu vi algo se movendo lá. Vamos verificar.
— Acho que já deu por hoje. Não acha, Manabu? — Shou ri de nervoso enquanto puxa Manabu para a sua recuada.
— É realmente… — também dá meia-volta.
Agora basta colocar um pouco mais de lenha na fogueira.
Aproximo-me sorrateiramente das suas costas e os agarro enquanto dou um forte urro.
Ambos gritam e saem correndo devido ao susto que levaram.
— Socorro!
— O assassino está atrás de nós!
Ninguém irá levar os patetas a sério. Agora preciso encontrar o paradeiro daquele nojento e matá-lo mais uma vez.
…
Verificando o disjuntor? Uma decisão bastante racional, mas não há condições de consertá-lo. O meu instinto para matar se tornou muito mais aguçado em comparação ao nosso primeiro confronto. Ainda sou completo amador comparado a Ailiss, mas posso dar conta de um verme como Takashi sem nenhum problema. É o que venho fazendo há centenas de repetições.
Aproximo-me dele com passos lentos e sem propagar nenhum ruído. Suavemente retiro a faca que escondo no bolso e a agarro com meus dedos.
Prossigo em sua direção, controlando ao máximo a minha respiração para ocultar totalmente a minha presença neste escuro corredor. A única coisa que não consigo controlar é a minha frequência cardíaca, pois a ansiedade de me livrar dele é algo que jamais cessa na minha mente.
Ao menos posso descarregar minha frustração de repetir todos estes eventos neste infeliz.
Repito o mesmo procedimento de sempre, passando a lâmina em sua garganta para que não grite. Porém, diferente dos demais, Takashi é um alvo que necessito ir um pouco além.
Ele cai no chão e começa a se afogar no próprio sangue.
Mantendo cuidado para que o sangue não respingue em meu uniforme, prossigo com fortes punhaladas em seu corpo para descontar toda a negatividade impregnada na minha mente.
Esfaqueio.
Esfaqueio.
Esfaqueio.
Em silêncio, por alguns segundos observo seu corpo desfigurado e então deixo o local.
Com a morte de Takashi, conseguirei aumentar ainda mais a paranoia. Ailiss e Mikoto estavam no mesmo local, sei que inconscientemente podem suspeitar uma da outra e com um assassinato ocorrendo desta forma, poderei inocentá-las.
Na perspectiva delas haverá outro inimigo. Nada muito diferente do que fiz até então. Depois de tantas vezes realizando este tipo de ação, isso se torna bastante intuitivo para mim.
Ademais, necessito garantir a sua aliança. Garantir que criem vínculos entre si. Garantir que não façam mal uma à outra após a minha morte.
Todavia, será que agora conseguirei cumprir estes desconhecidos requisitos para os demônios?
7º Dia
18h47
— Parabéns a vocês duas. Não pensei que conseguiriam me derrotar desta maneira, acho que não tenho mais escolhas senão…
Diante de seus olhos arregalados, levanto minha mão até a cabeça e puxo o gatilho do revólver.