Entre Neve e Cinzas, As Memórias Daquele Amor Doentio Permanecem - Capítulo 67
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- Capítulo 67 - Assim, ele, ela e ela tomam seus rumos. (1/2)
17h34
Ao que tudo indica, Miyu ficará calada. Então por hora não precisarei me preocupar com isto.
O correto a se fazer era eliminá-la logo em seguida, porém ainda sofro um pouco de hesitação em relação a pessoas muito próximas como ela e provavelmente em relação àqueles dois. Se eu puder escolher, prefiro não colocá-los no meio dos meus problemas.
Caminho pelo bloco principal e já posso ouvir murmúrios a respeito da morte de Keiko. Provavelmente todos estão desesperados, pois os membros da alta cúpula estão sendo um a um eliminados.
Indiretamente isto causa um afastamento de possíveis aliados para ela. Visto que os maiores opositores são assassinados, quem gostaria de colocar-se em risco?
Bato na porta do conselho estudantil. Aguardo por alguns segundos, mas como não obtenho respostas a abro lentamente.
Está lá Mikoto pensativa com uma das mãos na testa. Logo ela percebe a minha presença e começa a me encarar em silêncio.
Pelo visto, o humor dela ainda não melhorou em relação a mim.
— Podemos conversar? — pergunto.
— Não te dei permissão para vir até aqui. Vá embora — desvia o olhar.
É… Definitivamente não melhorou. Mas com o palco montado, posso muito bem reverter esta situação.
— Claramente você já está ciente do que aconteceu com Keiko. Assim, tecnicamente só sobrou você para comandar o corpo estudantil. Seja sincera, não há como continuar insistindo em lutar sozinha. Desta maneira irá apenas se afundar mais e mais.
— Eu darei um jeito. Sempre pude lidar com meus problemas por conta própria e não será agora que precisarei me rebaixar a cooperar contigo — arruma uma mecha do cabelo.
Não é nada fácil lidar com alguém orgulhosa como ela.
— De fato. Você sempre pode lidar com eles, isso porque sempre tomou a decisão mais sábia, porque sempre agiu racionalmente. Mas não está agindo neste caso. Está mais que óbvio que você não conseguirá segurar as pontas estando sozinha.
Ela então fecha os documentos que estava olhando e volta a fixar seus olhos afiados e gélidos para mim.
— Johann, diga-me, o que tu queres de mim? Apenas jogar na minha cara que perdi o controle da escola? Se for isso, eu já entendi a tua observação, não preciso de nenhum conselheiro genial para me explicar o óbvio. Então me faças o favor de deixar eu me concentrar no trabalho.
— Atrapalhá-la seria a última coisa que eu faria, muito pelo contrário, estou aqui porque quero ajudá-la, somente isto. Então peço que reconsidere a nossa aliança. É a única forma de todos sairmos daqui com vida, inclusive você. Se continuar insistindo em trabalhar sozinha, as coisas não vão acabar nada bem.
— Tu só podes ter enlouquecido. Ela é uma assassina, provavelmente é a responsável pela morte de todos… Como ousas propor que eu coopere com alguém que há poucos dias tentou me matar? Só posso concluir que tu és um cúmplice imundo dela.
Aparentemente também precisarei recorrer à mentira do quarto jogador para Mikoto. Devo então atingir o seu emocional, primeiramente o medo.
— Posso assegurar que Ailiss não é a culpada. Como deve ter percebido este jogo não é normal. Graças a minha sensibilidade adquirida recentemente, suspeito que exista um quarto jogador e este seja o responsável por esta série de mortes. O maior problema nisso tudo é que provavelmente ele possui habilidades muito superiores a minha clarividência, por isso preciso da cooperação de vocês duas. Caso contrário, ele matará a todos nós.
— Poupe-me, são apenas informações jogadas ao vento. Tu tens ao menos uma evidência disso? Caso contrário, nossa discussão acaba por aqui.
Como Mikoto não participou de outros rituais, ela não consegue fazer um paralelo tão bem quanto Ailiss. É natural que esteja mais desconfiada a respeito desta suposta estranheza. No entanto, apenas o fato dela não ter percebido a minha mentira já é um grande avanço. Acredito que esteja tão abalada que não consegue mais se concentrar a ponto de enxergar por trás de minhas máscaras. Ou talvez, em meio ao desespero, esteja inconscientemente querendo acreditar. Novamente só preciso abusar do viés de confirmação.
— Não. Tenho apenas a minha palavra… e a minha determinação em salvá-la.
— Mesmo que seja verdade… o que eu ganharia com isto? Estaria apenas adiando minha morte ao cooperar com ela. Assim que tiver uma chance, nas próprias palavras dela, serei morta — suspira — Tu realmente és um completo insensível e estúpido ao me sugerir isto.
— Ailiss disse o que disse por estar obsessiva com sua vingança aos conjuradores de magia negra, entretanto consegui a convencer de não matá-la. Não precisa mais se preocupar a respeito disso, ela já a aceitou como uma aliada.
— Foi convencida de não cometer um assassinato? Realmente, um exemplo de redenção. Deveríamos parabenizá-la de alguma forma por tal conquista?
Tudo bem, após apresentá-la a um inimigo em comum. Posso então tocar numa questão emotiva pessoal.
— Mikoto, em horas como esta, o melhor a se fazer é engolir o ressentimento e aceitar esta proposta. A sua sobrevivência depende disso. Talvez você coloque algum ideal acima de si, mas tenho certeza que a sua vida vale muito mais do que isso. Se não fosse o caso, ela não teria se sacrificado por você naquela noite.
Mikoto arregala os olhos e vira o rosto surpresa com minhas palavras.
A mesma estratégia funcionou.
— Como tu ficaste sabendo daquele evento?
— Você me contou. Em um futuro no qual, Ailiss, você e eu conseguimos derrotar o quarto jogador. Novamente, te pergunto, irá nos ajudar?
— Tudo bem, uma trégua estratégica não me parece tão má ideia devido às circunstâncias atuais — suspira e fita-me — Irei cooperar convosco.
18h18
Depois de finalmente conseguir convencer a Mikoto a cooperar com Ailiss, retorno ao esconderijo e notifico a ela que iremos marcar uma nova conversa.
— Desta vez vamos fazer a reunião lá? Há algum motivo para isso? — Ailiss pergunta desconfiada.
— Sim, por alguma razão ela não simpatizou muito com o seu esconderijo — comento enquanto encaro os entulhos pelo chão.
Uma decisão bastante válida considerando este ambiente.
— Preferia conversar por aqui para não correr o risco de cair numa emboscada, no entanto compreendo o que você quis dizer.
— Até que você anda ficando mais tolerante… o que aconteceu?
— É só impressão sua, pois já estou impaciente com a sua demora — atravessa rapidamente o mar de entulhos.
Deixamos o esconderijo e caminhamos até a sala do conselho no bloco principal. Dou duas batidas na porta e a abro logo em seguida.
Apesar de ter conversado previamente com cada uma delas, e ambas terem aceitado trabalhar em conjunto, o clima inevitavelmente fica tenso no instante em que as duas passam a ocupar o mesmo ambiente. Felizmente as palavras de Mikoto quebram este mal estar que havia surgido entre nós.
— Por favor, sentai-vos — diz Mikoto.
Ailiss e eu caminhamos até as cadeiras em frente à mesa da presidente e nos sentamos de frente para ela.
— E então, Mistkerl? Vai nos falar sobre o quarto jogador? — Ailiss vira-se para mim e pergunta.
Como o esperado, ambas querem ir logo para o assunto técnico e evitar ao máximo qualquer interação, afinal do ponto de vista delas isto está mais para um pacto de não agressão do que para uma aliança propriamente dita.
— Ah, sim — ajeito-me na cadeira — Não sei se você está ciente disto, Mikoto, mas para Ailiss que já participou do jogo em outras ocasiões, ficou evidente pela proclamação via alto-falantes que este jogo possui propriedades diferenciadas. Ou melhor dizendo, propriedades adulteradas.
— Realmente não participei, entretanto eu também pude perceber que há algo errado. Os anciãos do templo nunca haviam sequer mencionado a possibilidade de acontecimentos bizarros como estes. Até então presumi que isso fosse ação de um de vós.
— Pois bem, se ambas estão cientes disto. Não há mais nada para eu declarar — cruzo os braços.
— Mais nada? Então qual foi o intuito de tu marcares esta reunião? Estás de gozação com a minha cara? Em plena esta crise tu fizeste-me perder tempo? — protesta Mikoto acompanhado de um olhar gélido.
— A verdade é que eu também não sei muito a respeito. Como já expliquei a vocês duas anteriormente, minha premonição não é absoluta. Então é só isso que posso informá-las precisamente até aqui, há algo ou alguém jogando isto conosco e certamente é o responsável pelas mortes de hoje — suspiro — ademais, reuni as duas para que conversassem entre si. Preciso que ambas estejam de certa forma resolvidas para tornar o nosso trabalho em equipe mais produtivo — levanto-me e me escoro na parede.
— Trabalho em equipe? O seu idealismo é incrível, chega a ser risível — comenta Ailiss.
Mikoto suspira e fala.
— Faço das tuas palavras as minhas. Mas como já estamos reunidas aqui, acredito que possamos trocar alguma informação relevante visto que o Johann sequer se demonstrou capaz disto.
Ironicamente o ponto de união das duas acabou sendo me desmerecer. No entanto, desde que funcione, acho que não posso tecer reclamações sobre isso.
— Eu gostaria de perguntá-la como usuária de magia negra, você acha que isto é explicável? Do ponto de vista de uma caçadora, desconheço qualquer teoria que possa justificar esta anomalia.
— Acredito que não seja impossível reestruturar a conjuração de uma terceira pessoa. No entanto, é uma conversa muito diferente quando se trata de uma magia milenar como esta. Imagino que se necessitaria de uma magia proveniente de um pacto ainda mais forte do que esta, mas qual contrato seria mais poderoso do que um com a própria Morte?
— Compreendo. Então na perspectiva de uma conjuradora, isto também falta de explicações. Pelo visto, estamos na mesma situação, é um beco sem saída.