Entre Neve e Cinzas, As Memórias Daquele Amor Doentio Permanecem - Capítulo 65
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- Capítulo 65 - Logo, um a um irá cair. (1/2)
09h34
Devido ao incidente desta manhã, inevitavelmente o conselho precisou reunir os estudantes de todas as turmas no saguão da escola para discutir o que seria feito.
Neste momento, a presidente Yukihara Mikoto está à nossa frente discursando sobre possíveis medidas que serão tomadas para evitar que outro incidente assim ocorra.
— Acerca disso, também peço para que crieis hábitos de segurança, como evitar andar sozinho pela escola. Bem como reportar a mim qualquer atividade que pareça suspeita por parte de terceiros — explana serenamente.
Ela até que está se saindo bem… imaginei que apenas um incidente não seria o suficiente para transtornar a soberania do conselho estudantil, todavia isto foi apenas o começo. A verdadeira queda dela ocorrerá quando falhar em cumprir as promessas que estabeleceu agora, da mesma forma que aconteceu das outras vezes.
Longe de eu querer prejudicá-la, estou fazendo isso tudo pelo seu bem. Afinal, eu sei o que é o melhor para as minhas duas amadas mais do que ninguém, sei mais até do que elas próprias.
Durante o discurso, Keiko surge com o rosto espantado, caminha até Mikoto e cochicha algo em seu ouvido. Instantaneamente os olhos de Mikoto ficam arregalados.
Vocês o encontraram, não encontraram?
Eu não fiz questão de esconder muito bem o corpo daquele importuno, mas até que vocês o acharam mais rápido do que eu imaginava. Durante o ato ainda não tinha este plano em mente por estar bastante conturbado com meu primeiro assassinato, mas algo em mim já parecia dizer que seria útil que isto viesse à tona alguma hora ou outra.
Vejo que Haruki também está muito incomodado com esta descoberta. Acho que posso me aproveitar disso para confirmar algumas coisas. Dependendo do quanto de informação estiver disposto a transparecer, irá revelar se a Mikoto já declarou publicamente um rompimento comigo. Não acho que tenha descartado a possibilidade de me usar tão facilmente assim.
— Ei, há algo de errado? — aproximo-me de Haruki.
— Ah, Johann-san. Como você está vendo, hoje não é um dos melhores dias para a gente — replica cabisbaixo e com um olhar cansado.
— Não consigo nem imaginar o quanto estressante deve estar sendo ter que tomar tamanha responsabilidade nesta situação. Porém, não é disso que eu me referia… — abaixo o tom de voz — o que foi que ela falou para a Mikoto? Por que vocês estão tão assustados?
— Então você notou isso? Peço, por favor, que não divulgue isto, pois poderá gerar pânico em toda a escola. Mas como você e outros estudantes já devem ter percebido, o vice-presidente Tanaka-senpai desapareceu ontem à tarde — pausa para respirar — Então hoje cedo a Kaichou orientou Keiko para ir atrás do paradeiro dele e encontrou algo que mal poderíamos imaginar.
— Sim, de fato eu estranhei que ele não apareceu no dormitório ontem. O que aconteceu com ele? Não vá me dizer que ele está envolvido no incidente de hoje cedo?
— Não, muito pelo contrário, ele também foi uma vítima. A informação por meio da Keiko acaba de chegar a mim, logo não tenho muitos detalhes do ocorrido, mas pelo que constam os relatos, o corpo dele foi encontrado dilacerado. Não sei se terei coragem de ver o rosto de um antigo companheiro neste estado.
— Compreendo. Não sei nem ao menos o que pensar. Por mais que não tivéssemos proximidade, é duro saber que alguém que estava trabalhando ao seu lado desapareceu desta vida. O causador deste crime hediondo precisa pagar por suas ações.
— Sim. Eu, a Kaichou e o restante do conselho não descansaremos até capturá-lo para que a justiça seja feita.
Sinto lhe dizer, mas isto não acontecerá.
— Digo o mesmo. Caso você ou a Mikoto necessitem de ajuda, basta me procurar.
O conselho conseguiu retomar o controle dos alunos, entretanto nenhuma falha a mais será tolerada.
Despeço-me de Haruki e aguardo a saída de Mikoto do palco que ela montou.
Escoro-me em uma parede do saguão e observo o final do seu discurso.
Como ela conseguiu se recompor, acredito que evitará trazer ao conhecimento público o estado no qual Takashi foi encontrado. Pois apesar de ser apenas uma vítima, o modo que eu o matei foi muito menos sutil comparado às mortes por envenenamento.
Ela encerra a assembleia, dá as costas ao público e caminha em minha direção. Ao aproximar-se, cruza o seu olhar com o meu, porém passa reto por mim.
Realmente fui ingênuo de pensar que ela mudaria de opinião tão rapidamente. Ela ainda possui recursos para continuar sozinha. Pois bem, se for agir tão teimosamente, eu posso tomar medidas mais drásticas.
— Johann-kun! Não suma assim, depois deste incidente não é seguro sair por aí sozinho — Miyu aproxima-se de mim.
Continuo encarando o corredor vazio pelo qual Mikoto acabou de passar.
— Johann-kun, está me ouvindo?
— Ah sim. Desculpe-me, estava distraído.
11h46
Já é quase meio-dia, o almoço será servido em alguns minutos. Logo, devo colocar em prática a continuidade do meu plano.
Como já possuo o veneno e a chave da cozinha em mãos, basta apenas depositá-lo sem chamar atenção.
Keiko, Natsuki e outros membros responsáveis pela comida estão neste instante finalizando a refeição. Porém, apesar do envenenamento ao bebedouro, não estão com a guarda tão sigilosa para monitorar todos os alimentos.
Escondido em um canto da cozinha, aproximo-me do estoque das verduras que já foram lavadas e viro um frasco, o qual se mistura com o vinagre. Em seguida parto para o molho do curry e viro o restante do frasco.
Pacientemente me afasto e espero uma oportunidade de deixar o recinto sem ser visto. Felizmente a paranoia deles ainda não está tão alta a ponto de deixar vigilância constante.
Após certo tempo consigo deixar a cozinha e então me resta apenas esperar a tão aguardada prova de confiança proposta por Haruki. Bem, julgando pela minha experiência em outros mundos, ou seria ele voluntariamente ou Takashi obrigado pela Mikoto. Como já consegui dar um jeito no segundo, só restará a ele cumprir este papel.
O horário de almoço chega, obviamente um pouco atrasado devido a tudo o que aconteceu pela manhã, mas o conselho estudantil tratou de organizar o refeitório mesmo sobre tais circunstâncias como vem feito nos últimos três dias.
O único problema nisso tudo é o receio. Estamos todos em pé em frente ao refeitório, mas nenhum aluno esfomeado está indo se servir, eles estão se comportando da mesma forma que nas outras linhas temporais.
Isso torna tudo muito previsível para mim, estou sempre um passo à frente de todos.
A tensão que cobre o ambiente é quebrada por um garoto que passa a se mover em direção aos talheres, por conseguinte a encher seu prato de comida. Assim como o planejado, Haruki com toda a sua boa aparência decide colocar-se em risco. Mas penso que ele no fundo ele pressupõe que a comida não tenha sido adulterada.
Ledo engano.
O raciocínio de Haruki é bem simples, para ele o assassino jamais poderia tentar atacar em grande escala, pois correria o risco de atingir outro jogador. E deste modo, acabaria morrendo junto com a suas vítimas.
A lógica em si não está errada. Assumindo que há um assassino ciente das regras ditas pelos alto-falantes e que está buscando vencer o jogo pelo meio do caos, pode-se concluir que ele seria cauteloso e não atacaria às cegas.
Porém, eu já tenho como premissa a cautela tanto por parte de Mikoto quanto a de Ailiss. Nenhuma delas tocaria na comida sem estarem cientes da integridade desta. Além do mais, o ponto mais crucial nesta história toda é que eu já sabia de antemão que você tomaria esta exata ação, pois assim você fez em todas as outras linhas temporais.
Ele então para a nossa frente com um sorriso tranquilo e move o talher com alimento até sua boca.
— Está muito gostoso para os padrões da escola. É bom se apressarem ou não vai sobrar nada! — diz o garoto logo após ingerir a primeira garfada.
Ele continua comendo para confirmar que não haja um retardo no efeito do veneno. Muito bem pensado, desta forma se evitará que tenha tantas vítimas, mas com isso você estará ingerindo mais e mais veneno.
Ao terminar o prato, Mikoto começa a mover-se em sua direção. Certamente decretará a garantia por parte do conselho. Porém… ela bruscamente cessa o caminhar.
O rosto de Haruki… Ela também percebeu.
Ele arregala os olhos e fica com o olhar perdido. Em seguida seu corpo dá início a uma sessão de tosses que vão ficando cada vez mais intensas.
— Ei, Haruki-kun, você está bem? — pergunta Keiko.
— Será que ele se engasgou? — um aluno comenta.
A tosse não cessa e num certo cambaleio Haruki deixa o seu prato cair ao chão.
O estrondo dos talheres e dos cacos de porcelana se espalhando pelo chão é o suficiente para que todos tenham entendido o que de fato está acontecendo.
— K-kaichou — continua tossindo sistematicamente enquanto tenta falar — Não comam isto — subitamente desaba o seu corpo ao chão — Não comam- — tosse.
Ele prossegue tossindo loucamente como se estivesse tendo uma reação alérgica aos alimentos e deita-se de barriga para cima. A reação é tão intensa que ele nem mesmo consegue se comunicar.
Aos poucos a sua tosse cessa e seu corpo finalmente para de se movimentar.
Alguns segundos de silêncio se sucedem ao trágico fim de Haruki até todos terminarem de processar que ele de fato foi envenenado.
Passado o choque, Keiko e Natsuki que estavam tentando passar pela multidão correm imediatamente para socorrê-lo. Todavia, é tarde demais, sem recursos médicos não há como salvá-lo.
Só possuímos equipamentos de primeiros socorros, nada efetivo contra envenenamento, principalmente se for a alta dosagem como eu fiz. Mikoto provavelmente já está ciente disso e por isso sabe que não adianta tentar salvá-lo.
— Haruki-senpai! Não morra, por favor! — exclama Natsuki enquanto Keiko tenta reanimá-lo de alguma forma.
— Por favor, Haruki-kun. Não nos deixe ainda! Alguém nos ajude pelo amor de Deus! — suplica Keiko.
Fito os arredores e percebo que o pavor no rosto da multidão cresceu exponencialmente. Presenciar uma morte ao vivo, com certeza é muito mais chocante do que apenas deparar-se com cadáveres. Alguns até tentam se aproximar das duas na esperança de ajudar em algo, mas no fundo sabem que não há nada que possam fazer.
Impotência. Esta definitivamente é a melhor forma de assustá-los. Eles sabem que estão em apuros, e não têm a menor condição de se defender. Desta forma a ansiedade coletiva abrirá mais as defesas de Mikoto nesta nossa pequena e amigável disputa.
— Meu Deus. O que foi isso? — Miyu comenta apavorada.
— Ele também foi envenenado! Não comam a comida! — grita um estudante.
— Havia alguém infiltrado na cozinha?! — berra outro.
— Se não fosse pelo Harucchi, provavelmente estaríamos todos mortos agora… — diz Manabu.
— Já não bastou o bebedouro? Esse desgraçado não sabe quando parar?! — grita Shou.
Keiko e Natsuki continuam em choro constante com o seu velho amigo nos braços, numa tentativa inútil de salvá-lo.
Já Mikoto, externamente permanece com sua compostura intacta encarando a cena, mas com certeza isto deve tê-la atingido. Não pela perda de um conhecido, mas por ver o seu reinado desmoronando se persistir no mesmo erro. Alguma hora ou outra ela precisará ceder a mim.