Aether: O Mundo em um Sonho - Capítulo 36
Hm? O que é isso que estou sentindo?
Uma mansa brisa batia no meu rosto, e um calor moderado irradiava na minha pele.
Eu mexia os meus braços e pernas e várias coisas pontiagudas, mas macias, raspavam na minha pele.
Isso não é muito confortável para falar a verdade…
Meus olhos começam a se abrir vagarosamente, para logo notarem o lugar em que estava—um jardim.
Olhando para os lados, a única coisa que eu enxergava, além do horizonte, era uma casa branca moderna.
Espera aí, eu não estava no trem a um segundo atrás? Como eu vim parar aqui??
Cadê o pessoal?
— Loveta! Scarllet!
Começo a caminhar pelo jardim a procura deles.
— Baku! Lily!
Começo a correr.
O que raios está acontecendo?! Não importa para onde eu vou, todo caminho me leva até a casa!
Droga, pior que eu não posso afirmar que isso é um sonho, porque Aether em si já é um “sonho”. Tch, será que eu enlouqueci de vez?
Resolvo me sentar por um momento para entender a situação em que eu me encontrava.
Ok, eu ainda tenho acesso ao meu arco, e às minhas skills, então sim, eu ainda estou no Aether de alguma forma.
Se esse é o caso, então talvez Phanta consiga me ajudar.
…Só espero que ela não me ignore dessa vez.
Phanta! Você está aí?!
KABUM!
——?!
Assim que eu a chamo pelo nome, um raio vermelho partindo da minha cabeça acerta a casa com tudo, fazendo um baita barulho. Por sorte ela continua intacta.
…Mas que merda foi essa?!
Além do estranho raio que havia atingido a casa, o HUD do meu despertar apaga, e o meu arco desaparece. Nisso, uma garota corre até a minha direção.
Ela tinha um cabelo vermelho comprido e usava uma maria-chiquinha. Não era muito alta, e nem tão desenvolvida, mas tinha um corpo sensual de alguma forma.
…Ela é bonita, não posso negar.
Calma aí, eu já não vi essa aparência antes?
— Player Kazuki?! O que você está fazendo aqui!?
Player Kazuki… Espera—?!
— Phanta?!
SIWSH!
Sangue escorre do meu nariz.
Ela se aproxima mais e então noto a roupa que ela vestia. Ela usava somente uma blusa branca social e uma calcinha vermelha. A blusa estava desabotoada ainda por cima!
Phanta nota o meu olhar atrevido e sorri.
— Você é realmente um pervertido player Kazuki. Fufu, não vai me dizer que veio até aqui porque gostaria de brincar comigo também?
— Phew, não posso negar que você está sexy. Mas não, não faço a menor ideia de como vim parar aqui… Que lugar é esse afinal?
— Ah, essa é a minha casa, dentro da sua mente.
— Sua casa…? Dentro da minha mente?! O quê?? Mas como isso é possível?! Se na Terra está o meu corpo, e no Aether está minha alma, então na minha mente está o quê?! Uma segunda alma?! Argh, droga! Estou ficando confuso!
— Se acalme player Kazuki! Não pense tanto, é perigoso!
Hã…?
Quando noto, um terremoto havia começado a se formar ao fundo do jardim, mas ele logo cessa.
— …O que acabou de acontecer?
— Sua mente estava reagindo aos seus pensamentos. Você estar presente aqui está fazendo esse lugar ficar muito frágil e instável. Então tente se acalmar. Phew, vamos entrando, lá dentro a gente tenta descobrir o que aconteceu.
Eu confirmo ao que ela diz, e assim entramos na sua casa.
— Uau! Tem realmente de tudo aqui, não tem?
Eu estava seguindo a Phanta pela sua casa, observando os móveis e utensílios. Não é que as coisas daqui são bizarras e aleatórias como no Aether, mas aqui tem sim tudo o que é esperado de uma casa rica, moderna e tecnológica.
— Hmph, mas é claro. Se eu não dependo de dinheiro, por que eu vou poupar? Tudo o que está aqui foram coisas que eu mesma criei com o catálogo da sua memória.
— …Catálogo da minha memória?
— Vou te mostrar.
Phanta estica o seu braço e abre uma janela virtual no ar, cheia de abas e ícones.
— Se por exemplo eu quisesse um ar condicionado, bastaria eu entrar na seção de refrigeradores, e selecionar qual eu quero, e pronto.
Phanta aperta em um dos ícones e no mesmo instante um ar condicionado surge no meio da sala em que estávamos.
— Uau! Mas isso é—Hã? Esse daí não é o novo modelo que eu estava pesquisando na internet a uma semana atrás?
— Sim, e por você tê-lo visto, ele ficou gravado na sua memória, o qual eu tenho acesso. Por isso é um catálogo.
Caramba, que incrível! Nem no Aether eu teria tanta liberdade quanto aqui! Então, basicamente, só de eu ver uma coisa pela primeira vez, eu já poderia usar essa coisa, caso eu estivesse por aqui? Isso é realmente demais… não, espera—
— Isso por acaso significa que você tem acesso a literalmente tudo o que eu já fiz ou vi na vida?
— Sim, fufufu! Isso inclui todas as suas revistas eróticas e inclusive o que você faz no banheiro! Sabe, sempre que você se liberta uma vez por dia, você cria um novo filme para minha sessão noturna!
Não é possível… cadê minha privacidade?! Então eu estou sendo vigiado 24 horas por dia?!
Phanta dá algumas batidas de leve nas minhas costas ao ver a expressão de derrotado no meu rosto.
— Kukuku! Eu imaginei que isso chocaria você, só não esperava que fosse ser nesse nível! Mas não se preocupa, seus segredos estão a salvos comigo. — Diz, confiante. — Não é como se eu fosse para qualquer outro lugar que não seja sua mente, sabe? — Ela pisca um de seus olhos para mim.
Não, ser zoado pela minha própria assistente não é tão engraçado assim… Phew, de qualquer forma, agora que ela tocou nesse assunto—
— Você não se sente solitária por aqui de vez em quando? Digo, tudo bem que você consegue ter acesso a várias das coisas que estão na minha mente, mas eu imagino que você não consiga replicar pessoas, certo?
Phanta me olha surpresa, respondendo logo à minha pergunta. — Bem notado. O máximo que consigo fazer quando se trata de um ser vivo, é colocá-lo realizando uma ação do passado aqui dentro. Isso, em outras palavras, significaria que ele não iria me notar, e simplesmente iria continuar executando a ação da sua lembrança até o final. Então sim, às vezes eu me sinto só. — Phanta suspira. — Mas sabe, é por isso que, quando eu me sinto assim, eu vou até a minha cabine para ver o que você está fazendo no momento, e te ajudo nas suas aventuras cotidianas! — Ela sorri. — Isso é legal na verdade! Eu me divirto muito! É uma vida bem melhor de quando eu era uma—Uh.
— Uma…?
Phanta fica sem graça e desvia o assunto.
— Ah, é mesmo, a gente não tinha que resolver o seu problema? Vamos até o meu quarto!
Tch… Não é a primeira vez que ela troca de assunto, e omite alguma coisa…, mas enfim, realmente, preciso saber o que aconteceu comigo.
— Então essa é a sua cabine de onde você fala comigo como minha assistente?
Nós havíamos entrado em seu quarto, e a primeira coisa que eu noto é uma cadeira gamer dessas que custa a sua alma, mais nove monitores pendurados na parede.
— Exatamente! Hehe! Sabe, quando eu estou te vendo, até parece que eu estou jogando RPG em primeira pessoa!
— Espera aí… Não vai me dizer que eu sou o seu manequim?!
Phanta solta algumas gargalhadas.
— Sinceramente, se eu quisesse, eu realmente conseguiria controlar o seu corpo, não apenas ficar pausando!
— N-Não, não pode ser verdade isso! Então aquele dia que você disse que me jogaria num rio de lava, você realmente—
— Sim! Eu conseguiria fazer! Nossa! Agora que eu estou lembrando, teve um dia que você estava com a Loveta, e eu queria tanto que você desse umas pegadas nela, que eu quase tirei do piloto automático!
“………”
Não tem lógica, não tem lógica, não tem lógica! Eu pensei que mais nada nessa e na próxima vida poderia me surpreender, mas eu realmente me surpreendi! Na verdade, eu agora fiquei com medo…
— Ah, mas fique tranquilo! Não é como se eu fosse fazer isso com você de qualquer forma. O máximo que eu faço é te deixar paralisado, quando vejo que algo ruim vai acontecer com você, caso continue agindo por conta própria.
— Certo… Vou ficar um pouco mais aliviado… (Eu acho).
Engraçado, então a minha assistente está mais para a minha dona do que para minha submissa… É, isso é confuso.
Phanta estava concentrada visualizando vários códigos nos seus monitores, mas logo volta a falar. — Hum, pelo o que eu estou vendo, o que aconteceu não foi nada demais. Você simplesmente pegou no sono, enquanto estava no trem.
— Peguei no sono? Mas isso não faz sentido, eu já dormi no Aether outras vezes, mas nunca vim para cá.
— Esse sono que você tem quando dorme no Aether, é o sono “comum” que você tinha quando não tinha acesso ao Aether. Ou seja, é simplesmente um pedaço da sua mente para onde a sua consciência vai enquanto dorme. Esse local é sempre aleatório, mas acontece que, por coincidência, o local para onde você foi dessa vez é justamente aonde eu me encontro na sua cabeça.
— Certo, isso é um pouco confuso, mas acho que entendi. Isso significa então que para eu sair daqui, basta que alguém do lado de fora me acorde?
— Exatamente! Mas, como eu sou sua assistente, eu posso simplesmente enviar um comando para o seu corpo e te despertar lá mesmo.
Como imaginei. Depois disso eu perguntei mais algumas coisas que estavam sem explicação para a Phanta, e ela me deu mais alguns detalhes.
Por exemplo, enquanto no Aether a instabilidade afeta somente o corpo, aqui, na minha mente, a instabilidade afeta tanto o corpo quanto o lugar. Entretanto, como a minha alma no Aether já está estável por causa do colar, a instabilidade daqui se restringe apenas ao local, e não mais ao meu corpo. Por isso eu criei um terremoto naquele momento, porque fiquei confuso.
Outra coisa que perguntei a ela foi o motivo do meu HUD ter dado aquele apagão. Isso aconteceu porque eu chamei pela Phanta, sendo que ela já estava aqui. A forma de comunicação acabou bugando o sistema e o desligou completamente como sistema de segurança—Sim, meu despertar tem um sistema de segurança.
Enfim, ao menos isso não é tão problemático quanto parece. Assim que eu acordar no Aether tudo vai estar funcionando normalmente.
— Phanta, tem só mais duas coisas que eu gostaria de perguntar, antes de retornar ao mundo.
— Hm? E quais são?
— Primeiro, se essa é realmente a minha mente, então eu consigo fazer literalmente tudo o que eu quiser?
— Ah, sim. Você deve conseguir fazer o mesmo que eu já faço, só que sem precisar da tela virtual.
— Opa! Posso testar então?!
Phanta me olha preocupada, vendo a clara empolgação em meu rosto. — Sim, mas, por favor, vai com calma… Eu não gostaria de ter que reconstruir todo esse lugar de novo…
— Ah, não vai ser nada demais.
Eu então estalo os meus dedos, e um copo com suco de laranja aparece na minha mão. Eu o bebo.
Hum, o sabor é exatamente igual!
Phanta, de olhos fechados, vagarosamente começa a abri-los, para então levar uma surpresa.
— Espera, só isso?!
— O quê? Como você disse, eu não vou destruir sua casa, né?
Phanta concorda com a minha clara conclusão.
— Certo, a segunda dúvida que eu tenho é, eu vou poder voltar para cá se eu quiser?
Phanta pensa por um segundo, e volta ao seu computador. — Bom, eu acho que eu consigo pegar o sinal que foi emitido quando você veio para cá, e configurar o seu corpo no Aether para voltar para cá sempre que você sonhar lá…, mas por que você gostaria de voltar aqui?
Por quê? Ela realmente me perguntou isso? Bom, vou explicá-la de toda forma.
— Primeiro que eu gostaria de bancar um mini deus algumas vezes.
— Phew, era o que eu imaginava…
— Segundo que eu gostaria de fazer companhia a você.
Phanta se surpreende com a minha resposta.
— Companhia para mim? Nossa… Você é realmente um pervertido player Kazuki, quer até mesmo o corpo da sua assistente.
— N-Não! Não foi isso que eu quis dizer, o que eu estou falando é que eu não consigo imaginar você sozinha dessa forma até eu morrer. Não acho justo algo assim, então, por toda a ajuda que você me fez até agora, esse é o mínimo que eu poderia fazer por você.
Phanta, já surpresa com o que eu havia falado, acaba se corando.
— Uhhh… Isso é um pouco injusto, mas é compreensível, você já tem duas afinal…
…Hã? Do que ela está falando?
— M-Mas deixando isso de lado! — Phanta se acalma e volta ao seu normal. — Tem uma coisa que eu também preciso falar com você, antes de ir embora. Quero dizer, eu poderia falar logo quando voltasse, mas bem, não importa, já que você está aqui, então vou dizer logo—A skill de jogo.
— Hã? Skill de jogo?
— Sim, você se lembra do bug que aconteceu no sistema quando você estava jogando vídeo game com a Loveta?
Eu confirmo positivamente à sua pergunta.
Phanta se referia à skill com erro que eu ganhei por gastar mana jogando vídeo game, devido à minha intensa concentração. Eu não tinha conseguido ver o nome dela, ou sua descrição, no entanto.
— Então, depois de gastar um bom tempo trabalhando nela, eu consegui modificá-la e fazer dela uma skill suprema.
— Espera aí… O que você quer dizer com skill suprema?
— Imagina que você está num jogo, e de repente ganha acesso de administrador, o que aconteceria?
— …Eu viraria um deus?
— Exato! O seu nível iria subir para o máximo! Todas as skills do jogo seriam desbloqueadas! Sua vida iria subir às alturas! Sem falar de outros diversos benefícios!
“………”
— …Você realmente quer estragar a minha experiência? Você por acaso está me dando acesso hack ao sistema?!
Droga! Isso basicamente significaria que todo o meu esforço gasto para upar até agora foi em vão! Todos os meus 43 níveis de experiência foram gastos atoa… Eu sou um player de honra! Não posso ceder a algo tão sujo…
— Ah! Calma lá, haha… Não é como se não fosse haver um preço justo a ser pago para usá-la… — Phanta se entristece.
— Preço justo? Qual?
— Err… Quem sabe uma dor de cabeça?
E por acaso uma dor de cabeça é um preço justo? Phew, enfim, ela claramente está escondendo alguma coisa de novo, mas tanto faz, não é como se eu fosse precisar usar essa skill de qualquer forma.
Mas, hum, por curiosidade—
— Mesmo que eu usasse uma skill como essa, como que meu corpo aguentaria? O colar não iria quebrar?
Phanta sorri, confiante. — Ah, então, você se lembra de quando foi enfrentar o lobisomem? Você começou a ficar instável, mas logo o sistema contornou o problema fazendo a sua instabilidade diminuir e jogar o acúmulo para um outro status?
Balanço afirmativamente minha cabeça.
— Então, acontece que o fluxo estava pequeno. Logo, usando o bug da skill para acessar algumas configurações, eu tirei o limitador de fluxo, permitindo que toda a sua futura instabilidade fosse jogada em pontos de força e defesa.
Tch, eu claramente não gostei da ideia de ganhar uma skill roubada como essa, mas é, não posso negar o esforço que a Phanta fez para tornar isso possível, tudo no intuito de me ajudar. Consigo até mesmo notar um pouco de olheira abaixo dos seus olhos… Com certeza não deve ter sido um trabalho fácil.
— Então o motivo de você ter me deixado no vácuo, durante todo esse tempo, foi porque você estava trabalhando nesse negócio?
— Ah… ficou tão notável assim? Haha…
— Phew, obrigado de qualquer forma, eu sei que você fez isso pensando em me ajudar.
Phanta fica feliz com o que eu disse, mas logo volta a ficar incomodada com alguma coisa.