A Herança do Assassinato - Capítulo 3
Aquela era uma noite fria na floresta, os músculos de Dante tinham adormecido com facilidade, graças ao cansaço e fadiga extrema que o seu treinamento tinha lhe proporcionado. O garoto estava preso em uma espécie de transe, perdendo completamente a noção do tempo. Quanto tempo ele tinha andado? Horas? Ou só foram alguns breves minutos? Isso não tinha mais importância, ele só tinha que ir o mais longe possível daquela maldita mansão.
Dante então caminhou por muito mais tempo, o ponto que suas pernas estavam chegando ao seu limite, mas mesmo com dor, continuou a avançar para mais adentro da floresta. Então sua caminhada é interrompida por um estranho som vindo do meio da mata.
— O que?! — Ele olhou para os seus arredores, assustado com a possibilidade de sua família ter o encontrado — Quem está aí?!
Agora Dante sabia, ele não estava sozinho. Aquele som vinha em sua direção, ficando cada vez mais alto. Folhas sendo pisadas e galhos se partindo.
Aos poucos um ser foi surgindo das sombras, uma face furiosa de um leão, o corpo coberto por aquele pelo dourado parecia com a luz do luar. Duas grandes asas surgem em suas costas e no lugar de onde deveria estar a cauda daquele animal, tinha uma serpente. Aí que Dante se deu conta, de que havia acabado de se encontrar com uma quimera, que não parecia ser um fato muito melhor do que a sua família.
Já tinha visto monstros em livros, porém encontrar com um era completamente diferente. Eles tinham uma espécie de energia aterrorizante, que parecia lhe deixar completamente impotente. As pernas de Dante pareciam ter se transformado em geleia e não estavam suportando o peso do resto do seu corpo.
Aquele rosnado e bafo quente da Quimera ficaram mais fortes, até que então ela saltou rapidamente na direção de Dante, que conseguiu graças aos seus instintos de sobrevivência, que o fez saltar para longe e começar a correr.
Apesar da dor que seus músculos estavam sentindo naquele momento, Dante precisava a todo custo fugir daquela criatura. Então ele correu, correu como nunca tinha corrido antes e tentando de alguma forma despistar aquela quimera, Dante começa a fazer zig zag entre algumas árvores mais estreitas, porém isso se demonstrou inútil, pois a força da criatura era tão grande que aqueles troncos eram quebrados no mais simples contato entre eles.
— Mas que droga!! — Nesse momento dante só não haveria xingado, pois não tinha conhecimento de nenhum palavrão.
A Quimera parecia ter se irritado com aquele jogo de gato e rato, logo abriu as suas e brandiu suas enormes asas, entrando rapidamente em um vôo baixo. O monstro se aproxima e utiliza dos troncos de árvores ao seu redor para se impulsionar na direção de Dante, assim esbarrando com tudo em Dante, que é lançado na direção de um enorme barranco, pelo qual o jovem rolaria até bater com tudo em árvore.
Sua visão começou a ficar turva, aqueles dois impactos tinham sido muito fortes. Com dificuldade, a criança conseguiu se colocar de pé, porém ao olhar para cima se deparou com a enorme quimera caindo em sua direção e não deu outra. O ser já estava muito próximo de Dante, que levou mais uma cabeçada e batendo contra a árvore, porém dessa vez com muito mais força.
O leão então colocou sua enorme pata contra o peito de sua presa, o impedindo de fugir. Dante sentia em seu rosto o forte calor da respiração do monstro batendo contra a sua face. Isso lhe fez ter certeza absoluta de que ia morrer, pois não tinha mais como fugir.
— Droga — sussurrou ele — Pelo menos vou ter um pouco de paz a partir de agora.
A visão do rapaz foi ficando turva e escurecendo, pois provavelmente, durante aqueles ataques, sua cabeça deveria ter se colidido com alguma coisa.
A quimera então abriu sua enorme boca, dessa forma revelando presas igual grandes, que poderiam arrancar a cabeça de um ser humano com uma facilidade tremenda, além do hálito mais fedorento que aquela criança havia sentido em toda sua vida e provavelmente nunca sentirá que seja pior.
— Acaba logo com isso…
O monstro estava prestes a devorar a cabeça de Dante, quando um estranho som de corte pode ser ouvido e em seguida um forte vento soprou. Estranhamente a quimera parou de se mover por alguns breves instantes, até que uma chuva de sangue caiu e encharcou Dante.
A quimera caiu morta na grama, que logo ficou repleta de sangue, pois o tronco daquele monstro havia sido cortado ao meio.
Ao fundo se ouvia o som de uma espada sendo embainhada, juntamente de passos que aos poucos chegavam mais perto. Ao olhar na direção de onde vinha aquele som, Dante se deparou com um ser encapuzado, alto e forte, com uma espada pendurada na cintura, não era possível ver o seu rosto, graças a grande escuridão que estava na floresta.
Antes que pudesse dizer ou fazer algo, a visão de Dente começou a escurecer de forma rápida. Não demorou nem alguns poucos para que perdesse por completo a sua consciência, o deixando à completa mercê daquele ser misterioso.
***
Durante o tempo que Dante estava desacordado, ele se despertou por alguns breves segundos e se deparou com aquela figura encapuzada lhe carregando, mas ainda não conseguiu ver quem era, pois após alguns instantes desmaiou novamente.
Então após algum tempo, o jovem finalmente despertou por completo. Abriu os seus olhos lentamente e se deparando com o teto de uma casa, que não aparentava ser familiar para ele. Após isso, percebeu que estava deitado em um pequeno colchão com um cobertor velho o cobrindo, portanto decidiu se levantar e quando o fez sentiu uma fortíssima dor de cabeça.
— Argg…
Ao colocar a mão em sua cabeça, pode sentir uma faixa em volta da mesma. Também notou que suas roupas eram diferentes, não eram mais aqueles trapos velhos e rasgados, agora vestia uma camisa e uma calça, que claramente eram muitos números maiores que o dele.
Olhando ao seu redor pode ver que estava em uma espécie de sala de leitura, que era um pouco iluminada pela luz do sol que adentrava pela janela. Tinha algumas estantes velhas e empoeiradas repletas de livros e quatro poltronas ao redor de uma lareira.
— Onde eu estou?
Dante então se levantou e foi até a porta, passando para outro cômodo que provavelmente era a sala de estar. Fazendo isso pode ouvir sons vindo do lado de fora da casa, eles aparentavam ser respirações ofegantes e madeira sendo cortada. Dante de forma cautelosa, tentando esconder sua presença, foi até a porta, a abrindo o suficiente para que conseguisse espiar o lado de fora.
Quando fez isso, se deparou com um homem alto e musculoso, de cabelos ruivos e vestindo uma regata branca. O mesmo segurava um enorme machado e o descia contra alguns tocos de madeiras, os partindo ao meio, porém de repente o homem parou os movimentos e lentamente se voltou para a direção de Dante.
— Você se esconde bem — disse o ruivo — Qualquer outra pessoa não teria te notado, mas infelizmente você está tentando se ocultar de mim.
Aquilo assustou Dante, principalmente por aquele homem carregando o machado ter uma cara fechada, como se estivesse a todo momento de mau humor.
— Vamos! Saí daí!! — A fala havia soado mais como um ordem, do que como um pedido.
O garoto abriu mais a porta e saiu de dentro da casa. Seus olhos se moviam de uma forma frenética, procurando uma rota de fuga que pudesse usar caso fosse atacado, mas o seu nervosismo o impediu que pudesse o fazer.
— Quem é você? — questionou o ruivo.
Aquilo quebra a linha de raciocínio de Dante, que demora alguns segundos para processar a pergunta.
— Eu me chamo Dante — A voz de Dante, diferente de antes, tinha um tom frio e sem vida.
— O que uma criança como você estava fazendo no meio da floresta durante a noite? Lá é muito perigoso, você podia ter morrido ontem.
— Eu… eu… — Dante exita em contar o que tinha feito — Eu fugi da minha casa.
— Você é um idiota! — O ruivo solta um suspiro — Seus pais devem estar mortos de preocupação!! Vou te levar de volta para sua casa hoje mesmo!!
Quando Dante ouviu aquilo, uma mistura de medo e desespero se espalhou por cada centímetro de seu corpo. Litros de suor gelado começaram a sair da pele do garoto, enquanto olhava assustado para o homem à sua frente.
— Eu lhe imploro!! Eu aceito fazer ou ir para qualquer lugar, menos voltar para aquela casa!!!
— Você tá louco moleque!? — O musculoso parecia ter se irritado — Tu acha que eu vou te deixar morar aqui?! Se não quer voltar para sua casa, tudo bem!! Mas eu não irei cuidar de você!!
O clima tenso então é subitamente cortado pelo ronco da barriga de Dante, que fica meio envergonhado e cora pela situação.
O ruivo solta um suspiro cansado e coloca seu machado apoiado na parede externa da casa.
— Bom, acho que antes de você ir embora, pode comer alguma coisa — O homem caminha para dentro de casa, mas para na porta — Eu me chamo Raphael, acho que seria bom você saber disso.
Raphael então entra para sua casa deixando Dante do lado de fora, que agora, com mais calma, pode olhar a paisagem ao seu redor. Como podemos dizer? Era deslumbrante.
O quintal da casa de Raphael se estendia até uma estreita estrada de chão e após isso, havia uma enorme planície, coberta por um capim dourado, que dançava junto do vento e se estendia além do horizonte. Foi nesse momento que Dante pode perceber que nunca tinha saído para fora do terreno de sua família e que havia um mundo tão belo e vasto, que ele nunca tinha visto.
Nesse momento ele quase chorou, mas foi interrompido pelo chamado de Raphael.
— Dante, a comida tá pronta!!
Aquilo surpreendeu Dante, a comida tinha sido preparada rápido demais. Quanto tempo ele tinha ficado parado olhando o horizonte?
Quando o rapaz entrou na casa, pode sentir o cheiro da comida invadindo o seu nariz. Era um aroma salgado muito bom, que o fazia ter água na boca. Ao olhar em cima da mesa pode ver uma tigela com um ensopado de carne dentro, logo vou até uma cadeira e se sentou.
— Olha, já vou avisando que minha comida é muito ruim. Coma por sua conta e risco.
— Não se preocupe, não pode ser pior que a comida lá de casa.
Dante então deu sua primeira colherada naquele ensopado e de fato, era muito ruim, mas por algum motivo ele havia gostado, mesmo com aquele gosto horrível. Era como se tivesse algum tipo de ingrediente secreto, que lhe faria comer mais e mais, o que chegou até assustar Raphael.
Quando ele se deu conta já havia esvaziado a tigela e lágrimas caiam de seu rosto. Dante rapidamente as limpou e encarou Raphael.
— Eu tenho uma pergunta!! Você que matou aquela quimera?!
— E se tivesse sido eu? — Raphael tinha um olhar de suspeita.
— Então eu vou querer que você me treine!!! — disse Dante, cheio de convicção em sua voz.