A Herança do Assassinato - Capítulo 25
O ar estava úmido e gelado, mesmo coberto por suas vestimentas, o frio parecia não ser impedido. Enquanto caminhava pela extensa trilha do bosque, seus passos eram os únicos sons a serem escutados, nem os cotidianos cantos dos pássaros se mostravam presentes e um fino véu de neblina se encontrava rente ao chão, ainda sim, mesmo estando completamente só naquela selva, a sensação de estar sendo observado era constante.
Ele deu continuidade à sua caminhada, em um caminho que não mostrava ter um fim e quanto mais se andava, mais densa ia se tornando a neblina que cobria a floresta. Foi então a sinfonia das risadas de duas jovens crianças ecoaram através das árvores, que fez o viajante parar, olhando desesperadamente ao seu redor, como se procurasse pelos portadores das tais risadas. Neste mesmo instante, o viajante se deu conta que já não estava mais na trilha que antes, mas na verdade no meio da floresta, perdido.
O mato era alto, batendo na altura do seu tornozelo, a vegetação era muito densa, dificultando a locomoção. As vozes das crianças continuavam soar ao redor do andarilho, dizendo frases como:
— Vamos!! É por aqui!!
— Não vai embora, ainda é muito cedo!!
— Agora é você que procura!!
As vozes dos iam ficando cada vez mais estridentes e numerosos, se tornando em uma gigantesca tortura sonora. O andarilho tentava cobrir seus ouvidos, porém era completamente em vão, o turbilhão de gritos parecia ser impossível de ser parado. Ele fechou seus olhos, em uma tentativa de fugir daquela realidade, e quando sentiu que estava prestes a enlouquecer, todos os sons cessaram de uma única vez, dando lugar a uma bela calmaria.
O viajante destampou seus ouvidos, só que ao abrir os olhos, percebeu que o cenário ao seu redor tinha se alterado mais uma vez.
O sol que antes emitia sua radiante luz amarela, agora fora substituído por um vermelho carmesim, enquanto flutuava perante à um céu totalmente negro. Toda a floresta estava manchada por sangue, no chão estavam espalhados um número incontável de corpos de pessoas desconhecidas. A frente do viajante estava um casal de pessoas altas, vestindo roupas elegantes manchadas de sangue. Eram Hannah e Robert River.
— Ótimo filho, fez exatamente como eu te ensinei — disse Robert, com um sorriso orgulhoso no rosto — Eu sabia que você ia conseguir, afinal você tem sangue River.
— A mamãe está tão orgulhosa — disse Hannah. — Está dando continuidade ao legado da nossa família.
O casal encarava o viajante com sorrisos horripilantes estampados em seus rostos. Este se revelará ser Dante, ainda criança, vestindo um pequeno terno, que estava completamente manchado por sangue. Em sua mão estava uma faca, completamente ensanguentada, e sobre seus pés, os corpos de duas crianças, que já tinham perdido suas vidas.
Dante então começou a tremer e acabou por deixar a faca cair no chão e afundando no líquido carmesim. O garoto levou as mão até a cabeça, tentando parar a tempestade de pensamentos e lembranças que o atormentavam. Muitas lágrimas começaram a sair de seus olhos, até que Dante não suportou mais e soltou um grito de agonia, que guardava no fundo de sua alma.
Sua voz tomou conta de toda sua mente, sendo a única coisa que ele escutava. Isso continuou até que sem explicação, tudo se apagou, restando apenas a escuridão e o silêncio absoluto.
***
Foi neste momento, que enfim, Dante despertou.
Sua primeira visão foi o teto metálico do galpão, que o lembrou que ele estava na base de uma gangue. Então levou a mão até seu rosto, para verificar se sua máscara ainda estava lá, e para sua surpresa, realmente estava, entretanto, isso não garantia que eles não tinham visto sua verdadeira identidade. Todo cuidado era pouco.
O jovem se levantou, o cabelo que não estava mais preso no rabo de cavalo, ficando totalmente sinto sobre sua cabeça . Dante se sentou sobre a cama, e olhou para seu corpo, repleto de curativo por todas as partes, aquela médica realmente tinha se dedicado. Analisando o ambiente ao seu redor, Dante se deparou com uma outra figura lhe encarando. Ela também estava sentada em um dos leito da enfermaria, usava apenas calças, sua pele tinha um tom negro bem escuro, o corpo era attlético e os músculos muito bem definidos, seu peitoral estava cobertos por fixas, na sua cabeca se penduravam longos dreads e em sua face, dois olhos verdem como esmeraldas brihavam, que lancavam um olhar penetrante.
Julgando sua estatura física, o tipo de cabelo e as faixas no peito, muito provavelmente por causa de algum ferimento recente, Dante logo deduziu que aquele era o ceifador com quem tinha lutado anteriormente. Com esse pensamento em mente, o rapaz levantou sua guarda para um possível confronto.
— A quanto tempo você está aí? — perguntou Dante.
— O suficiente para que eu pudesse te matar enquanto dormia — respondeu o outro sujeito.
Ambos se encaravam, em um confronto silencioso.
— Você é bem forte — disse o que carregava dreads — Faz tempo que eu não era derrotado daquela maneira.
— Digo o mesmo de você, mesmo desacordado me causou bastantes problemas…
O negro abriu um sorriso amistoso, aliviando um pouco o clima tenso.
— Pelo que a Mitsuki me contou você é um cara bem maluco — ele dizia como se fosse algo engraçado — Está procurando os Rivers, não é? O que motiva alguém a fazer algo tão insano assim?
— Isso não é algo que diz respeito a você.
— Pelo visto joguei sal em uma ferida bem aberta
O ceifador dizia tudo isso em um tom bem tranquilo e debochado, como se Dante fosse algum amigo íntimo dele.
— Você é um guerreiro e tanto, sua habilidade com a espada é simplesmente impressionante — O ceifador lançava um olhar penetrante para Dante. — O que acha de se juntar à minha gangue?
Esta tinha sido uma surpresa para o garoto, que demorou um certo tempo para processar a oferta. Quando finalmente entendeu a situação, Dante se manteve arisco contra aquele homem, que não se mostrava ameaçador, porém ele emanava uma aura de quem ditava os rumos que aquela conversa iria levar e isso era algo que não agradava nem um pouco Dante.
— Porque a proposta repentina? — perguntou Dante — E, aliás, você tem algum problema mental? Está recrutando o homem que tentou te matar.
— Eu sei exatamente o que estou fazendo.
— Não é o que parece. Ou você é só um maluco, ou tem algum plano por trás.
— Já te disseram que você é meio paranóico? — falou o negro, em um tom debochado. — Deveria ter mais fé nas pessoas.
— E por acaso estou errado?
O ceifador não aguentou e acabou por soltar um leve riso.
— Não, você está certo, eu tenho um plano.
Com a declaração feita, um momento sério tinha se instaurado mais uma vez. O que esse cara tá querendo?, pensou Dante.
— Desde o momento que eu soube que você está atrás dos Rivers, percebi que você é alguém diferente dos daqui da Cidade de Baixo. Talvez um forasteiro que não sabe como as coisas funcionam nessa cidade, mas você é mais do que desavisado. Foi capaz de me derrotar e também a líder das Garras de Tigre — O ceifador parecia demonstrar empolgação enquanto falava. — Isso me deixou muito curioso sobre quem você é. Por estes motivos, eu quero que entre para minha gangue, os Gatos Noturnos.
Por longos instantes, Dante permaneceu no mais puro silêncio, até que o quebrou, falando da maneira mais curta e seca possível:
— Eu recuso, não confio nem um pouco em vocês, além de que isso só iria me atrapalhar.
— Eu já imaginava — responde o gângster,sem aparentar ter se abalado — Só que apesar da sua astúcia e força, essa cidade é muito mais traiçoeira do que pensa, ela sempre arranja uma maneira de te arrastar para a lama, a cada esquina tem um criminoso à espreita, pronto para enfiar uma faca no seu coração. Facções criminosas dominam cada rua, não dá para sobreviver por muito tempo sendo um lobo solitário.
— E o que te garante que você não vá me trair?
— Nada, assim como nada impede de você me trair.
— Então tudo isso é inútil.
— Na verdade não…
O rapaz de dreads então se levanta da sua cama e lentamente caminha em direção a Dante. Ele era alto e forte, exalando um ar de imponência. Agora, próximo a Dante, o ceifador encarou ele nos olhos e disse:
— Não quero que siga as minhas ordens, quero que sejamos… — Ele parou um pouco,como se buscasse a palavra correta. — Parceiro de negócios. Você pode continuar atrás dos Rivers, mas ganhará um auxílio nosso.
Dante permaneceu em silêncio e também se levantou, encarando o outro rapaz de frente, tendo que inclinar um pouco sua cabeça para cima, já que o negro era levemente mais alto que ele.
— E o que você quer? — perguntou Dante — Aprendi que ninguém faz algo, sem receber algo em troca.
— Perspicaz. Você vai ter que se esgueirar bastante se quiser encontrar os Rivers, quero que se torne um espião. Se infiltre nas máfias e gangues da cidade e consiga informações. No nosso mundo conhecimento é poder e conhecer os teus inimigos te levará a vitória. O que me diz? Não é uma proposta que se tem todo dia.
O negro levanta a sua mão, esperando pelo aperto, para que enfim o acordo fosse selado.
Dante por sua vez ficou um tempo raciocinando. Aquele de fato era um acordo muito bom, porém ele devia tomar cuidado, poderia ser apenas uma armadilha e uma traição poderia acontecer a qualquer momento, entretanto,se fosse verdade, além de ter novos aliados, seria auxiliado na sua busca. Foi então que o garoto tomou sua decisão.
Levantou sua mão e firmou o acordo.
— Bem-vindo aos Gatos Noturnos. Eu me chamo César.
— Fox.
A partir dali fora fechada uma poderosa aliança, que seria capaz de mudar por completo os rumos da história pelo resto da eternidade.