A Herança do Assassinato - Capítulo 2
— Isso não será possível — Robert comeu um pedaço de seu bife — Eu os matei.
Ouvindo isso, Dante começa a rir, pois achava que seu pai acabava de fazer uma piada, o que era algo meio raro. Quando isso aconteceu, tanto Hannah, quanto Robert, se sentiram incomodados com aquelas risadas, como se não estivessem brincando.
— Mas pai… — o garoto se recuperava das risadas — Eu vou poder ir na casa dos meus amigos?
— Como eu disse: eu os matei — Robert tinha um olhar sombrio e sem vida — Lá morava um conselheiro da família real, que fui encarregado de eliminar. Eu ia poupar as crianças se elas não estivessem em casa, porém elas estavam presentes e infelizmente presenciaram o assassino. Eliminei todos na casa, para não ter risco de haver uma testemunha.
“Como assim?” perguntou Dante, para ele mesmo. Seus amigos estavam mortos? Isso não é possível, é apenas uma brincadeira de seu pai, só que ele está tão sério. Só que essa coisa não pode ser verdade.
Dante travou, seu cérebro tentava absorver, ao mesmo tempo que rejeitava a informação. Seu revirou, a comida a sua frente já não tinha um cheiro tão saboroso quanto antes, aquilo fazia ele querer vomitar. Naquele exato momento, tudo pareceu perder todo o seu sentido.n
Lentamente Dante vira o rosto na direção de sua mãe, que não tinha mais aquela expressão bondosa se sempre, agora em seu lugar tinha um olhar frio e sombrio, como se estivesse julgando cada palavra e atitude tomada pelo seu filho.
— M-mã-mãe… — as palavras pareciam estar atoladas na garganta de Dante e não conseguiam sair — Tudo isso .que o papai falou é mentira, não é? Ele está apenas brincando comigo.
O garoto suava frio, enquanto sua mãe o encarava com desprezo. Dante nunca imaginou que sua mãe poderia ter olhos assim tão perversos, isso era um grande choque.
— Eu avisei Robert — ela se virou para o marido — Você deveria ter sido mais rígido, deixou ele formar laços com outras pessoas e olha no que resultou. Como um assassino vai ter pena de quem for matar.
Robert estava com os cotovelos sobre a mesa e com os dedos entrelaçados. Seu cabelo formava uma sombra escura sobre seus olhos.
— Dante, você é um membro da família River, um assassino por natureza. Você não deve ter nenhum sentimento por aqueles que não são seus familiares!! — Ele lançou um olhar furioso contra seu filho — Estamos entendidos?!
— Mas…
Antes mesmo que ele pudesse completar sua frase, Robert o interrompe, dando um soco em cheio no rosto do garoto, que caí no chão, com a força do impacto.
— Eu não quero explicações moleque!! — O mesmo se levanta da cadeira e vai até a criança caída — Sua mãe estava correta, eu quis ser um pai bom para você, mas acabei criando um molenga como você!!
Lágrimas de dor e tristeza começaram a cair dos olhos de Dante e quando ele deu os primeiros soluços de choro, um forte chute é desferido contra as suas costelas.
— Aaahh!!
Aquele golpe causou uma dor intensa, quase quebrando as costelas da criança com a força do impacto.
Hannah e Robert haviam se levantado e ficaram em pé, olhando seu filho agonizando no chão. Dante encarou sua mãe, com os olhos cheios de lágrimas, procurando algum conforto, amor ou proteção, mas não tinha sido isso que ele encontrou foi o completo oposto. Hannah lhe encarava com uma pura expressão de desprezo, como se aquele ser na sua frente não fosse seu filho.
Dante mal conseguia reconhecer seus pais, eles não eram mais aquelas pessoas gentis e bondosas, essa era sua verdadeira identidade, dois assassinos frios e treinados. Dante finalmente teria percebido isso.
— Você não tem nenhum direito de chorar!— disse Robert, enfurecido — Eu nem acredito! Eu fui molenga demais, você não é um assassino, mas vai virar!!
— Eu perdi até mesmo meu apetite com isso — Hannah caminhou até a porta —Eu não quero saber dessa coisa. Quero que você resolva.
— Pode deixar, que desta vez, vou o disciplinar da maneira correta.
Hannah então saiu da sala de jantar e só era possível ouvir o seu salto ecoando pelo corredor e ficando cada vez mais baixo, até que o som desaparece por completo.
— Pai… — Dante encarava seu pai, aos prantos.
— Eu não sou seu pai! Neste momento, eu sou Robert River, o seu professor — A voz de Robert ainda havia raiva, porém estava contida — E de agora em diante eu não vou te tratar como antes, você será treinado seriamente.
E assim foi dito e feito, Robert pegou o braço de Dante e o forçou a se levantar. Ambos andavam de forma rápida pelos corredores da mansão, o que gerava alguns olhares de estranheza das outras pessoas, porém ninguém se atrevia a encarar por muito tempo ou perguntar o que estava acontecendo.
Robert arrastou seu filho para fora do prédio e começou a cruzar o seu jardim, até que chegaram no estábulo, onde Dante foi jogado, sobre uma imunda e fedorenta pilha de feno.
— Você pode não acreditar e me odiar, mas saiba, que tudo isso é para seu bem — O olhar de Robert se mantinha sombrio enquanto falava — Um assassino deve controlar seus sentimentos ou se preciso, não ter nenhum. Este treinamento lhe dará poder, tanto físico, quanto mental.
Dante não esboçou nenhum resquício de reação, ficou imóvel sobre a pilha de feno, apenas respirando. Vendo isso, Robert soltou um suspiro que parecia ser um misto de diversas emoções e foi na direção da porta, porém um pouco antes de atravessá-la, parou.
— No futuro você irá me agradecer — disse Robert, encarando a porta.
Dante mais uma vez não esboçou nenhuma reação a aquelas palavras, então Robert soltou mais um suspiro,mas desta vez, era nítida a tristeza que ele contia. Então Robert saiu do celeiro e trancou a porta.
Foi automático, quando seu pai saiu, rios de lágrimas começaram a escorrer de seus olhos. Apesar das fortes dores que latejavam em seu rosto e costela, ele chorava graças a intensa dor que havia em seu coração. Era como se alguém tivesse disparado uma flecha de ferro contra seu coração e a cada segundo ela ficava levemente mais fundo.
Aquela noite fria parecia não incomodar o garoto, até porque ele já estava completamente congelado,só que por dentro.
***
Os dias a partir daquele era o que se poderia chamar de o “Inferno de Dante”. Os treinamentos não tinham ficado mais rigorosos, eles eram literalmente desumanos. Já era um grande feito Dante ter sobrevivido por todos eles.
Primeiro foi acordado de forma bruta por seu pai, que lhe deu um copo d’água e um pão velho, que obviamente não foi o suficiente para saciar sua fome.
— Pai, eu ainda estou com fome.
De forma totalmente inesperada, Robert deu um fortíssimo chute contra o rosto de Dante, que caiu sobre o chão, com bastante sangue escorrendo de sua boca.
— Eu lhe avisei ontem! — Robert tinha uma postura rígida e ereta, como a de um soldado — Eu não sou mais seu pai!! Sou seu professor e isso vai durar até que você conclua o seu treinamento!
Dante voltou a encarar aquele homem, que ele mesmo disse, não era mais seu pai. O ser na sua frente lhe causava terror e angústia, aquilo não era um professor e nem mesmo um carrasco. Era o mais terrível dos monstros.
— Levante-se!!
Sem nem sequer pestanejar Dante se levantou, ficando frente a frente com seu novo professor.
— Parece que finalmente está começando a aprender a ter um pouco de disciplina.
A dupla então saí do estábulo e encontram com um cavalo, no qual Robert montaria.
— Onde está o meu? — perguntou Dante.
— Não há nenhum cavalo para você, irá correndo.
— Mas o quê?
— Não me questione!! Apenas corra!!
Assim Dante fez e começou a correr, enquanto Robert andava de cavalo ao lado. Tudo estava certo, até que o jovem sentiu uma fortíssima dor acertando as suas costas com tudo.
— AAAAHHH!!!!
Ao olhar para trás, para entender o que estava acontecendo, se deparou com Robert segurando um enorme chicote.
— Não olhe para mim!! Cortar mais rápido!!
Por mais que Dante usasse toda sua velocidade, Robert continuava lhe dando inúmeras chicotadas. Isso durou por diversas horas, até que finalmente a corrida terminou.
As pernas de Dante doíam como nunca, seu corpo estava tão cansado que o garoto vomitou todos os alimentos que estavam em seu estômago, além de tudo isso, sua pele queimava com os fortes golpes de chicote que ele havia levado.
Só que apesar da corrida ter chegado ao fim, o resto do dia não foi nenhum pouco melhor. Dante tinha que meditar para fazer a mana fluir melhor pelo seu corpo, enquanto ele era golpeado com diversas armas diferentes, teve treino de furtividade, onde tentava se esconder de Robert e sempre que falhava sofria uma punição severa, as aulas com o Senhor Bigodes eram mais longas e muito mais exigentes .
Nem mesmo os momentos como as refeições e os banhos eram agradáveis. A sua comida não era nem um pouco saborosa, pelo contrário, era horrível, era uma espécie de papa com apenas os nutrientes essenciais para o corpo e um pouco de água.
A hora do banho parecia ser uma tortura. Dante era lançado em um banheira, com a água estando em uma temperatura extremamente baixa, quase congelando.
Então após toda essa crueldade a criança era lançada novamente no estábulo. Lá não era o lugar mais confortável e cheiroso do mundo, mas pelo menos ele poderia sofrer em paz, sem ninguém para o machucar. Era nesse momento que ele poderia se dar ao luxo de sofrer pelo seu luto.
Então toda noite ele chorava. Chorava pela dor de ter perdido as duas únicas pessoas que o amavam.
***
Foram dois meses inteiros daquela tortura insana. Dante não era mais o mesmo, nem ele sabia se ainda era uma pessoa. Ele tinha um único desejo: a morte. Pelo menos, através dela ele finalmente teria paz. Ninguém o machucaria e ele finalmente poderia reencontrar seus amados amigos.
— Eu… Quero morrer… — sussurrou a criança, tão baixo que nem mesmo os cavalos conseguiram ouvir.
Porém, com o fim da frase, um estranho sentimento surgiu em seu coração. O que era? Raiva? Desprezo? Não dava para saber. O que era certo, era o desejo de Dante: a vingança.
— Eu tenho que viver…
Para se vingar de tudo o que os Rivers tinham o machucado, ele tinha que viver.
Primeiro tinha que sair daquele estábulo. Ao olhar para o alto se deparou com uma janela aberta, mas estava muito alta. Então para alcançar ela, usou de algumas caixas e de um cavalo como escada.
Ao pular pela janela, caiu de peito no chão. Seus músculos estavam muito fracos para conseguirem manter o equilíbrio em pleno ar.
Com dificuldade Dante levantou e caminhou lentamente em direção a floresta e aos poucos foi adentrando mais nela. Não sabia para onde iria, mas até o inferno seria um lar melhor que aquele.